Cerca de oito mil migrantes de Marrocos entraram, esta terça-feira, em Ceuta, território espanhol que faz fronteira com o país africano, de forma ilegal, um número inédito neste país, que levou as autoridades espanholas a destacarem unidades do exército para controlar a situação na cidade.
Entre os migrantes, que entraram no país a nado ou através de embarcações improvisadas, é estimado que cerca de 1500 sejam menores – uma pessoa morreu a tentar chegar a Ceuta, informou o Governo espanhol, que já tratou de reenviar mais de dois mil migrantes para o seu país de origem.
O Governo espanhol enviou para Ceuta 200 militares, 150 polícias nacionais e 50 guardas civis, para ajudar os 1100 efetivos que habitualmente se encontram na cidade de Ceuta. Estas forças adicionais vão trabalhar em conjunto com as autoridades de Ceuta para controlar as fronteiras deste território e a entrada de mais migrantes de forma a evitar uma crise humanitária.
O mayor de Ceuta, Juan Jesus Vivas, comparou a chegada destas pessoas a uma “invasão”. “Não somos capazes de contar o número de pessoas que já entrou neste território”, disse à rádio Cadena Ser, citado pelo Al Jazeera.
“O exército está na fronteira a realizar um papel dissuasor, mas existe uma grande quantidade de pessoas do lado marroquino à espera de entrar”, explicou o Vivas.
As autoridades esperam que em breve consigam devolver todos os migrantes ao seu país de origem ao abrigo de um tratado assinado há mais de três décadas com Marrocos onde era declarado que todos aqueles que tentassem entrar em território espanhol a nado seriam devolvidos ao país.
A entrada dos últimos marroquinos em Ceuta não é uma novidade, este território tem sido um “íman para migrantes africanos à espera de entrar na Europa, apesar de estar altamente protegido e fortificado com uma cerca dupla”, escreve o Guardian.
No ano passado, 41.861 migrantes chegaram de forma irregular a Espanha, por via marítima e por via terrestre, um aumento de 29% em relação a 2019, em parte por causa da forte pressão migratória verificada nas Ilhas Canárias, segundo dados oficiais.
Contudo, nunca tantos migrantes entraram em tão pouco tempo em Espanha. Em 2018, ano em que o país registou o maior número de migrantes ilegais nos seus territórios, aproximadamente 2800 pessoas entraram em Espanha entre os dias 21 e 27 de junho, escreve o El País.
Fontes do Governo, citadas pelo jornal espanhol, afirmam que isto pode ser apenas o princípio de uma onda de emigrações em massa de Marrocos e de outros países da África subsariana.
Tensão internacional A chegada dos migrantes coincide com uma grande tensão nas relações entre Espanha e Marrocos.
Este choque eclodiu depois do líder da Frente Polisário e presidente da República Árabe Democrática do Saara (não reconhecida pela comunidade internacional), Brahim Gali, ter sido aceite pelo Governo espanhol num hospital em Logronho, onde está a ser tratado depois de ter sido infetado com a covid-19.
Apesar do Ministério dos Negócios Estrangeiros espanhol ter justificado a admissão de Gali por “razões estritamente humanitárias”, esta decisão não foi recebida com leveza por parte de Marrocos devido à questão do estatuto do Saara Ocidental, antiga colónia espanhola considerada como “território não autónomo” pelas Nações Unidas na ausência de um acordo definitivo, e que opõe há décadas Marrocos e a Frente Polisário, um movimento financiado pela Argélia que periodicamente entra em confrontos armados com Marrocos.
Analistas têm apontado que esta recente quebra diplomática pode estar na origem destes intensos fluxos migratórios.
“As autoridades marroquinas reduziram a geralmente pesada militarização das costas”, explicou o líder do Observatório do Norte para os Direitos Humanos, Mohammed Ben Aisa, à Associated Press.
Apesar de Espanha não ter confirmado estas afirmações, o primeiro-ministro Pedro Sánchez, que cancelou a viagem que tinha previsto fazer a Paris para participar numa cimeira sobre o financiamento de África, organizada pelo Presidente francês, Emmanuel Macron, garantiu que o Governo irá utilizar “a máxima firmeza” para restaurar a normalidade em Ceuta.
“Os seus cidadãos devem saber que têm o apoio total do Governo de Espanha e a máxima firmeza para garantir a sua segurança e defender a sua integridade como parte do país face a qualquer desafio”, escreveu Sanchéz no Twitter.