Além de mudanças no comportamento poderem afetar a monitorização da pandemia no período festivo que se avizinha, perante o aumento de casos que se antecipa com a nova variante a deteção e rastreio pode também vir a ultrapassar em breve a capacidade montada no país. Até aqui, vinha a registar-se em Portugal abrandamento no aumento de infeções, mas os primeiros dados desta semana sugerem uma nova aceleração. A análise é feita ao i por Carlos Antunes, investigador da Faculdade de Ciências de Lisboa, que sublinha que o aumento da testagem nas últimas semanas terá contribuído para a desaceleração, que sugeria um pico de casos em breve, mas os 5800 novos casos reportados esta quarta-feira foram já acima do esperado, o que poderá estar ligado ao facto de no último fim de semana haver já indícios de que 9,5% dos novos casos no país serão infeções provocada pela Omicron, mais transmissível.
Sublinhando que é cedo para poder fazer projeções com a metodologia que tem sido usada até aqui e que tem por base o RT – o indicador que calcula quantas pessoas contagia em média cada infetado, o que a nova variante parece aumentar mas estando a disseminar-se não é ainda captado – Carlos Antunes explica que fazendo uma extrapolação a partir da evolução da variante reportada esta semana pelo INSA, entre o Natal e o Fim do Ano poderão ser atingidos 10 a 12 mil novos casos por dia no país – até aqui, o recorde de notificações em 24 horas foi atingido a 28 de janeiro, com mais de 16 mil casos, mas não foram todos diagnosticados no mesmo dia. “De acordo com o relatório do INSA sobre sequenciação genómica das variantes SARS-Cov-2, a variante Omicron estava já com uma percentagem na amostragem de 9,5% à data de dia 12. Pegando na progressão dessa percentagem, à data de ontem (a que se referem os 5800 casos), essa percentagem já será da ordem dos 13%. O que significa que dos 5800 de hoje, 800 serão da Omicron”, explica. “Assumindo uma progressão constante nas próximas duas semanas, a que corresponde a uma duplicação a cada quatro dias, entre o Natal e o final do ano poderão ser atingidos 10 a 12 mil casos por dia”, continua, antecipando que a nova variante representará então 80% dos casos em Portugal.
É para este ritmo “sem precedentes” de disseminação que têm estado a alertar as autoridades no Reino Unido, a OMS e Centro Europeu de Controlo e Prevenção de Doenças, que ontem recomendou aos países medidas fortes para reduzir contactos bem como a expansão da capacidade de testagem e de rastreios e planear resposta nos hospitais – mesmo se a variante for mais benigna, se houver um aumento de infeções há o risco de surgirem também mais casos a precisar de internamento.
No campo da testagem e rastreio há no entanto limites, nota Carlos Antunes, que integra a equipa das linhas vermelhas usadas pela DGS para monitorizar a epidemia. “Para apanharmos 12 mil casos por dia e manter a positividade nos 4%, mantendo uma capacidade de deteção elevada, tínhamos de conseguir fazer 300 mil testes por dia, o que será difícil. Além disso, olhando para as linhas vermelhas, já vemos que a percentagem de contactos rastreados já está abaixo dos 70%, o que é um indicador de que está a haver falta de capacidade”, diz, explicando que para se manter um rastreio universal de contactos seriam precisos mais de 2000 rastreadores quando são 600 e no máximo foram 1400. “O reforço dos rastreadores tem sido feito sempre em atraso, precisávamos de duplicar já a capacidade de rastreio e aumentar a capacidade de testagem aos fins de semana e feriados”, diz. Uma das recomendações deixadas ontem pelo ECDC é que seja feito um maior controlo de casos de Omicron, que podem ser sinalizados através dos resultados de testes PCR (a metodologia usada pelo INSA para estimar que a Omicron representou no domingo 9,5% dos diagnósticos no país). Vigiar e rastrear sobretudo casos sintomáticos é outra proposta que também já tem sido feita pelos peritos.