Covid-19. Especialistas alertam para o risco de esconder sintomas antes do Natal

Especialistas ouvidos pelo i admitem que nas próximas semanas, tal como no Natal passado, pode haver uma perceção menos real sobre a evolução da epidemia no país e alertam para o risco de esconder sintomas.

Quem está a ser diagnosticado com covid-19 esta semana passará o Natal em isolamento, bem como as pessoas com quem teve contacto mais próximo. As regras da Direção Geral da Saúde ditam o isolamento de pelo menos dez dias pelo que perceber por estes dias que há alguém infetado na família, no trabalho, no grupo com que se esteve, na turma dos filhos, acaba por trazer essa carga adicional psicológica para quem tinha outros planos e tem de os mudar e “estragar” os planos de outros. Algo que no Natal passado as equipas de saúde pública perceberam que pesou na forma como algumas pessoas reagiram aos sintomas, adiando mais vezes o seu reporte, e que agora receiam que se possa verificar mais uma vez, contribuindo para um aumento dos contágios e uma menor percepção sobre a evolução da pandemia, cuja monitorização já terá uma dificuldade acrescida: nas próximas duas semanas haverá feriados à sexta-feira, dias com menor atividade de testagem nos laboratórios, a par das enchentes para marcações e stocks de autotestes nos supermercados em baixo. “Houve muita gente no ano passado que, chegando perto do Natal, tinha sintomas e escondeu-se. Ou seja, não telefonou ao SNS24, não fez teste, pode até ter-se resguardado um bocadinho mas não se deu a conhecer ao sistema e só vieram falar com o SNS quando passou a época natalícia”, recorda ao i Gustavo Tato Borges, vice-presidente da Associação Nacional de Médicos de Saúde Pública. “Aí já tinham passado sete, oito dias desde o início de sintomas e a quantidade de pessoas positivas à volta era maior”, sublinha, defendendo a necessidade de perceber que mesmo na situação atual, com cobertura da vacina mas uma nova variante em circulação, o risco mantém-se e desvalorizar ou esconder sintomas pode correr mal. 

“Quem tiver sintomas precisa de ligar ao SNS24, precisa de dar informação sobre os seus contactos para serem rastreados. Quanto mais rastrearmos agora, mais seguro vai ser o Natal. Quanto mais nos escondermos, pior vai ser janeiro e fevereiro. Possivelmente poderemos ter um impacto menor na mortalidade do que no início deste ano por causa da vacinação mas tem um impacto dramático na forma como podemos viver o nosso dia-a-dia e na capacidade de resposta do sistema de saúde”, diz Gustavo Tato Borges, sublinhando que se hoje as pessoas estão mais cientes dos riscos, existe também um maior cansaço com a pandemia. “O que as pessoas têm de perceber é que quem estão a prejudicar são as suas pessoas mais próximas, os familiares. Sabemos que é terrível dizermos a partir de agora que vão ter de ficar em isolamento até dia 26 ou dia 27, mas se não o fizermos, em janeiro isto é uma bola de neve que não pára”.

5 mil contágios por detetar No Natal passado, Manuel Carmo Gomes e Carlos Antunes, dupla que faz a monitorização da pandemia na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, estimaram que ficaram por detetar na semana do Natal cerca de 5 mil contágios face ao que seria expectável, sendo agora a incidência da covid-19 maior do que era calculada na altura. Carmo Gomes admite que se vai entrar agora de novo num período mais “às escuras”, embora Portugal, com recordes de testagem diária aos dias de semana, mantenha até aqui uma positividade baixa (abaixo de 4%), sinal de que tem existido uma malha apertada de diagnóstico.

“No ano passado estou convencido que houve pessoas que até sabiam que estavam positivas, algumas até estariam deslocadas em casa da família, e não fizeram nada, porque sabemos que esta época é especialmente sensível para as pessoas”, diz ao i o epidemiologista, antecipando que perante a maior transmissibilidade da nova variante, rapidamente se perceberá as consequências de maior socialização no período festivo. 

Atualmente há 92 620 pessoas em vigilância por parte das autoridades de saúde por terem tido um contacto de risco com alguém infetado e 67 960 casos considerados ativos. No último Natal, havia 88 978 portugueses em isolamento profilático e 68 690 casos ativos.