Decisão sobre nova calendarização do Mundial discutida no fim do mês

Seguindo as ideias de Arsène Wenger, a FIFA parece cada vez mais virada para a realização do Campeonato Mundial de dois em dois anos. Dia 30 é dia de ouvir as federações internacionais.

Ainda há muito para discutir sobre a proposta do francês Arsène Wenger, que pretende que o Campeonato Mundial de futebol passe a ser realizado de dois em dois anos, ao contrário do atual período de quatro em quatro anos.

A sugestão do francês, que é diretor para o desenvolvimento da própria FIFA, tem ecoado positivamente nos corredores do órgão máximo do futebol mundial, que está agora a desenvolver os trâmites para discutir esta ideia, apesar das vozes dissonantes que se têm feito sentir.

O organismo tutelado por Gianni Infantino vai, neste âmbito, organizar uma reunião, a 30 de setembro, com as federações membro, para discutir a proposta de Wenger. “Foram enviados os convites para as federações e confederações para que sejam consultadas em 30 de setembro numa cúpula online. Será a oportunidade de estabelecer um debate aberto e construtivo a nível global”, explicou a FIFA, em comunicado.

A ideia de realizar o Mundial de futebol de dois em dois anos surgiu recentemente pelas mãos da Federação de Futebol da Arábia Saudita, em maio deste ano, e foi adotada por Arsène Wenger, mas não é, de todo, um projeto novo. Há mais de 20 anos que se fala deste assunto, desde que Joseph Blatter sugeriu a realização do campeonato cada dois anos, pondo fim ao sistema atual. Um sistema que o mesmo acusava, já em 1999, de estar “desatualizado”. “Vem dos anos 1930, quando as equipas se moviam de um continente para o outro em barcos”, acusava Blatter, na altura recém-chegado à presidência da FIFA.

A proposta de Wenger engloba também uma alteração às janelas internacionais do calendário mundial de futebol, promovendo janelas menos frequentes, mas mais longas, apontando para uma ou duas janelas por ano, eventualmente nos meses de outubro e março, onde os emblemas internacionais lutariam por um lugar no Mundial. O francês defende que, com mais edições do Campeonato Mundial, será dada a hipótese a mais seleções nacionais de participar nesta competição, acusando o atual diretor para o desenvolvimento da FIFA o facto de, desde 1930, haver ainda 133 seleções que nunca participaram neste evento mundial
de futebol.

 

Críticas e apoios

O próprio Comité Olímpico Internacional (COI) insurgiu-se contra a proposta da FIFA, acusando que vai “inevitavelmente começar a colidir com os Jogos Olímpicos”, conforme avançou Sebastian Coe, membro do COI, ao jornal britânico The Guardian.

O órgão máximo do futebol internacional tem sido, por outro lado, apoiado nesta nova proposta por diversas figuras do desporto, como o antigo craque brasileiro Ronaldo, que disse, em declarações aos jornalistas, olhar “com muito otimismo para essas mudanças”. “Não tenho dúvidas de que o campeonato do mundo vai continuar a ser a competição mais prestigiada do mundo. Foi pensado há quase 100 anos e a velocidade dos tempos de hoje é diferente. Isso leva-nos a pensar mudar o formato para melhorar a qualidade do espetáculo para os adeptos”, defendeu Ronaldo “Fenómeno”.

 

Vozes em contra

A proposta de Wenger não tem caído bem a algumas federações de futebol pelo mundo, nem à própria UEFA. Aleksander Ceferin, presidente do órgão europeu que gere o futebol profissional no continente, foi um dos mais ativos críticos da ideia, acusando a falta de “consulta”. “Considerando o grande impacto que esta reforma pode ter em toda a organização do futebol, é generalizado o espanto de que a FIFA pareça estar a lançar uma campanha de relações públicas para promover a sua proposta, enquanto tais propostas não foram apresentadas a confederações, associações nacionais, ligas, clubes, jogadores, treinadores, clubes e toda a comunidade do futebol”, queixou-se Ceferin já há algumas semanas, quando a ideia começou a ganhar tração. A crítica foi de mãos dadas com a posição tomada pela Associação de Ligas Europeias, que reúne, entre outras, a Premier League, LaLiga, Serie A, Bundesliga e Ligue 1, e que se opôs “firme e unanimemente a qualquer proposta para que o Mundial da FIFA tenha lugar a cada dois anos”, citada pelo jornal espanhol As.

Quem se juntou à polémica mais recentemente foi um conjunto de entidades portuguesas associadas ao futebol profissional nacional, que emitiram um comunicado em conjunto a criticar a proposta da FIFA. A Federação Portuguesa de Futebol (FPF), Liga Portugal (LPFP), Sindicado dos Jogadores Profissionais de Futebol (SJ), Associação Nacional de Treinadores de Futebol (ANTF) e Associação Portuguesa de Árbitros de Futebol (APAF) juntaram-se para criticar os planos de Arsène Wenger, apontando a “sobrecarga dos calendários e a saúde física dos atletas” e o “impacto sobre a saúde mental dos jogadores, obrigados, neste formato, a fazerem duas concentrações anuais de várias semanas” como os principais argumentos contra este novo formato.

Mas a crítica não tem vindo só das instituições europeias. Na América do Sul, a CONMEBOL alçou-se também contra a ideia. O órgão máximo do futebol sul-americano afirmou que a mudança na calendarização do Mundial “implicaria uma sobrecarga praticamente impossível de gerir no calendário internacional de competições”, e poderia “colocar em risco a qualidade de demais torneios, tanto de clubes como de seleções”.

 

Projeto inédito

A realização do Mundial de futebol de dois em dois anos quebraria uma calendarização que se mantém desde o início do campeonato, no ano 1930. Só uma vez na sua história se viu um hiato que não o de quatro anos entre edições, sendo preciso recuar aos anos 1942 e 1946, quando, devido à Segunda Guerra Mundial, a competição não se levou oficialmente a cabo, havendo um hiato de 12 anos entre o Mundial da França, em 1938, e o Mundial de 1950, no Brasil.