Imprensa estrangeira destaca tiros no jogo do Montijo. “O futebol em Portugal teve um capítulo triste em sua história”

Depois de terem sido disparados nove tiros para o ar, no final do jogo do último domingo, a imprensa estrangeira descreveu os confrontos como “cenas lamentáveis” e uma “carnificina”.

“Eu diria que é uma loucura! Futebol é paixão e sempre haverá lutas, mas acho que a polícia poderia ter lidado com a situação de forma diferente, em vez de a piorar”, começa por explicar, em declarações ao i, o jornalista desportivo inglês Chris Burton, não concordando com a forma como foi encarado o final do jogo entre o Olímpico Montijo e o Vitória de Setúbal B (0-0), a contar para a 6.ª jornada da 1.ª divisão distrital da AF Setúbal, neste domingo.

O profissional que exerce desde 2006, mas que se dedica exclusivamente ao desporto desde 2007, tendo passado por órgãos de informação como a rede televisiva Sky, publicou o artigo ‘Tiros disparados em Portugal durante luta pós-jogo entre jogadores e adeptos’, na tarde desta segunda-feira, no site Goal.

No mesmo, é possível ler que “o jogo entre o Olímpico do Montijo e o Vitória de Setúbal B acabou em caos com o confronto entre adeptos, jogadores de futebol e treinadores”, mencionando que “a polícia foi obrigada a disparar tiros para o ar na tentativa de interromper um confronto ‘feio’”. 

Por este motivo, a Polícia de Segurança Pública (PSP) abriu um inquérito disciplinar à atuação dos agentes que dispararam este domingo, sendo que, em comunicado enviado aos órgãos de informação, esclareceu que “o efetivo policial destacado no local, para garantir a segurança do evento desportivo, interveio imediatamente, para terminar os desacatos e as agressões em curso”.

“Três polícias produziram disparos de advertência, com arma de fogo, para o ar. Devido à intervenção policial, foi possível fazer cessar a desordem e as agressões e repor a ordem pública no recinto desportivo”, lê-se no texto. Tendo em conta que desta ação não se registaram feridos graves ou danos, o inquérito disciplinar foi aberto “para averiguar se os recursos a arma de fogo cumpriram com a legislação e regulamentação interna aplicáveis”. 

“A PSP reportará os incidentes às autoridades competentes, quer desportivas, quer judiciais”, concluiu. “Se nenhum tiro for disparado, o incidente não será mencionado em lugar nenhum porque é apenas mais uma discussão no final do jogo”, avança Burton, considerando que este caso é diferente. “Nunca tinha visto nada parecido antes e os jogadores pareciam atordoados. O envolvimento dos adeptos não ajudou, pois eles são mais difíceis de controlar do que os jogadores e nem sempre fazem o que lhes é pedido”, constatou.

“Depois de um empate sem golos, houve uma carnificina no apito final. Uma ação decisiva foi necessária para restaurar a paz, com a situação a escalar rapidamente a ponto de os eventos ficarem fora de controlo”, redigiu, tendo salientado que “dois polícias tentaram interromper a confusão, mas não conseguiram separar os envolvidos” e rematando que “conforme a violência se intensificou, outro polícia apareceu e nove tiros foram disparados para o ar”.

“Batalha campal com disparos para o ar” que não é inédita Nos restantes órgãos de informação internacionais, a visão dos jornalistas que acompanharam o desfecho do jogo alinhou-se com a de Burton. A título de exemplo, no diário espanhol Marca, lê-se “Batalha campal brutal em Portugal” e na versão brasileira do internacional ESPN, foi veiculado que um “jogo em Portugal termina em ‘cenas lamentáveis’ e até com a polícia dando tiros para o alto para dispersar a confusão”, sendo frisado que “o futebol em Portugal teve um capítulo triste em sua história”, na medida em que “um jogo da 1ª divisão distrital da Associação de Futebol de Setúbal apresentou cenas impressionantes de violência neste domingo”.

Contudo, a situação não constitui um episódio isolado no panorama do futebol. Em 2018, o presidente do PAOK, o russo-grego Ivan Savvidis, entrou em campo com uma pistola à cintura depois de o árbitro da partida ter anulado um golo à sua equipa na receção ao AEK naquele que foi um jogo crucial, sendo que o Governo grego suspendeu o campeonato.

Tal verificou-se ao minuto 90, quando o internacional cabo-verdiano Fernando Varela desbloqueou o nulo cabeceando para o fundo das redes dos atenienses. Em primeira instância, o árbitro validou o golo, porém, recuou e surgiram os protestos da formação de Salonica e a invasão de Savvidis, que acabou por ser alvo de um mandato de detenção por parte da polícia grega.

No mesmo mês, a Liga grega de futebol baniu Savvidis dos estádios durante três anos, sendo que teve de pagar 100 mil euros de multa e o PAOK perdeu três pontos na tabela, caindo para o terceiro lugar, a cinco do líder, o AEK, e a um do Olympiacos. A decisão incluiu igualmente uma multa de 63 mil euros para o clube e o incidente conduziu a que o vice-ministro dos Desportos, Yiorgos Vassiliadis, suspendesse o campeonato.

“Não acho que seja uma questão de violência no futebol como um todo, já que o incidente na Grécia e o de Portugal baseiam-se em indivíduos que agem por conta própria – não o desporto como um todo”, assinala Burton, acrescentando que “no entanto, os problemas entre os adeptos estão a aumentar – a Inglaterra terá que jogar dois jogos à porta fechada devido aos problemas no Euro 2020 – e o racismo continua a ser um problema” e, deste modo, “há coisas que as autoridades têm de resolver”.