Na última composição do Governo a ministra do Mar deu à costa.
Foi-se num momento em que se criticavam as relações familiares entre governantes e seus próximos e o afastamento apareceu como uma tentativa de minorar o mal.
Saía a ministra, mulher de outro ministro, e regressava ao seu lugar de deputada eleita.
Não seria questão de competência, convinha dizê-lo até pelo notório apagamento da sua atividade.
E era bom afastar a ideia de que se tinha ido buscar alguém com um perfil muitíssimo mais adequado à função.
Portanto a saída foi um ato sacrificial
A ex-ministra constituiu-se e anunciou-se como merecedora de uma reparação.
Quem está atento percebeu que alguma coisa viria a acontecer.
Foi agora.
Azar dos Távoras, mesmo em cima da contestação multiplicada ao marido ministro.
Com a perceção generalizada de que, a breve prazo, lhe caberá, a ele, em sorte, a saída.
Nasce a ideia de que se está a preparar o futuro.
E os meios de comunicação enchem-se de referências ao valor do estipêndio e às características do cargo.
Falamos do gabinete destinado à coordenação dos transportes.
Ressalta à evidência que a riqueza curricular seria essencial para a escolha.
Nem por isso.
Mesmo que a entidade indicada seja ouvida e opte, a verdade é que, depois de todo este longo tempo em que as nomeações em substituição atribuíram vantagem e o respeito pela observância dos critérios se perdeu, a escolhida anunciada sê-lo-á porque sim.
Um pouco mais ao lado, mas ainda dentro das competências do mesmo Ministério, rebenta outra notícia.
O antigo chefe de gabinete do atual ministro das Infraestruturas (e outras utilidades) está sob investigação da Justiça.
O que faz ele agora? Administra os Portos do Douro e Leixões e Viana, ao que parece.
Transitou do apoio aos Assuntos Parlamentares para esta área. Fez-se, este, ao mar. Dir-se-á que descobriu a sua vocação de um salto.
Não é normal, convenhamos.
E quando dizemos que não é normal queremos mesmo dizer que é incompreensível, é errado, é condenável.
No mesmo crescendo de oportunidade anuncia-se a nomeação de um coordenador para a comemoração dos cinquenta anos do 25 de Abril com um estatuto próximo do de um ministro. Com retribuição significativa, gabinete, motorista, instalações e prazo de exercício dilatado.
Abespinha-se o líder da oposição contra a escolha daquela pessoa. Denuncia um ato de favor. Reação ao lado, diria.
Que momento é este que se celebra? É aquele que mais devia convocar todos em união.
Sendo a designação feita pelo governo, a exigência básica seria ouvir os partidos representados quanto ao perfil da personalidade, quanto ao nome e quanto ao estatuto do cargo. Não foi assim.
Eis, portanto, como três pequenos nadas são tudo.
Como se constrói e afirma uma prática de arrogância, de sobranceria, de fechamento.
Como o Governo vive no seu mundo e o país noutro.
Dir-se-á que o relevante é a saúde, a economia, a saída da crise.
Certamente.
Mas, em qualquer era, para que ninguém nos meta os dedos pelos olhos, nota-se muito a falta de uma carta dos deveres de decência.