por José Maria Matias
Aluno do mestrado de Ciência Política e Relações Internacionais na Universidade Nova de Lisboa
Tenho um amigo que diz que Portugal pode aspirar a posições de topo no panorama político internacional precisamente pela sua irrelevância nos assuntos do mundo. É penoso ouvi-lo, mas não deixo de concordar. O PS colocou-nos na periferia da Europa, dependentes e desprovidos de ambição. A ausência de aspiração socialista levantou a seguinte questão: como preencher o vazio deixado pelo fim do império e pelas próprias condicionalidades das opções tomadas no princípio desta República? Como resposta, para o PS, Portugal deveria liderar a agenda dos direitos humanos e ser uma espécie de paladino da moralidade, curiosamente a mesma posição que a União Europeia adotou face às potências emergentes, um dos fatores que conduziu ao caminho para a irrelevância a que chegou o projeto europeu. É um paralelismo assustador, mas factual, ilustrado pelos 8 anos de bloqueio ao acordo comercial entre a União Europeia e a Índia que teve como uma das razões, precisamente, os direitos humanos. Retornando a Portugal e à agenda externa do PS, pensemos no recente caso da Carta dos Direitos Humanos Portuguesa na Era Digital. Esta foi feita a pensar na Declaração de Lisboa, que seria assinada pelos 27 Estados-Membros, em mente e com a intenção, de acordo com o Secretário de Estado para a Transição Digital, de ser o ‘pontapé de saída’ para uma carta internacional. Tudo isto seria muito bonito, não fosse o artigo 6.º da Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital que dá azo à instauração da censura. O paternalismo socialista em todo o seu esplendor! Aliás, tanto a Cimeira Social como a Declaração de Lisboa seriam os pontos altos da Presidência portuguesa do Conselho da União Europeia e acabaram por se tornar grandes embaraços internos. Pior, ao mesmo tempo que o Governo português pretendia liderar e proteger os direitos humanos na era digital, a Câmara Municipal de Lisboa era apanhada a partilhar dados de manifestantes anti-Putin com a Rússia. É esta a coerência moral do Partido Socialista. E consequências políticas? Nenhumas.
Dado a atuação vergonhosa do PS, é este um dos grandes desafios das Direitas, o posicionamento de Portugal no mundo, a começar pela Europa. Hoje, o PS não se inibe de ser orgulhosamente o bom aluno da Europa e ainda bem que assim é, tudo fica claro. Esta postura deixa à Direita a possibilidade de, no mínimo, aspirar a uma emancipação da Europa, isto é, não estar dependente da Europa, deixar definitivamente a posição de mendicidade. Não só por razões internas, mas também porque a UE corre o sério risco ou de implodir enquanto projeto político ou de se transformar seriamente num futuro a muito curto prazo. Os principais problemas estruturais da Europa continuam por resolver, nomeadamente, as migrações, o fraco crescimento económico e o inverno demográfico. E se em Portugal o primeiro problema ainda não é estruturante, estamos na linha da frente nos outros dois.
O segundo desafio que se impõe às Direitas de Portugal no plano internacional, é a situação política em Espanha, uma vez que esta continuará a ter uma preponderância relevante para os desígnios nacionais. Qualquer desintegração territorial ou mudança de regime, por queda da Monarquia e pelo fim do bipartidarismo traria uma instabilidade muito significativa à Península o que seria sempre um fator de destabilização no nosso país, por questões económicas e geopolíticas.
Por fim, o último desafio está relacionado com a relação entre os Estados Unidos e a China. Atualmente, todos os indicadores levam-nos a crer que a China vai ultrapassar os EUA ainda na primeira metade deste século. Neste sentido, o mundo será moldado pela medição de forças entre estas duas superpotências. Para Portugal, esta tensão ganha destaque na medida em que a China se tornou o principal investidor e parceiro estratégico em África, com interesse categórico em Luanda. Ao mesmo tempo, a China é, neste momento, o principal parceiro comercial do Brasil, ou seja, a lusofonia não pode ignorar a China, mas sim tê-la como um interlocutor que deverá ser cuidadosamente considerado.
A Europa, a Espanha e a China poderiam ter sido um claro traço diferenciador da condução externa do Partido Socialista. Contudo do evidente fracasso das opções externas do PS, nascem as oportunidades futuras para as Direitas portuguesas, isto é, reduzir a dependência da Europa, manter a atenção a Espanha e ponderar o conflito EUA-China. O mundo não parou no meio da nossa estagnação moral, económica e recessão democrática. É por isto que o entendimento das Direitas não pode ser só para os próximos 4 anos, talvez nem quatro mandatos cheguem. No fundo a Direita tem a obrigação de responder a uma questão simples: poderá Portugal aspirar a outra coisa que não se resuma a esta atitude de mendicidade e posição periférica europeia? No dia em que o fizer teremos uma alternativa clara ao PS.