Pode ser difícil compreender qual o apelo de escutar Joe Rogan, um comediante de 54 anos, grande entusiasta das artes marciais e antigo concorrente do Fear Factor. Mas, mais ou menos três vezes por semana, uns 11 milhões de pessoas param para ouvir o seu podcast, The Joe Rogan Experience, em que este entrevista os personagens mais aleatórios, sejam comediantes, músicos e lutadores, ou supostos pensadores, onde se incluem tanto investigadores de instituições conceituadas, como bioengenheiros do MIT, ou conhecidos teóricos da conspiração. Careca, com um vozeirão, sempre vestindo uma t-shirt esticada sobre os bícepes, Rogan fala com os seus convidados durante umas duas horas, frequentemente degustando uísque ou marijuana, seja sobre lutas de jaula, o espaço, drogas psicadélicas, suplementos, rotinas de exercício físico, física quântica, ou as críticas à mais recente mania da esquerda americana.
Pelo meio, o ouvinte talvez apanhe uma boa dose de desinformação. Como quando Rogan se mostrou cético quanto à vacina contra a covid-19, dizendo que não recomendaria a um jovem de 21 anos que a tomasse. «Se és uma pessoa saudável, e fazes exercício o tempo todo, és jovem e comes bem, não creio que te precises de preocupar com isso», garantiu o locutor. É um tema recorrente no programa – tudo se cura com força de vontade, dieta exercício e, claro, os suplementos que compõem boa parte dos anúncios no The Joe Rogan Experience, como a Neuro Gum. uma pastilha que mistura cafeína, um composto encontrado em fungos e um pouco de vitamina B, prometendo «concentração constante ao longo do dia».
Não é de espantar que desinformação na boca de Joe Rogan seja motivo de preocupação. Afinal, trata-se de um fenómeno estranho, um homem que se transformou num dos conteúdos de media mais consumidos no planeta, o mais bem pago produtor de podcasts, um género em ascensão, que recebeu uns 100 milhões de dólares por um acordo de exclusividade com o Spotify, uma das mais populares plataformas de streaming, onde conseguiu ter o podcast mais ouvido em 2020. Ao mesmo tempo, parece ser uma espécie de fenómeno de nicho, relegado aos recantos da internet, a celebridade mais famosa de que talvez nunca tenha ouvido falar.
A preocupação aumentou ainda mais quando Rogan veio a público, num vídeo no Instagram, anunciar aos seus mais de 13 milhões de seguidores que tinha sido infetado com covid-19, e que começara de imediato a ‘tratar-se’ com uma variedade de fármacos, incluindo ivermectina, um desparasitante para cavalos – pode parecer óbvio, mas importa lembrar que a covid-19 resulta de um vírus, não de um parasita – que pode causar náuseas, vómitos, dor abdominal, problemas neurológico e até falência hepática, requerendo hospitalização. «Não sou uma fonte respeitada de informação, nem sequer para mim mesmo», viria a justificar-se Rogan, face às críticas. Se os seus muitos fãs têm noção disso, é outra questão.
Mas afinal, quem são os ouvintes de Joe Rogan, o homem que pôs a bolsa mundial a tremer, fumando uma ganza com Elon Musk, à frente das câmaras, deixando os investidores da Tesla e da SpaceX convencidos que o CEO estava doido?
71% deles são homens, mais de metade dos quais têm rendimentos acima da média, com uma média de idades à volta dos 24 anos, mostra uma sondagem recente da Media Monitors. Na prática, «Rogan corteja uma audiência de bros de classe média, por quem as elites culturais culturais têm particular desprezo – tipos com tatuagens de arame farpado que enchem os seus frigoríficos de bebidas energéticas Monster», lê-se na Atlantic. «Ele partilha das suas paixões, daquilo que os entusiasma, num momento em que o discurso público os rotulou de infantis, problemáticos ou num plano inclinado até ao trumpismo», continuava. E, numa América cada vez mais polarizada, nada indica que Rogan perca o seu apelo tão cedo.