A GNR sinalizou, em outubro, mais de 44 mil idosos a viverem sozinhos ou isolados. Segundo os dados da Operação Censos Sénior 2021 – cujo objetivo passa por garantir um conjunto de ações de patrulhamento e de sensibilização à população mais idosa que vive sozinha e/ou isolada – 44484 idosos vivem nesta situação ou em vulnerabilidade face à sua condição física, psicológica, ou outra que possa colocar em causa a sua segurança.
Este é o caso de três idosos que vivem em Loures, cidade do distrito de Lisboa, cujo quotidiano foi denunciado à ativista de direitos humanos Francisca de Magalhães Barros. “Sou bombeira e fui acionada para uma ocorrência, para um homem de 75 anos que supostamente sofreu uma queda e apresentava um hematoma na face”, o que corresponde ao início da mensagem que a jovem recebeu via Instagram e à qual o i teve acesso.
Ao chegar ao local, a profissional deparou-se com um casal e com uma irmã do idoso que havia caído que viviam “numa casa sem condições de habitabilidade e de salubridade”, tendo “imensas dificuldades económicas” e, por isso, “passam muita fome”, sendo que “o dinheiro não chega para comprar medicamentos”. Esta realidade afigura-se particularmente perigosa na medida em que todos padecem de diabetes e de hipertensão arterial, com a agravante de que dois tinham a glicemia superior a 400 mg/dL quando a bombeira e o colega verificaram os parâmetros vitais.
“Liguei 144, para a Linha de Emergência Social. Relatei o que vi e pedi ajuda. Pedi GNR para o local. Foram levados para o Hospital Beatriz Ângelo” e, naquela instituição hospitalar, terá transmitido “toda a informação” que havia recolhido à enfermeira que realizou a triagem. “Nem os cartões de cidadão têm com eles. Comem uma sopa por dia e pão dado por uma professora de uma escola junto da casa deles. Aliás, foi ela que ligou para o 112 a pedir uma ambulância”.
Por se ter apercebido do panorama assustador, e apesar de não desejar que a identidade seja revelada por medo de represálias, contou a Francisca que os idosos se queixaram de uma vizinha com quem têm tido alguns problemas, revelando que esta terá tentado asfixiar um deles. “O meu maior receio é que, após a alta hospitalar, regressem àquele casebre que até ratos tem”, narrou a mulher que, na casa para a qual foi chamada, não viu comida, apenas latas de comida para gatos.
Vila Real e Guarda com números alarmantes “Acho extremamente lamentável que se verifique que a figura dos nossos avós seja tratada desta forma e possa estar deixada ou largada ao abandono”, afirma Francisca, encarando este caso como “chocante”. “Questionamos, muitas das vezes, o que é estar sinalizado numa situação ou referenciado, quando as ajudas estão ou são tão precárias. Nesta situação, é o caso destes três idosos, mas já estamos fartas de ouvir a palavra ‘referenciado’ em situações de violência doméstica que acabam em tragédias”, lamenta a também pintora e cronista, deixando claro que “não deixa de ser dantesco que os nossos idosos possam viver desta maneira”.
É de referir, a título de exemplo, que de acordo com a informação avançada pela Rádio Campanário, que já no final de outubro o Comando Territorial de Setúbal, através da Secção de Prevenção Criminal e Policiamento Comunitário (SPC) de Santiago do Cacém, em colaboração com as Conferências Vicentinas de Santiago do Cacém, entregou um cabaz de bens alimentares a um casal de idosos em situação de vulnerabilidade que eram dois dos 1742 sinalizados no distrito de Setúbal.
Segundo os dados deste ano, recolhidos durante o mês de outubro por meio de 172 ações em sala e 3431 ações porta a porta e que abrangeram um total de 19812 idosos, os idosos de Loures poderiam estar incluídos no total de 1125 sinalizados em Lisboa – que, há dois anos, era a capital da União Europeia com mais idosos, segundo o Eurostat.
Sabe-se que os distritos de Vila Real e da Guarda são aqueles onde foram contabilizados mais idosos a viver nestas condições, ou seja, 5191 e 5012, respetivamente. Seguem-se os distritos de Beja, Bragança, Faro, Portalegre e Viseu, com mais de 3000. Curiosamente, o único distrito que tem menos de mil idosos sinalizados é o do Porto, com 946.
Durante este ano, os militares levaram a cabo uma série de ações “que privilegiaram o contacto pessoal com as pessoas idosas em situação vulnerável”, tendo como objetivo principal sensibilizar e alertar este público-alvo para “a adoção de comportamentos de segurança que permitam reduzir o risco de se tornarem vítimas de crimes, nomeadamente em situações de violência, de burla e furto, bem como para a adoção de medidas preventivas de propagação da pandemia”.