Por José Maria Matias, Aluno do mestrado de Ciência Política e Relações Internacionais na Universidade Nova de Lisboa
O país mudou. Mudou com as leituras políticas feitas das eleições autárquicas que ditaram o chumbo do orçamento de estado e que viriam a precipitar a queda do governo. Teremos eleições legislativas em janeiro e percebe-se que poderemos ter uma nova configuração da Direita que levará à possível afirmação do Chega no parlamento.
Numa Democracia os partidos representam os seus eleitores, valem de acordo com o número de votos que têm. No entanto, de algum o modo, o Chega precisou de estar constantemente a ter de provar o motivo da sua existência. Continuando inclusivamente a defender-se de pedidos de ilegalização, boicotes e ataques de todos os tipos.
Se pouco antes da entrada do Chega na Assembleia da República tínhamos assistido ao desaparecimento do Bloco de Esquerda e à redução significativa do PCP nas eleições para o parlamento regional da Madeira, mais tarde, nas eleições para o parlamento regional dos Açores, o resultado do Chega foi determinante para alcançar o fim de 25 anos de socialismo naquela região autónoma.
Depois, houve eleições presidenciais e, pela primeira vez em muito tempo, os eleitores de direita não estavam reféns do candidato do centro-direita tendo candidato próprio, sendo que, André Ventura, até conseguiu superar o resultado do candidato do PCP e da candidata do Bloco de Esquerda, somados.
Posteriormente, nas eleições autárquicas deste ano, o Chega elegeu perto de 400 autarcas consolidando-se como força política de expressão nacional, capaz de captar diferentes eleitores que viram no partido novas respostas para problemas velhos, ou uma forma de canalizar o protesto. As autárquicas voltaram a dar um resultado desastroso ao BE e confirmaram o caminho de irrelevância progressiva do PCP. Ou seja, a afirmação do Chega surgiu no momento em que a extrema-esquerda perde grande parte da sua influência nacional.
Esta legislatura ficou invariavelmente marcada pela pandemia. Durante este ano e meio, o PSD chegou a recusar-se a fazer a oposição e quis terminar com os debates quinzenais no parlamento, tudo isto talvez num dos momentos mais importantes da Democracia. Foi aí que o Chega esteve muitas vezes como o último reduto entre o Governo do Partido Socialista alicerçado pela extrema-esquerda e os cidadãos.
Ninguém sabe o que poderá acontecer, mas hoje temos um cenário bem identificado. Só o Chega poderá ter a força suficiente para conseguir evitar as pulsões para um bloco central entre PS e PSD, que seria desastroso para todo o país. É impossível ignorar este dado. É por isso que o Congresso do Chega é um momento importante para os desafios que irá trazer o próximo ciclo político.
Num curto espaço de tempo, o Chega terá de passar de movimento de antítese, que congrega o protesto, para um partido capaz e com um projeto, estando na oposição ou no Governo. Não descurando o papel fundamental que o Chega está a desempenhar de rutura na sociedade, sobretudo quando vivemos tempos em que se privilegia diálogos forçados e onde os intervenientes deixaram de perceber qual o papel político a que são chamados pelo povo.
Sinto um certo cansaço dos apelos a consensos artificiais que não passam de mecanismos para perpetuar os mesmos de sempre no poder. É o povo que legitima o poder político e não o contrário. Basta ver como o país político não parou de pensar em como fazer acordos entre si sem antes ouvir o país real. O Chega tem combatido isso. Agora, é preciso o passo seguinte, ser capaz de fazer mais do que isso. É esse o desafio do presente.