Com os maiores grupos privados a anunciarem cortes na oferta convencionada a beneficiários da ADSE na sequência da entrada em vigor de novas tabelas de preços, a presidente do conselho consecutivo do subsistema de saúde dos funcionários públicos admitiu ontem que poderão ainda existir alterações ao documento que entrou em vigor esta quarta-feira e que será feita uma avaliação das “reivindicações”.
Em declarações ao jornal Eco, Manuela Faria lembrou que antes das novas tabelas já existiam prestadores que se tinham desvinculado do regime convencionado da ADSE em alguns procedimentos e criado tabelas específicas nesses casos. “Lamentamos, gostaríamos de ter todos connosco com todos os atos convencionados mas também sabemos que é uma situação difícil, já não ocorria com a anterior tabela“, disse.
As declarações surgiram depois de CUF e Luz Saúde terem avançado com o corte de alguns atos das convenções, como consultas e cirurgias (dependendo dos médicos) e partos, em ambos os grupos apenas a partir de 1 de janeiro de 2022, como o i noticiou.
A nova tabela da Luz Saúde foi divulgada ontem e revela que o internamento em cuidados intensivos terá também apenas acesso para beneficiários da ADSE em regime livre e que, na zona da grande Lisboa, os exames de anatomia patológica também deixam de integrar as convenções com a ADSE.
Também ecografias nas unidades da grande Lisboa, com exceção da ecografia mamária e dependendo do médico, passam a ser possíveis apenas no regime livre (com reembolso à posteriori), bem ecografias obstétricas.
Entretanto o grupo Lusíadas Saúde publicou online uma nota em que indica que está também a analisar o impacto das condições apresentadas para rever as condições, assumindo no entanto que “apesar de a análise global ainda estar em curso, há determinados procedimentos clínicos, especialidades ou médicos que poderão deixar de estar incluídos na convenção”.
Não tendo ainda fechado que procedimentos saem e permanecem na convenção, o grupo anunciou, tal como a Luz Saúde e a CUF, que terá uma tabela de preços especial para os clientes da ADSE e dos subsistemas IASFA, SAD PSP e SAD GNR possam continuar a ter acesso aos hospitais e clínicas da rede no regime livre, pedindo posteriormente reembolso.
No fundo, por esta via, as condições da ADSE nestes grupos passariam, para um conjunto de atos, a ser equiparáveis às de um seguro de saúde ainda que com preços próprios, mas sem a modalidade mais parecida com o funcionamento do Serviço Nacional de Saúde em que o utilizador faz apenas um “co-pagamento” e não assume o custo na íntegra para depois ser reembolsado.
O regime convencionado é no entanto o mais utilizado pelos beneficiários da ADSE. O último relatório de atividades publicado pelo subsistema de Saúde, referente ao ano de 2019, dá conta de que naquele ano a faturação total entrada na ADSE foi de 597 milhões de euros, sendo 458 milhões de euros em regime convencionado e 139 milhões em regime livre.
Naquele ano, 901 393 beneficiários recorreram a cuidados de saúde no regime convencionado, com cirurgia, medicina (consultas) e a quimioterapia a representarem quase 70% da despesa faturada. Utilizaram o regime livre da ADSE 570.208 beneficiários, sendo o reembolso médio por beneficiário de 246 euros.
O fim de mais consultas e cirurgias mais diferenciadas em alguns operadores pode implicar assim mais despesa inicial dos beneficiários, procura por outras unidades convencionadas/privadas ou pelo Serviço Nacional de Saúde. O i questionou esta semana a ADSE sobre qual o impacto esperado em termos de encargos para beneficiários e subsistema com as alterações introduzidas, mas não teve resposta.
Em comunicado enviado às redações na quarta-feira, a ADSE indicara que as tabelas tinham sido “amplamente discutidas e negociadas com os prestadores”, não deixando em aberto novos ajustes. “A tabela, revista nestes pressupostos, representou um enorme esforço de rigor e de compromisso, visando o acesso dos beneficiários a cuidados de qualidade, mais consentâneos com as atuais práticas da medicina (com recurso a outras áreas do desenvolvimento tecnológico, como a robótica ou a neuronavegação, entre outros), junto de uma rede de cuidados ainda mais ampliada e próxima”, informou o organismo, admitindo que a fase de transição pudesse levar a inquietudes e desconfortos em face das novidades.
“Chantagem” Em comunicado, a Frente Comum dos Sindicatos da Administração Pública considerou ontem inaceitável qualquer aumento de pagamento direto por parte dos beneficiários, o que com as novas tabelas acontece por exemplo no caso das consultas, e criticou a reação do grupo Luz e CUF, entretanto seguida pelo grupo Lusíadas.
“Não se tratando de uma atitude nova por parte dos grandes grupos de prestadores privados, de chantagem para com a ADSE, deixa clara a intenção de confundir os beneficiários e abrir caminho ao fortalecimento dos seguros de saúde, em detrimento do reforço da ADSE”.