O pior adversário político

A verdadeira essência da democracia fica prejudicada e acaba por alinear a desejável participação ativa dos cidadãos, que optam então por escolher a pior solução possível, a abstenção que todos deveriam combater.

por Alexandre Faria
Escritor, advogado e dirigente do Estoril Praia

A credito que a abstenção constitui o pior adversário político em qualquer eleição, assumindo uma relevância ainda maior nas eleições autárquicas, face à escolha de proximidade dos seus eleitos e porque estes atos eleitorais constituem o melhor modelo para desenvolver e harmonizar os valores de cidadania e de participação.

Também por estes motivos de intimidade e de subsidiariedade, as eleições autárquicas não escapam ao mal que se tem generalizado nos últimos anos, onde proliferam supostas opiniões de perfis falsos em redes sociais, fenómeno que continua desregulado e por punir com a devida severidade, tanto pela insolência fácil atrás de um teclado sem rosto, como pelas legiões de mercenários impertinentes que insultam com total impunidade. Na maioria dos casos, resumem-se a poucas pessoas facilmente detetáveis, que manobram vários perfis em simultâneo, de modo a parecerem uma multidão ruidosa, paga principescamente por candidaturas sem ideias ou projetos concretos para apresentar.

A verdadeira essência da democracia fica prejudicada e acaba por alinear a desejável participação ativa dos cidadãos, que optam então por escolher a pior solução possível, a abstenção que todos deveriam combater.

Se juntarmos os discursos belicistas e grosseiros de alguns candidatos, interessados em cavalgar as ondas que promovem a ignorância, deparamo-nos com uma fórmula explosiva que nega tudo o que foi conquistado pela liberdade e pela defesa dos valores democráticos.

Ao analisarmos os dados oficiais das últimas eleições autárquicas em Cascais, verificamos valores de abstenção de 56,46% em 2017, de 62% em 2013 e de 56% em 2009, o que significa que mais de metade dos eleitores deste concelho resolve inibir-se, sistematicamente, de participar no ato eleitoral mais significativo para a sua localidade. Trata-se de um cenário preocupante que deve merecer a atenção, a devida leitura e o contributo de todas as candidaturas, algo que merecia ser transversal em prol do desenvolvimento de um sentimento de comunidade. Mas, infelizmente, nem todos se preocupam, porque a ausência de participação também interessa a alguns.

Tem sido muito interessante e merecedor de estudo analisar a postura séria e elevada ao longo desta pré-campanha por parte da coligação Todos por Cascais, apoiada pelo PS, PAN e Livre. Focada em exclusivo no futuro de causas que os une e na defesa intransigente da participação na vida política, quer por parte dos eleitores em geral, quer dos seus próximos eleitos, tem conseguido manter-se à parte dos mais vis e cobardes ataques, tanto dos acima referidos mercenários sociais, envoltos numa ilusão de muitos, como daqueles que decidem vandalizar ou destruir cartazes nas vias públicas, por fazerem da devastação a sua prática política rotineira.

Ao não responder da mesma forma e por se preocupar tão-só com a defesa das suas convicções e projetos para o futuro da sua terra, que se pretende una, solidária, ambientalmente responsável e integradora entre o litoral e o interior, esta coligação Todos por Cascais está a constituir-se numa referência nacional de promoção da democracia, um exemplo a seguir na verdadeira democracia que todos acolhe. Porque nos tempos que correm, cada vez mais, o adversário político mais perigoso chama-se abstenção e são as causas que vencem eleições.