25 de Abril. Rio exige explicações, Marcelo desvaloriza, Costa ignora

4.500 euros por mês, um contrato de mais de cinco anos e uma equipa com secretária e motorista à disposição. Estas são as condições da nomeação de Adão e Silva como comissário executivo nas celebrações dos 50 anos do 25 de Abril.

A nomeação de Pedro Adão e Silva para comissário executivo das comemorações dos 50 anos do 25 de Abril de 1974 levantou celeuma um pouco por todo o país. O salário de cerca de 4.500 euros por mês que o comentador político vai auferir, um contrato que dura mais de cinco anos e uma equipa de técnicos, secretário pessoal e motorista à sua disposição são as condições do posto oferecido a Adão e Silva, e as críticas não tardaram em chover, nomeadamente dos partidos da direita. Rui Rio, Francisco Rodrigues dos Santos, André Ventura e João Cotrim Figueiredo alçaram a sua voz contra a nomeação, apontando para uma alegada troca de favores entre Adão e Silva e o Partido Socialista, que terá garantido a nomeação para o lugar.

Adão e Silva, que fez parte do Secretariado Nacional de Ferro Rodrigues no início do milénio, passa a ocupar um cargo para o qual foi nomeado pelo próprio António Costa.

A nomeação foi alvo de escrutínio no Jornal Editorial do Porto Canal, na passada segunda-feira, e fez estalar a polémica. Após os disparos do canal da cidade do Porto, foi a vez de Rui Rio, presidente do Partido Social-Democrata, se pronunciar. “O PS tem os seus ‘comentadores independentes’ espalhados pelos diversos canais para vender a propaganda socialista e tentar destruir os adversários”, começou por atacar o líder do PSD numa mensagem no Twitter, onde apontou diretamente o dedo a Adão e Silva. “Esse trabalhinho tem um preço. Chegou a vez de Pedro Adão e Silva receber a compensação. Pagamos nós; com os nossos impostos”, rematou. Mais tarde, em declarações aos jornalistas, Rio reforçou as críticas, exigindo a António Costa explicações sobre a nomeação de Adão e Silva.

O primeiro-ministro, no entanto, respondeu ao dirigente social-democrata, acusando-o de insultar Pedro Adão e Silva. “É uma declaração tão insultuosa que, por uma questão de respeito com o líder da oposição, me exige que a ignore”, declarou António Costa, citado pela Lusa.

Aval presidencial Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente da República, fez um intervalo nas celebrações do 10 de junho, que decorrem na ilha da Madeira, para comentar a polémica em torno da nomeação de Pedro Adão e Silva. A escolha foi do Governo, garante o Presidente, mas teve os eu “aval”, defendeu, citado pelo jornal Observador. Adão e Silva é um “historiador, um politólogo atento à realidade contemporânea do país” e uma escolha “muito consensual”, referiu Marcelo, que desvalorizou a polémica. “Democracia significa que não há duas opiniões iguais sobre ninguém”, defendeu, garantindo não ver qualquer “razão substancial para não exercer essa função”.

Regalias e mordomias Quando se fala de ‘tachos’ e ‘mordomias’, as críticas a esta nomeação referem-se ao regime remuneratório em que Adão e Silva passará a estar incluído, e à duração do seu mandato. É que as celebrações começam em março de 2022, mas o mandato começou já nesta segunda-feira, e estende-se até ao final de 2026. Ao contrário dos membros da Comissão Nacional e do Conselho Geral destas comemorações, o comissário executivo e a sua equipa (que passa a ser equiparada “para efeitos de designação e estatuto, a membros do gabinete de membro do Governo”) vão beneficiar de remuneração pelo trabalho realizado. “A Comissão Executiva é composta por um comissário executivo e um comissário executivo adjunto, os quais […] são equiparados, para efeitos remuneratórios e de competências, a dirigentes superiores de 1.º e de 2.º graus, respetivamente”, pode ler-se no despacho. Assim, conclui-se que Adão e Silva passará a auferir uma remuneração mensal que, segundo os dados da Direção-geral da Administração e do Emprego Público, se situa nos 3.745,26 euros por mês, acrescidos de 780,36 euros para despesas de representação, durante a duração do seu mandato – os tais 5 anos, 6 meses e 24 dias.

Além dos 4.500 euros mensais que Adão e Silva vai auferir durante o mandato, que se estende muito para lá da data oficial dos 50 anos do 25 de Abril de 1974, o agora comissário executivo terá ainda à disposição uma equipa técnica de apoio com três adjuntos, três técnicos especialistas, um secretário pessoal, um motorista, e ainda até quatro técnicos superiores que poderão vir a integrar a equipa, recrutados em regime de mobilidade.

“25 de Abril merecia mais” Quem não perdeu tempo a criticar esta nomeação foi a Iniciativa Liberal. João Cotrim Figueiredo lançou um ‘desafio’ ao indigitado comissário: “Desafio o Comissário Pedro Adão e Silva a usar o seu longuíssimo mandato e recursos disponíveis para organizar também as celebrações dos 50 anos do 25 de Novembro. Ofereço-me para ajudar, pro bono”, pode ler-se num tweet publicado pelo dirigente. Ao i, fonte do partido confessou considerar que “o 50.º aniversário do 25 de Abril não merece esta solução que se tornou hoje [terça-feira] pública”. Esta é “uma estrutura anafada, de duração excessiva e liderada por um destacado militante socialista”, atacou o partido, que acredita que esta nomeação “reproduz alguns dos traços mais indesejáveis do regime que o PS pretende solidificar”, entre eles “a promoção de individualidades como contrapartida de serviços prestados ao PS”.

Críticas a norte Ao canal nortenho e ao dirigente social-democrata, juntou-se ainda Rui Pinto, o famoso hacker responsável pelo polémico caso Football Leaks, partiu também para o Twitter para criticar a escolha de Pedro Adão e Silva. “O verdadeiro tacho, um desperdício de recursos, uma imoralidade! Durante 5 anos, 6 meses e 24 dias, Pedro Adão e Silva vai usufruir das melhores regalias que o Estado tem para oferecer. Isto para organizar as celebrações do 50º aniversário do 25 de Abril”, disparou, não deixando ponta de dúvida da sua discordância com esta nomeação. “Sem dúvida que estes senhores têm muito para celebrar, a bazuca europeia está para chegar”, acrescentou ainda Rui Pinto.

‘Chicão’ e Ventura atacam A nomeação do comentador chamou ainda a atenção de Francisco Rodrigues dos Santos, líder do CDS-PP, que emitiu um comunicado onde classificou a escolha como “um insulto para os portugueses”. “Num momento em que o país se vê a braços com uma grave crise económica […] o Governo não olha a meios para promover um dos protegidos do ‘socialistão’, amplamente conhecido enquanto porta-voz da propaganda socialista e comentador da bola, e oferece-lhe um cargo durante seis anos pago a peso de ouro e recheado de mordomias”. O líder centrista exigiu ainda a António Costa que “escolha outra pessoa, de preferência com indiscutível currículo para a função, reduza drasticamente os custos e a duração desta comissão… e tenha respeito pelos portugueses”.

Já André Ventura, líder do Chega, também fez público o seu desagrado com a situação. Através da sua conta no Twitter, Ventura visou Adão e Silva, “esse comentador independente de coração socialista”, que, acusa, “acabou por ver recompensada a subserviência a António Costa em tantos programas televisivos”.

O i contactou o BE, o PS e o PCP sobre o assunto, mas não obteve qualquer resposta até ao momento.