TdC. Capitalização do Novo Banco pode ir até aos 1600 milhões

Tribunal de Contas garantiu que “faltou transparência” sobre o impacto do BES e Novo Banco  nas contas públicas. Instituição finaceira disse que relatório tem “um conjunto de observações de caráter político que, pela sua natureza, não lhe parece que deva comentar”.

O valor da capitalização extra do Novo Banco (NB) que o Estado acordou com a Comissão Europeia no âmbito da venda do banco à Lone Star vai até aos 1600 milhões de euros, de acordo com a auditoria divulgada pelo Tribunal de Contas (TdC). No âmbito do acordo de venda, o Estado notificou Bruxelas de três medidas de auxílio estatal (com uma terceira carta de compromissos) consideradas necessárias para concluir a venda, que funcionam “como garantias de capitalização do NB para cumprir os rácios aplicáveis”, duas das quais após “esgotar outras alternativas”, como recurso ao mercado.

A primeira diz respeito ao Acordo de Capitalização Contingente (ACC) atualmente em vigor, que vai até 3890 milhões de euros e dos quais o Novo Banco já consumiu 2976 milhões de euros, restando 914 milhões de euros. As outras duas medidas de auxílio e que podem ser acionados caso falhem medidas alternativas, são a “tomada pelo FdR [Fundo de Resolução] de dívida subordinada emitida pelo Novo Banco, até 400 milhões de euros” e ainda uma “injeção de capital de retaguarda (backstop capital) pelo Estado português no NB até ao montante máximo necessário para garantir a sua viabilidade a longo prazo (1,6 mil milhões), no cenário adverso da Comissão Europeia”.

O que é certo é que o cenário adverso que implica esse montante foi feito “com base no plano de reestruturação preparado pela Lone Star para demonstrar a viabilidade do Novo Banco no final dessa reestruturação”, no final de 2021. No entanto, de acordo com respostas do ministério das Finanças à auditoria do TdC, este mecanismo de capitalização extra é “de caráter claramente subsidiário (depende da falha de instrumentos privados), mas constituiu um elemento essencial para assegurar a concordância da CE relativamente à venda do Novo Banco”, em 2017, e assim “impedir a sua liquidação”.

No entanto, as Finanças responderam ao garantir que o mecanismo é válido até ao final do período de reestruturação (31 de dezembro deste ano), garantindo que “o seu acionamento tem consequências negativas na reestruturação do Novo Banco, implicando uma redução adicional de trabalhadores e de agências, além da participação dos acionistas no capital ser diluída na correspondente proporção”. 

Mas as críticas não ficam por aqui. O Tribunal de Contas (TdC) considera que “não foi apresentada a demonstração do cálculo do défice de capital” do Novo Banco, que “o Fundo de Resolução tem o dever de exigir”. Isto significa que, segundo a entidade liderada por José Tavares “não tem sido devidamente cumprida a obrigação do Novo Banco reportar a informação sobre a execução do Acordo de Capitalização Contingente, por falta de formalização do acordo sobre a forma e substância do suporte dessa informação e pelo atraso de preparação desse suporte pelo Novo Banco (face ao prazo contratual de trinta dias), alegando depender de contas auditadas”.

E apesar da auditoria reconhecer que o financiamento público tenha concorrido “para a estabilidade do sistema financeiro, sobretudo por ter sido evitada a liquidação do banco e reduzido o risco sistémico”, garantiu que “não foi minimizado o seu impacto na sustentabilidade das finanças públicas nem reduzido o risco moral”. O TdC revelou também que “faltou transparência na comunicação do impacto da resolução do Banco Espírito Santo e da venda do Novo Banco na sustentabilidade das finanças públicas” e que “foco da imputação das perdas verificadas no Banco Espírito Santo e no Novo Banco não deve ser desviado dos seus responsáveis (por ação ou omissão) para onerar os contribuintes ou os clientes bancários (em regra também contribuintes”.

Após ser conhecida a auditoria, o ministério das Finanças garantiu que “os portugueses não sentiram, felizmente, os efeitos de uma eventual liquidação do Novo Banco, que teria acontecido caso ocorresse uma nova tentativa falhada de venda, depois do insucesso verificado em 2015, e que apresentaria custos diretos e indiretos muito superiores”, acrescentando que “com a venda, ficou definitivamente afastado o cenário da liquidação”. O gabinete de João Leão lembrou ainda que “o mecanismo de capitalização contingente, enquanto condição essencial à venda, salvaguardou o interesse público, preservou a estabilidade financeira, protegeu os depositantes e minimizou os impactos nas contas
públicas”.
E deixou ainda uma garantia: “O apoio financeiro prestado ao Fundo de Resolução é um empréstimo que será reembolsado pelo setor bancário”, considerando também que “o Governo prestou informação completa, verdadeira e consistente com a informação disponível junto das entidades competentes, e a comunicação pública sobre o processo de venda foi transparente e adequada”.

Informação incompleta

A entidade liderada por José Tavares disse ainda que a informação prestada pelo Novo Banco para a auditoria foi “incompleta e intempestiva”. E foi mais longe: que “A obrigação de o Novo Banco colaborar na auditoria não evitou que parte relevante da informação pretendida tivesse sido prestada de forma incompleta e intempestiva” e diz que o exemplo que se destaca é a “evidência subjacente ao próximo pedido de pagamento do Novo Banco ao Fundo de Resolução”, que não foi comunicada até 29 de abril.

Uma acusação afastada pela instituição financeira liderada por António Ramalho ao defender que essa informação é “errada e suscetível de induzir em erro os utilizadores do relatório e deve, nessa medida, ser corrigida”.
O TdC aponta vários episódios de pedidos de ficheiros ao Novo Banco em que considera que não foi cumprido o pretendido, ao que o Novo Banco responde que essa “conclusão é totalmente errada e não tem qualquer suporte”. E a instituição financeira vai mais longe: “Sem perdas nestes ativos, não há (nem nunca houve) lugar ao acionamento dos mecanismos de ACC”, refere o banco.

É de referir que, segundo o Tribunal de Contas, a alegação do Novo Banco tem a “intenção de se substituir ao auditor (a qual perpassa, de forma transversal, por toda a pronúncia)” e afirma que a sua “observação é factual”. Um cenário que leva a instituição financeira a considerar que o relatório tem “um conjunto de observações de caráter político que, pela sua natureza, não lhe parece que deva comentar”.

Injeção pública tem de avançar

A opinião é unânime junto do Banco de Portugal (BdP) e do Fundo de Resolução ao defenderem que não há impedimentos à injeção de dinheiro público na instituição liderada por António Ramalho. 

 O Banco de Portugal defende que esta auditoria é um “complemento” aos procedimentos que já existem para avaliar da legitimidade do dinheiro público recebido pelo Novo Banco, considerando que o documento revela que o contrato deve ser cumprido. “A convicção plena do Banco de Portugal é, por isso, a de que estão verificadas as exigentes condições para que seja prosseguida a normal execução dos contratos, permitindo-se assim que seja cumprida a sua missão de preservação da estabilidade financeira”, diz a entidade liderada por Mário Centeno. 

Por seu lado, o Fundo de Resolução admitiu que a auditoria “não identifica nenhum impedimento ao cumprimento dos compromissos e dos contratos que decorrem do processo de resolução do Banco Espírito Santo, iniciado em agosto de 2014”.

As duas entidades referem ainda que a auditoria concluiu que o financiamento público à instituição liderada por António Ramalho é considerada essencial para a preservação da estabilidade financeira.

PS pede audições

Depois destas conclusões, o Partido Socialista vai requerer audições no Parlamento da administração do Novo Banco, do Banco de Portugal e do Conselho Diretivo do Fundo de Resolução. João Paulo Correia disse ainda que a auditoria “feita em tempo recorde” pelo Tribunal de Contas demonstra que o “interesse público ficou defendido” com a venda do Novo Banco.

E garante que vai ser necessário prestar mais informações à Assembleia da República por parte da administração do banco até se chegar à conclusão que a administração financeira do banco sai mais fragilizada após as conclusões do documento. “A administração do Novo Banco tem de continuar a prestar mais informação e a prestar contas às entidades que a fiscalizam, nomeadamente ao parlamento português”, defendeu.