Dizem que o ódio faz mal. Até pode fazer, mas eu sinto-o. Nesses momentos ponho a tocar Zé Cid. Mas logo passa o Cid e o ódio fica.
Não que o ódio seja necessariamente à pessoa do Paulo ou à pessoa do Joaquim. O ódio é mais sobre o que o Paulo ou o Joaquim são e, por consequência, representam. Tenho vários ódios. Versam, sobretudo, sobre questões de caráter ou estilos de vida. Arquetipemos: quem me irrita joga – é titular e goleador! – no Pensamento Parolo Futebol Club.
O maior dos meus ódios é dirigido àqueles que maltratam pessoas em posições inferiores. São, quase sempre, criaturas muitíssimo inseguras. Por norma, revelam-se quando vão a restaurantes e, sentindo uma caganita de poder sobre o empregado, maltratam-no. Por vezes nem é preciso tanto para me repugnarem: basta serem apenas simpaticamente falsos e apagarem o sorriso quando estes estão pelas costas, voltando a atenção para ti como se fosses mais importante. Meu: eu sou mais team-empregados do que team-teu-amigo-e-falsa-simpatia-com-os-empregados. Remato e reitero: as pessoas que eu mais odeio no mundo são aquelas que tratam mal pessoas em posições inferiores, particularmente empregados de mesa. Sugiro, até, a criação de uma milícia reivindicativa do bom tratamento dos empregados de mesa. Esta deveria colocar dez ou vinte marmanjos a circular pelos restaurantes para topar quem eram os selvagens que andavam a ser prepotentes com os empregados. Sempre que tal se verificasse não havia avisos ou tickets: pras, um valente estalo – e rola um dente de ouro ao velho Carlos, estragando a mariscada prometida à amante.
Outra coisa que odeio são famosos estúpidos. Podemos, por favor, parar de tornar famosas pessoas estúpidas? É aquele género de gente tão inculta, tão básica, tão espumosa, que ficou chocada com a leitura da passagem de São Paulo e as ‘mulheres submissas’. Amiga, o problema nem é associares aquilo ao machismo – cada um faz as suas interpretações –, o problema é mesmo teres 20 e tal anos e ainda não te haveres cruzado com uma das mais importantes figuras da tua cultura. Problema esse que se agudiza pelo facto destas ovelhas, loiras, lindas, podres em gloss, serem seguidas por centenas de milhares de outros bípedes. Ou seja, a estupidez delas não é uma estupidez inofensiva e limitada: é uma estupidez contagiosa e infinita. Convinha à gente inculta, com plataforma e com milhares de seguidores, um dia entender que é gente inculta, com plataforma e com milhares de seguidores. Enfim, fosse eu verdadeiramente superior e estas situações apenas far-me-iam rir. Não é o caso: para já, irrita-me que pessoas tão desinteressantes tenham tanta visibilidade e, dessa forma, multipliquem a miséria intelectual que são.
Terceiro e último ódio deste texto: pessoas que vestem fato de treino e passam tardes a fio a pastar no sofá. Que desprezam qualquer tipo de coisa que não seja futebol, carros ou fotografias de mulheres a rolar indevidamente no WhatsApp. É o mesmo tipo de pessoas que acha que a poesia é para gays ou que o Ventura salvará o país. Imaginem o que é ter a dádiva da vida, da Tannhäuser de Wagner, das crónicas do Lobo Antunes, da história do Le Mans 66, do frio do outono, das francesinhas da Martins, das piadas do Cleese, das opiniões do Pedro Marques Lopes e, mesmo assim, preferir ficar esparramado no sofá a olhar para o telemóvel ou a ver o Big Borther? Epa, nem merecem o ar que respiram. Deviam pagar impostos só por existir. Então a vida é esta coisa maravilhosas e passam tardes deitados no sofá a ver crescer a barba? Está mal. Está mal e isso irrita-me.
‘Coisas tão pequenas e banais’, cantava o Zé Cid: o tal que, simpaticamente, vai defendendo a minha baliza dos perigosos atletas do Pensamento Parolo Futebol Club.