Querida avó,
Já viste que falta menos do que um mês para o Natal?No seguimento do que estava a partilhar contigo na carta anterior, gostei imenso de ir à Ilha Terceira.
A Câmara Municipal de Angra do Heroísmo foi fundamental para que a minha viagem fosse uma maravilha. É certo que já me tinhas dado muita informação sobre Angra, onde já foste várias vezes, mas toda a informação disponibilizada pelo município foi imprescindível.
Tal como já me tinha acontecido em São Miguel, na Terceira, mal saímos do centro da cidade passámos a vida a cruzar-nos com vacas. É tão engraçado. Não imaginas a quantidade de vezes que pensei em ti.
Isto dito assim até parece mal! Mas efetivamente, na Terceira, foram várias as vezes que cantei: «Tenho orgulho , orgulho em ser uma vaca», célebre canção da Rua Sésamo que muitos desconhecem ter sido escrita por ti. As pobres vacas ignoravam-me e seguiam a sua vida. Aparentemente felizes com as vistas deslumbrantes do seu dia-a-dia.
Na Terceira, como praticamente em todo o território português, come-se muito bem.
Nem parece ter havido um terramoto, em 1980, que deixou em ruínas praticamente toda a ilha. O centro histórico, como sabes, foi considerado Património da Humanidade pela Unesco em 1983. A Sé Catedral, a Igreja e o Convento de São Francisco, o Colégio dos Jesuítas e o Castelo de São Baptista são alguns dos lugares que visitei.
Já sabia que Angra do Heroísmo tinha sido capital de Portugal. O que não sabia é que Angra do Heroísmo deve o seu nome a D. Maria II, que assim designou a cidade devido ao heroísmo demonstrado pela sua população durante as lutas liberais no princípio do século XIX. Até lá chamava-se apenas Angra. Praia passou a Praia da Vitória, em memória da resistência e vitória dos liberais açorianos sobre os absolutistas.
Tal como disse John Steinbeck: «As pessoas não fazem as viagens, as viagens é que fazem as pessoas». Verdade?!
Bjs
Querido neto,
A propósito da Terceira, estavas tu a falar de vacas (e obrigada pela referência à minha obra prima…) e eu a lembrar-me de cabras. Já te explico.
Em 2005, estava eu em Timor, num dia em que não ia falar aos miúdos das escolas, nem havia nada de especial para fazer, e apeteceu-me sair de Dili. Estava um calor que não se aguentava. Nada melhor – pensei – do que ir à praia dar um mergulho.
Arranjei boleia para Liquiçá, pedindo que me fossem buscar ao fim da manhã. Liquiçá é um paraíso. Sem absolutamente ninguém, sentia-me a única pessoa à face da terra. Lá fui ao banho, a água quase fervia.
E voltei depois à areia. Nem valia a pena limpar-me com a toalha, porque em segundos estava mais que seca. (A propósito, lembro-me do que as pessoas se riram num dia em que choveu e eu vá de abrir o guarda-chuva… Ainda ele mal estava aberto e eu já estava seca…).
Mas estendi a toalha na areia e deitei-me, muito besuntada de óleo, para descansar. Fechei os olhos, era mesmo o paraíso.
E, passados alguns minutos, ainda me comecei a sentir melhor… Uma estranha frescura na minha cara, que eu não sabia donde vinha, mas que me fazia sentir muito bem.
Abro os olhos – e dou com uma data de cabras, todas sentadinhas ao meu lado, muito quietas, a lamberem-me a cara. Era capaz de jurar que sorriam para mim…
E não é que me deixei ficar assim mais um bocado? E elas ao meu lado, a fazerem tudo pelo meu bem-estar. É uma das melhores recordações que tenho de lá.
De resto, Liquiçá é uma praia lindíssima. A beira-mar está cheia de fósseis… Trouxe uma data deles na minha mala (até estou agora a olhar para eles) – e só muito depois de eu ter regressado a Lisboa é que me disseram que era proibido trazer fósseis, e que na fronteira podia ter sido presa… Olha, agora já não posso fazer nada – e acho que os meus fósseis estão de excelente saúde ali na minha mesa…
Não têm é vacas a seu lado. Mas nesta vida não se pode ter tudo.
Bjs