por Henrique Pinto de Mesquita
O tribunal escatológico da pós-modernidade – vulgo Twitter – fez, recentemente, mais uma das suas. A vítima, quase comida pela própria revolução que criara, foi Luís Monteiro, deputado bloquista. Uma sua ex-namorada decidiu twittar que sofria violência doméstica do deputado. Error 404 e grande bug causado no discurso bloquista. «A vítima tem sempre razão», lembram-se? Desta vez quase correu mal.
Quase porque não correu. E ainda bem, pois fora do bloco ainda há noções e não se condenam pessoas por acusações no Twitter. Certo…? Repetir três vezes, bloquistas e Faristas: não se condenam pessoas por acusações no Twitter; não se condenam pessoas por acusações no Twitter; não se condenam pessoas por acusações no Twitter… Lição aprendida? Estupendo.
O deputado escreveu um texto de defesa no Facebook. Neste, Luís apelou à honra da sua palavra e ao direito à «presunção de inocência». Certo, Luís. Super-sim. É isso mesmo. É isso que as pessoas que vivem num país civilizado fazem. Não é suposto queimarem-lhes o nome por acusações no Twitter, qual pátio inquisidor dos tempos modernos. Por isso, Luís, digo-lhe sem ironias: não só acredito na sua inocência como admiro a coragem que demonstrou ao expor-se como vítima. Deve servir como exemplo a outros homens. Mas voltemos à chapa.
Achei igualmente comovente o amparo que o Bloco lhe deu. Catarina Martins, matriarca da família, saiu em rápida defesa do jovem Luís, hasteando um luminoso letreiro em neon para todo o país: ‘Presunção de Inocência’, lia-se, num tom avermelhado. Fez-se luz! Perfeito, Catarina: estamos a ficar crescidinhos! Até já acreditamos que não se condenam pessoas por acusações no Twitter e que, afinal, um homem pode estar inocente ainda que haja uma queixa contra si.
Contudo, Catarina, permita-me: já que «leva o Estado de Direito muito a sério», como disse à Antena 1, que tal levá-lo sempre e não apenas quando lhe apetece? Porque é que, de repente, esse belo letreiro em néon – com que iluminara Luís – ficou sem luz quando se tratou do caso de Rui Moreira? Que tão significante game-changer se poderá ter dado para numa segunda-feira defender uma coisa e na quarta-feira vilipendiá-la de forma tão abjeta? Então só aplica a ‘presunção de inocência’ quando lhe convém? Atenção, pois não está aqui em causa ter exigido a demissão de Moreira per se. O que está é, em primeiro lugar, a sua ridícula falta de coerência e, depois, a forma como exigiu a sua demissão.
Nem cinco horas se tinham passado desde o fim do discurso de Moreira e já o acusava de «se fazer de coitadinho»? Não viu o mesmo vídeo que eu: um homem que conhecemos austero a ter um momento de fragilidade? Viu – e, tal como nós, detetou esse momento de fragilidade. Mas enquanto uns perceberam a solenidade do momento e o respeito que se lhe exigia, a Catarina atacou ferozmente mal pôde – tal qual um leão. Depois, fê-lo na certeza de que magoaria – tal qual uma raposa. É evidente que estudou bem a lição de Maquiavel, o que, considerando o seu radicalismo ideológico, não deverá surpreender ninguém. Jogou baixo, Catarina. E isso é absolutamente asqueroso. Asqueroso pois não tem sequer certezas do ataque que lhe dirige. Cabe aos tribunais decidirem. E se, como diz, «leva o Estado de Direito muito a sério», deve levá-lo sempre. Não vale tudo – na política ou na vida. Terêncio escreveu que, por ser Homem, «nada humano lhe era estranho». Assim, como um humano e não como um abutre, deveria ter-se comportado: privilegiando a compaixão por um Homem notoriamente abalado em detrimento de sangue político.
Catarina, não se esqueça: a revolução acaba sempre por comer os seus. Cá estaremos, quando assim for, com a elevação, coerência e respeito que tanto faz questão de deixar para os outros.