A busca da perfeição da lei certa exigida tem provocado danos profundos na confiança no sistema de justiça e no relacionamento dos políticos com a atividade económica.
Sente-se que estamos no limite do tempo admissível para encontrar uma solução que preserve a verdade democrática.
Não, não defendemos o exemplo da pobreza de Sócrates na Apologia de Platão, mas não era preciso tanto. Pelos nossos olhos, têm passado os exemplos mais acabados de enriquecimento injustificado, de promessas de vantagens, de circulação de favores, de atribuição negocial de cargos, de reserva de lugares, de saídas do poder para entidades dele dependentes.
O Estado deixa de ser o objeto do serviço para ser um mero veículo, uma ponte, um investimento, um título aquisitivo.
E isto acontece tanto com entidades públicas como com entidades privadas.
Estamos longe da reserva de um lugar num conselho de administração, de um lugar numa qualquer empresa pública como contrapartida à dedicação. Longe vai o tempo em que partidos se limitavam a negociar estes cargos entre si.
Confrontamo-nos com uma teia de influências desenhada para conveniência de alguns.
Tão claro é tudo isto que será absurda a sua negação.
E, mais, há a suspeita entranhada que grandes negócios tenham sido conduzidos com submissão do interesse público aos interesses económicos.
E percebemos como a intervenção da justiça é difícil, ou ineficaz, ou impossível.
Em bom rigor várias iniciativas parcelares têm sido empreendidas e todas elas têm acabado, quanto ao que verdadeiramente importa, no caixote do lixo.
Percebe-se que, sendo a nossa lei penal um valor adquirido em relação aos seus princípios fundadores, o pior que lhe podemos fazer é torná-la ineficaz, ou incompleta, ou insuscetível de aplicação.
Se assim fosse, triste consolação seria ter a melhor lei do mundo e a sociedade mais corrupta e impune.
Somos obrigados, portanto, a descobrir os alçapões que a minam e a refazer a confiança.
Continuamos a ter por certo que todos os arguidos são presuntivamente inocentes, que a condenação se não escreve na testa com a suspeita, que a opinião pública não é juiz.
Mas daí a passarmos a vida neste pingue-pongue de propostas e contrapropostas, de textos inconstitucionais e silêncios vai uma distância inadmissível.
Não tendo sido o único, em tempo oportuno, João Cravinho fez um conjunto de propostas corajosas. Foi impedido de atingir o objetivo com o voto contra do seu partido.
Fez história.
Há quantos? Há muitos anos.
Desde então outras iniciativas surgiram e foram desfeitas por imprecisão ou desinteresse.
Justiça se faça, porém, que alguns governos tentaram e outros assobiaram para o lado.
Uma sentença abriu de novo a caixa de Pandora.
Uma iniciativa de uma associação sindical de juízes relança parte do tema, concita atenções, parece irrecusável.
Adivinham-se as iniciativas mil.
Esperamos todos que esta oportunidade se não perca.
Esta corrida na qual todos querem chegar primeiro, esta serôdia pressa, este desejo de surgir no filme, denotam uma total má consciência.
Surge no momento em que o populismo se encontra às portas da cidade.
Não chega!