Quando o mar bate na rocha

A pandemia, qual mar castigador entre vagas maiores ou menores, continuará a bater forte, fortemente (e mais na economia do que na saúde), mas – tirando os peixes graúdos pescados à linha porque se puseram a jeito na rebentação e morderam o anzol – continuará a lixar sempre os mesmos… os mexilhões.

Entre o tem-te-não-caias de Eduardo Cabrita, as diatribes de Augusto Santos Silva, o conveniente isolamento preventivo de João Pedro Matos Fernandes no dia em que MP e PJ ‘buscaram’ o Ministério do Ambiente, com a esquerda de feição e uma oposição de direita flat, só faltava Luís Filipe Vieira no olho do furacão (ou melhor, numa avalanche do ‘Monte Branco’) para António Costa poder ir de férias tranquilo.

Com o presidente do Benfica nos calabouços da PSP e a contas com Carlos Alexandre (do ‘Ticão’), Rosário Teixeira (do MP) e Paulo Silva (da AT), tudo o mais é relegado para segundo plano.

De Joe Berardo, que já passaram duas semanas sobre a sua detenção, à remodelação que mais dia, menos dia – ou mais mês, menos mês, ou antes ou depois das autárquicas – o primeiro-ministro anunciará ao país para refrescar a imagem do Governo e a sua própria. Passando inclusive pela covid-19, cuja quarta vaga segue descontrolada, num país em acelerada vacinação e maior confusão, seja pela desinformação seja pela ineficácia da resposta das autoridades de Saúde e do Governo.

Sim, afinal por que razão vivemos em estado de emergência entre março e maio de 2020 e entre novembro do mesmo ano e abril de 2021?

Se o estado de calamidade e a lei da proteção civil são suporte legal bastante para impor restrições a direitos fundamentais como a liberdade de circulação (até para o recolher obrigatório e para a discriminação de quem não tem um certificado digital) e ao exercício parcial ou total de legítimas atividades económicas (com a redução de horários ou mesmo proibição de abertura ao público), por que razão se banalizou o estado de emergência e, de 15 em 15 dias, andaram os órgãos de soberania entretidos com decretos e votações de sucessivas renovações pelos vistos sem qualquer interesse prático? E para quê tanta comunicação ao país e tanta formalidade?

Desde o início da pandemia, Portugal tem oscilado entre o melhor e o pior e quase sempre em contraciclo com o resto da Europa, incluindo com o país vizinho.

Ao fim de quase ano e meio está mais do que provado que Portugal anda a reboque do vírus e das suas variantes, tendo cometido erros crassos (da tolerância no Natal à irresponsabilidade dos festejos do título nacional de futebol em Lisboa, ou à irracionalidade da organização da final da Liga dos Campeões Europeus no Porto, com uma inexistente apesar de garantida bolha de adeptos britânicos, ou à incompetência de permitir ajuntamentos ou apelar à deslocação em massa a Sevilha para apoiar a Seleção no Euro 2020).

Mas tudo isso, com Luís Filipe Vieira preso e suspenso das funções de presidente do Benfica, pouco ou quase nada importa.

Vieira chegou ao fim da linha no Benfica, que entrará agora num novo ciclo.

Costa segue como uma rocha inabalável no seu posto de comando.

Na sua enésima entrevista enquanto primeiro-ministro, ao Público, no passado fim de semana, o líder socialista já deixou claro que, muito mais do que há dois anos, está agora ainda menos motivado para ‘pôr os papéis para a reforma’, pelo que os candidatos à sua sucessão podem esperar bem sentados.

Já estava, aliás, anunciado o adiamento do Congresso do PS para final de agosto (se a pandemia não obrigar a novo reagendamento), transformando, assim, num comício de rentrée e de lançamento da campanha para as autárquicas com cobertura mediática assegurada durante o fim de semana inteiro.

Ou seja, mais uma operação de propaganda – do partido e do Governo – como tão bem sabe fazer, neste particular, a bem oleada máquina socialista.

Nascido a 17 de julho de 1961, António Costa está obrigado a passar o 60.º aniversário com os Presidentes Marcelo e João Lourenço – com os quais já manteve bem melhores relações e muito menos ‘irritantes’ –, porque Angola marcou a próxima cimeira de chefes de Estado e de Governo da CPLP_precisamente para os próximos dias 16 e 17, em Luanda.

Mas, depois disso, pode preparar já outras malas e partir de férias, porque, desta vez, ninguém o condenará.

A pandemia, qual mar castigador entre vagas maiores ou menores, continuará a bater forte, fortemente (e mais na economia do que na saúde), mas – tirando os peixes graúdos pescados à linha porque se puseram a jeito na rebentação e morderam o anzol – continuará a lixar sempre os mesmos… os mexilhões.