Por José Manuel Azevedo – Economista
Quero começar por referir que reconheço o enorme esforço feito pelo Estado em matéria de modernização dos serviços públicos. E que é hoje possível, sem nos deslocarmos a uma Repartição de Finanças, aos Registos e Notariado, a um hospital do SNS, etc., tratar dos nossos impostos, solicitar certidões de registo, marcar consultas e teleconsultas médicas, por aí fora. Todas elas atividades ‘burocráticas’ que nos ocupam imenso tempo, obrigando quem trabalha a deslocar-se na hora do almoço, a chegar de madrugada às filas, aguardando que os serviços abram, ou, em certos casos, a pedir dispensa às chefias ou a ‘meter’ meio dia de férias…
Consequência evidente quando tal não é possível: a aglomeração de uma imensidão de gente fora das instalações e junto aos guichets de atendimento, conduzindo ao desespero tanto os clientes (contribuintes) como os próprios funcionários desses serviços. Essas situações verificam-se hoje com menor acuidade, ainda que recentemente se tenham repetido nas Lojas do Cidadão, tema debatido de forma ampla pelos meios de comunicação social, razão pela qual não me vou sobre ele deter.
Mantêm-se, contudo, situações muito desagradáveis, algumas relacionadas com a área da Justiça, em que os prazos de prescrição continuam a permitir deixar ir em liberdade arguidos que não chegam a ver o seu processo transitado em julgado; e outras, a maioria, relacionadas com a Saúde, em que permanecem as enormes filas de espera, tanto para a realização de consultas como para as intervenções cirúrgicas em diversas especialidades, residindo o problema não apenas no período de pandemia que vivemos desde março de 2020, mas sim no continuado défice de meios materiais e humanos que permitiriam reduzir os tempos de espera e até a própria mortalidade. Veja-se, a propósito, a recente vaga de demissões em hospitais públicos de diversas ARS…
Indo diretamente ao tema da modernização dos serviços públicos, se é verdade que muito melhoraram, não o é menos que:
1. Subsistem situações em que sistemas interativos de resposta por voz (vulgo IVR) nos dão um conjunto de opções que nem sempre correspondem à situação que pretendemos explicar e ao problema que precisamos de resolver, o que nos leva a selecionar a última – a de contactar um operador;
2. Acionada essa opção, não são raras as vezes em que, depois de termos aceite a gravação da mensagem, ouvimos alguns minutos de música, ela própria digitalizada, após os quais o telefonema ‘cai’, sem que consigamos chegar à fala com o dito operador;
3. É-nos também dada a hipótese de deixar o nosso número de telefone para que sejamos ‘mais tarde’ contactados pelos serviços. Quantos de nós ficámos ‘pendurados’ em definitivo ou durante alguns dias até que tal sucedesse?
4. A ‘diluição de responsabilidades’ por diversos organismos e entidades nem sempre contribui para a resolução das dúvidas que nos são colocadas no quotidiano. Isto porque, em lugar de se tentar entender a questão do cliente (contribuinte), se aconselha desde logo o mesmo a ligar outro número, enviar outro mail, etc. Abaixo verão a que me refiro;
5. Tendo tido uma dúvida sobre o site ‘predial online’ e sabendo que a taxa de sucesso de contacto com a ‘linha registos’ é, em geral, muito reduzida, tentei, primeiro, chegar à fala com uma Conservatória do Registo Predial, em Lisboa. Assim:
a. Durante 5 minutos, a ligação deu-me interrompida.
b. Resolvi, depois, contactar as ‘Soluções Integradas de Registo’. Daí, felizmente, atenderam-me! Ao mencionar que o tema tinha que ver com a predial online, a resposta, simpática mas imediata, foi que não, que com isso nada tinham a ver, que tentasse a já referida ‘Linha Registos’.
c. Sem qualquer preocupação em saber o que me apoquentava, fui eu que, por iniciativa própria, expliquei qual era o meu problema, dizendo que não acreditava que o interlocutor não me pudesse esclarecer. Esclareceu!
d. Satisfeito com o resultado, entrei no site, solicitei a certidão permanente e, azar dos azares, a ligação à rede da SIBS não funcionou… Depois de escolhida a opção ‘pagamento por MB’, não chegava a obter a referência para pagamento e a aplicação caía!
e. Voltei à ‘Linha Registos’ – De lá veio a mensagem automática – «De momento, todos os nossos agentes encontram-se ocupados. Por favor aguarde. O serviço que selecionou encerra às 17h. Dependendo do volume, poderá não ser possível atender a sua chamada. Pedimos desculpa pelo incómodo. O tempo de espera previsto poderá ser superior a 10’.» De minuto e meio em minuto e meio – confesso que não cronometrei – ouvia a mesma mensagem. Até que passou a «… mais de 5’» e depois a «…menos de 5’». Não foi mau, dado que, cerca de 19’ depois de ter selecionado a opção, lá fui atendido. Muito simpaticamente, foi-me referido que o problema identificado já tinha sido reportado, não sendo possível, contudo, dar-me qualquer perspetiva de tempo de resolução. Ou seja, lá terei que fazer novas tentativas, tantas até que consiga algo que até é do interesse do Estado português – pagar os emolumentos devidos pela Certidão!
Numa ‘palavra’ – processos ineficientes, recursos humanos nem sempre preparados e sistemas não operacionais só complicam a vida ao cidadão! Onde está a agilidade e a leveza a que alude um dos banners do site da Modernização do Estado e da Administração Pública?