por Luís Jacques
Engenheiro civil
Como é possível um ex-primeiro-ministro ser acusado de corrupção, fraude fiscal e branqueamento de capitais, pelo Ministério Público, validado pelo Juiz Carlos Alexandre do Tribunal Central de Instrução Criminal, na fase do inquérito da Operação Marquês, com muitas das decisões, por recurso da defesa, a serem validadas pela Tribunal de Relação e pelo Supremo Tribunal de Justiça e o Juiz Ivo Rosa do mesmo Tribunal Central de Instrução Criminal não o levar a julgamento pelos crimes de corrupção e de fraude fiscal?
José Sócrates, de acordo com a acusação, foi o beneficiário de 34 milhões de euros. Seja de corrupção, suborno ou liberalidades, nada justifica que um primeiro-ministro em funções receba dinheiro de entidades privadas. Há provas de que viveu à custa de um amigo, que tinha negócios com o Estado, pôs e dispôs nas obras de remodelação de um apartamento em Paris, que estava em nome do amigo, comprou monte no Alentejo para a ex-mulher, recebia dinheiro vivo entregue pelo amigo ou através do motorista, fez férias à custa do amigo e é um dos beneficiários do dinheiro transferido do saco azul do Grupo Espírito Santo e do pagamento de Vale de Lobo.
Em que mundo é que vive o Juiz Ivo Rosa? Deve ser numa realidade virtual, pois no mundo real é muito raro haver prova directa para os crimes de corrupção. O Juiz Ivo Rosa estava à espera de encontrar um "contrato de corrupção" entre José Sócrates e quem lhe fez chegar o dinheiro? O Juiz Ivo Rosa não aprendeu, em pequenino, que "Quem cabritos vende e cabras não tem, de algum lado lhe vêm", com referiram os juízes da Relação, num dos recursos da defesa de José Sócrates?
Como é possível terem sido anuladas 17 decisões do Juiz Ivo Rosa, nos últimos 4 anos, por tribunais superiores e ele continuar a decidir casos tão complexos como a Operação Marquês? Se não é competente para ser Juiz, que arranje outra profissão. Não pode é fazer pouco dos portugueses?
Se não fosse o Panama papers o Ministério Público não tinha conseguido arranjar provas que incriminam os acusados na Operação Marquês. Seguiu-se o rasto do dinheiro. Foi até encontrado, num cofre de um banco suíço, um documento que no caso de morte de Carlos Santos Silva, 80% do dinheiro seria para o primo de José Sócrates. Provavelmente existirá um testamento ou documento que diga que em caso de morte, José Sócrates herda esse dinheiro. É como a herança da mãe…
O único crime de corrupção que o Juiz Ivo Rosa aceitou, o do amigo Carlos Santos Silva, já prescreveu segundo ele, contradizendo o Supremo Tribunal de Justiça com uma decisão do Tribunal Constitucional. A ser verdade, esperemos que não tenha sido encomendado…
Antigamente toda a gente sabia que o ditador Mobutu recebia uma percentagem de todos os grandes negócios que se faziam no Zaire, mas não existiam "contratos de corrupção" entre Mobutu e os corruptores! Toda a gente sabia e via a fortuna resultante do enriquecimento ilícito e injustificado de Mobutu.
Não faz sentido que depois da fase de inquérito, que começou em novembro de 2014 com a detenção do ex-primeiro-ministro, tenha sido aberta a fase de instrução da Operação Marquês, em 2019, competindo ao Juiz Ivo Rosa do Tribunal Central de Instrução Criminal decidir quem vai a julgamento. A abertura da fase de instrução é facultativa, mas já se sabe que os julgamentos mediáticos com acusados que podem pagar a vários advogados a utilizam para tentar não ir a julgamento, que alguns crimes caiam, que o julgamento seja atrasado o mais possível e no fim que possam prescrever os crimes que cometeram.
O que dirão os que agora dizem que o Ministério Público e o Juiz Carlos Alexandre foram derrotados pela decisão instrutória do Juiz Ivo Rosa, se o Tribunal da Relação vier a dar razão ao Ministério Público e ao Juiz Carlos Alexandre, revogando a decisão do Juiz Ivo Rosa?
Este excesso de garantias não faz sentido, pois vivemos em democracia e dispomos de um sistema de justiça independente e imparcial que garante a todos os cidadãos que se faz justiça.
Quantos anos vão ser necessários para concluir o julgamento da Operação Marquês, os recursos para tribunais superiores e o cumprimento da pena de prisão para quem for condenado?
Não é razoável que pessoas condenadas em primeira instância e confirmada a prisão na relação, continuem a utilizar os recursos para tribunais superiores para adiarem o cumprimento da pena. A nossa lei penal tem um excesso de garantias, pois foi feita depois de uma ditadura de 48 anos. Os novos criminosos de colarinho branco passaram a utilizar todos os mecanismos previstos na lei para tentarem não ser condenados, verem prescritos os seus crimes ou adiarem o mais possível o cumprimento da pena de prisão. A lei penal tem de ser revista. Poderá haver recurso para um tribunal superior para evitar os erros judicias e que inocentes sejam presos.
Há muitos anos que considero que deve haver a criminalização do enriquecimento ilícito e injustificado. Não faz sentido que alguém em funções públicas ou políticas e que não tenha rendimentos que justifique a sua súbita riqueza continue a passear-se impunemente sem que nada lhe aconteça.
Não percebo porque não se usa a colaboração premiada no combate aos crimes de corrupção, fraude fiscal e branqueamento de capitais, como se usa nos crimes de tráfico de droga e terrorismo.
A presunção de inocência existe para defender as pessoas inocentes. Não existe para defender os criminosos!
Depois de Al Capone ter morto e/ou mandado matar pessoas, toda a gente passou a saber que ele era um criminoso (gangster). Não foi preciso ser condenado em Tribunal. Até porque, nunca se consegui provar em tribunal, pois ele mandava matar as próprias pessoas que iam testemunhar contra ele. Foi preso por questões fiscais, porque o seu contabilista acabou por o denunciar!
O sistema político também não sai bem desta situação. Se a Constituição permite que os crimes económicos e financeiros, como a corrupção, a fraude fiscal e o branqueamento de capitais, continuem a ser praticados, o poder legislativo há muito tempo que já devia ter revisto a Constituição.
Também o poder executivo devia ter dado as condições materiais e humanas ao poder judicial para poder combater a corrupção, a fraude fiscal e o branqueamento de capitais, bem como, ter acabado com a partidarização da Administração Pública e criado um ambiente de conduta, com códigos de ética, em que não fosse tolerada a corrupção, a fraude fiscal e o branqueamento de capitais, assim como, com medidas preventivas para evitar que os crimes ocorressem.
47 anos não foram suficientes para alterar as leis e criar as condições para combater a corrupção, a fraude fiscal e o branqueamento de capitais! Quantos mais anos vão ser necessários?