Retratos de uma vida

D. Maria II engravidou 12 vezes e teve 11 partos, tudo isto em 16 anos, a uma média de um filho por cada 17 meses (…) Foi uma mãe dedicada e política de pulso forte. 

Por Nélson Mateus e Alice Vieira

Querida avó,

Fui ao Palácio Nacional da Ajuda visitar a belíssima Exposição D. Maria II. De princesa brasileira a rainha de Portugal. 1819-1853.

Penso que nunca te disse, D. Maria II é uma das minhas rainhas preferidas e um dos livros da Isabel Stilwell que mais gostei.

Nasceu em 1819 no Rio de Janeiro. Era a filha mais velha do então imperador Pedro I do Brasil e da arquiduquesa Maria Leopoldina da Áustria. Maria da Glória foi a única monarca da Europa a nascer fora de terras europeias. Com apenas 7 anos, torna-se rainha de um reino que não conhecia. 

Casou por três vezes. Primeiro com o seu tio, o infante D. Miguel de Bragança. Esse casamento acabou por ser declarado nulo. De seguida casou com príncipe Augusto de Beauharnais, que morreu poucos meses depois. Foi no 3º casamento que encontrou o príncipe dos seus sonhos, aquele que viria a ser conhecido como D. Fernando II, o Rei Consorte de Portugal. D. Maria II engravidou 12 vezes e teve 11 partos, tudo isto em 16 anos, a uma média de um filho por cada 17 meses. Desde a sua primeira gravidez, aos dezoito anos de idade, Maria II enfrentou problemas para dar à luz, com trabalhos de parto prolongados e extremamente difíceis. Sendo precisamente esta a causa da sua morte, aos 34 anos, a dar à luz o infante Dom Eugénio, seu 11.º filho.

Foi uma mãe dedicada e política de pulso forte. Durante dezanove anos comandou os destinos de Portugal e moderou as guerras entre absolutistas e liberais.

De entre as muitas obras que ficarão em exposição até ao dia 29 de setembro, na Galeria do Rei D. Luís (nome do segundo filho de D. Maria II, e que viria a herdar a coroa de Portugal), destacam-se várias jóias pessoais de D. Maria II e a Coroa Real Portuguesa que há mais de duas décadas não é exposta ao público.

Quando vieres a Lisboa, podemos desafiar a Isabel Stilwell e vamos visitar a Exposição. O que te parece?

Bjs
 

Querido neto,

Também acho que D. Maria II fez um excelente trabalho sobretudo no campo das artes: para já, deve-se a ela a criação do Teatro Nacional. Claro que era muito influenciada pelo marido : o Rei D.Fernando II era o maior patrono das artes e da cultura em Portugal. Era do seu próprio bolso que pagava os estudos daqueles que se mostravam merecedores disso. A expressão ‘bolsa de estudo’ vem daí: era o dinheiro que saía ‘do bolso de el-Rei’.

Mas sobre teatro havemos de falar noutro dia.

E como tu o mencionaste, apetece-me falar do Rei D. Luís, filho de D. Maria II.

D. Luís tinha, digamos, uma dupla personalidade: durante a noite era El Rei; à noite transformava-se em Dr. Tavares e ia por essas ruelas em busca de bares, mulheres e rambóia. (Uma das suas primeiras amantes foi a actriz Rosa Damasceno)

Mas nunca misturou as coisas. E foi um Rei exemplar : a ele se devem, entre outras coisas, a abolição da pena de morte e da escravatura.

Claro que a mulher, D. Maria Pia de Sabóia, naõ era parva e sabia das aventuras do marido. Mas reagiu de uma maneira muito inteligente : gastando-lhe o dinheiro todo em joias, e sedas. E quando a criticavam por gastar tanto, respondia: ‘Querem rainhas? Paguem-nas!’!

D. Luís gostava muito de ciências, mas também pintava e tocava música. E, com mais alguns elementos da sua corte, formou um quarteto, que dava recitais no palácio da Cidadela de Cascais, onde habitualmente D. Luís residia.

Mas digamos que, apesar de melómano, como intérprete era muito fraco.

Um dia organizou um recital na varanda do palácio, donde só se via o mar e o Cabo da Roca.

No final, não se contentando com os aplausos de circunstância, quis saber a opinião de cada um. 

E começou por um dos seus ministros.

«Que achou deste quarteto?»

O desgraçado, muito encavacado, pensou, pensou e, olhando para o mar e para o Cabo da Roca, disse: «Majestade, é o quarteto mais ocidental da Europa».

Aprende.