Dois quilos de tecnologia, o desafio de voar numa atmosfera muito diferente da terrestre, com poeiras, ar rarefeito e temperaturas elevadas, e uma primeira missão bem sucedida. Pode descrever-se assim o voo de 39,1 segundos do helicóptero Ingenuity, que chegou a Marte a bordo do rover Perseverance e esta segunda-feira se tornou o primeiro objeto humano a descolar e aterrar a energia solar noutro planeta. Subiu três metros e manteve-se estável durante cerca de 30 segundos, regressando depois ao solo marciano, anunciou a agência espacial norte-americana NASA. Eram 11h35 (hora portuguesa).
Com a devida pompa, o primeiro “heliporto” fora da Terra recebeu o nome de Wright Brothers Field, uma homenagem aos pioneiros da aviação, Orville e Wilbur, que fizeram o primeiro voo controlado bem sucedido a 17 de dezembro de 1903.
“Hoje, 117 anos depois de os irmãos Wright conseguirem fazer o primeiro voo no nosso planeta, o helicópetro Ingenuity da NASA conseguiu realizar esse feito incrível noutro planeta. Embora estes dois momentos icónicos na história da aviação estejam separados pelo tempo e por 173 milhões de milhas de espaço (278 milhões de quilómetros), agora ficarão para sempre ligados”, assinalou Thomas Zurbuchen, administrador da agência.
O helicóptero não tem equipamentos a bordo, mas num tempo de drones a abrir a perspetiva em Terra visa demonstrar se a exploração aérea do planeta vermelho é também viável. A NASA recordou ontem que eram muitas as incógnitas neste primeiro voo. Marte tem um terço da gravidade da Terra e uma atmosfera extremamente fina com apenas 1% da pressão que existe cá à superfície. “Isto significa que há relativamente poucas moléculas de ar nas quais as duas pás de rotor de dois metros do Ingenuity podem interagir para conseguir voar”, salientou a NASA. A primeira prova está superada e a tecnologia do motor do helicóptero que agora entra para a história tem mão portuguesa. Florbela Costa, de 32 anos, nasceu em França, para onde os pais emigraram, e regressou a Portugal na juventude, para descolar nos últimos anos também para voos mais altos. Formou-se em Engenharia Aeronáutica pela Universidade da Beira Interior (UBI), hoje é gestora de projeto no SpaceLab do grupo Maxon, na Suíça, um das empresas que fornece tecnologia às missões da NASA em Marte e onde foi responsável pelo desenvolvimento dos motores do aparelho. “Os seis DC motores desenvolvidos pela Maxon, para controlar o movimento das pás do rotor, têm de ser muito robustos, para poderem aguentar as vibrações criadas durante a descolagem e aterragem e ainda a grande variação de temperatura existente no planeta”, explicou recentemente. Depois deste primeiro voo do Ingenuity, estão previstos mais quatro ao longo dos próximos 30 dias.