Acusado de associação criminosa, tráfico e mediação de armas, falsificação ou contrafação de documentos, de denegação de justiça e prevaricação e de favorecimento pessoal praticado por funcionário em coautoria com outros arguidos da PJM, entre os quais Vasco Brazão, elementos da GNR e Azeredo Lopes, o ex-diretor da Polícia Judiciária Militar negou, esta segunda-feira, ter agido contra a lei.
O coronel Luís Vieira assumiu que voltaria a tomar as mesmas decisões naquilo que diz respeito à recuperação do armamento furtado em Tancos, alegando que era um desígnio nacional e frisando em tribunal a ideia de que atuou da melhor maneira possível “em nome do interesse nacional”.
Marcelo negou envolvimento O coronel salientou as palavras do Presidente da República que insistentemente alertava para a necessidade de recuperar o material bélico e sobre os prejuízos que o furto causou na imagem das Forças Armadas.
É de recordar que, em julho de 2017, depois de ter defendido, em Castanheira de Pêra, que tinha de ser feita justiça “de alto a baixo, doa a quem doer”, Rebelo de Sousa voltou a remeter-se ao silêncio. No entanto, em novembro do ano passado, o Presidente da República anunciou que iria depor por escrito como testemunha no caso e viria a tornar público o seu depoimento.
No mesmo, afirmou que nunca falou com Vieira no âmbito deste processo, assegurando ainda que só teve conhecimento de que a recuperação das armas teria resultado de uma eventual encenação através da Procuradora-Geral da República, negando também desta forma qualquer eventual participação neste caso.
O Presidente “não recebera, sobre esse aparecimento, qualquer outra comunicação anterior, nem do Governo, nem de chefias militares, nem de Belém, nomeadamente da Casa Militar, seu Chefe, Assessores ou Ajudantes de Campo”, asseverou.
“Conflito de deveres” “Nunca me passou pela cabeça estar a agir contra a lei. Eu queria era recuperar o material e acautelar os riscos. Lamento ter estragado a carreira de militares [da PJM e da GNR]”, afirmou Vieira no seu interrogatório no julgamento do caso, que decorre em Santarém.
No final da sessão, os seus advogados consideraram que, no processo de recuperação do material furtado dos paióis, o coronel se confrontou com um “conflito de deveres”.
“Hoje o coronel faria o mesmo, porque recuperou o material, empenhou os seus homens e tinha consciência que a recuperação do equipamento era muito importante para o país. Deu uma ordem para que o material fosse recuperado para que os seus militares se empenhassem e está um pouco revoltado, porque estão aqui a serem julgados”, afirmou o advogado Manuel Ferrador, classificando de “honrosos e valiosos” os atos do seu cliente.
A seu lado, Vieira considera “conscientemente que não agiu contra a lei”, justificando que todo o trabalho da PJM, após o furto – ocorrido a 27 de junho de 2017 -, foi de recolher informação e recuperar o material, o que veio a acontecer em outubro de 2019 na Chamusca. Isto é, quando as autoridades agiram depois de uma denúncia anónima, tendo intercetado 44 armas de guerra, granadas e explosivos.
É de sublinhar que o material foi encontrado espalhado no mato e não num armazém. A GNR local não foi informada e a Procuradoria-Geral da República e a PJ civil, que estava a coordenar a investigação através da Unidade Nacional de Contraterrorismo, não acompanharam a operação levada a cabo pela PJM.
As contradições As versões apresentadas em julgamento pelos arguidos Luís Vieira e o seu subordinado major Vasco Brazão são contraditórias em relação à entrega de um memorando ao ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes, à questão da existência de uma chamada anónima, uma “farsa” montada pela PJM, e a existência de um informador [Fechaduras].
Recorde-se que, logo no dia a seguir ao achamento do material, Brazão adiantou que o ministro exigiu que fosse esclarecida a questão da chamada anónima, durante um telefonema que teve com Luís Vieira e este desmentiu, dizendo que só soube que foi feita a referida chamada uma semana depois.
Vieira segue, aliás, a mesma linha de pensamento apresentada na sessão do passado dia 22 de abril. “Só soube da chamada anónima uns dias depois pelo coronel Estalagem”, afirmou nesse dia, acrescentando que também não viu o chefe de gabinete de Azeredo Lopes a fotografar o memorando sobre o caso, que não participou na sua elaboração e que não informou o ministro sobre a existência de um informador.
É de lembrar que o julgamento foi suspenso a 14 de janeiro depois de um advogado ter testado positivo e foi retomado a 22 de fevereiro. Os 23 arguidos, entre eles o ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes, que até aqui estavam a ser julgados numa sala no piso superior do Tribunal de Santarém, passaram a ter que comparecer no Centro Nacional de Exposições e Mercados Agrícolas de Santarém — numa sala de 638 m2 que funciona como sala de audiências.