“O meu nome é Marisa e tenho um blog chamado ‘Ser mãe não mata, mas mói!’. E como o nome indica e bem, mói e de que maneira!”, começa por explicar Marisa Lemos Samgy, de 34 anos, que conta com mais de 300 mil seguidores na sua página do Facebook.
“Já sabia que, em vez de cinco, nesta passagem de ano seríamos só três… Tenho três filhos, mas dois deles são do primeiro casamento, estão em residência alternada. Logo, este ano, foram passar a data com o pai, e já estava mentalizada que seria uma comemoração sem eles”, diz a mulher residente em Leiria que já havia estado cinco dias sem o filho mais novo, de apenas três anos, pois este teve um contacto com uma pessoa que testou positivo para a covid-19 em casa da avó.
“Para que eu e o pai pudéssemos continuar a trabalhar sem pôr em risco ninguém, decidimos que ficaria em isolamento até o teste vir negativo! E assim foi! Chegou no dia 31 e eu fiquei mesmo contente, pois estava tudo bem”, lembra, constatando que esta foi apenas uma ilusão.
“Nesse mesmo dia, o pai sentiu-se mal e testou positivo, ficou logo em isolamento no quarto e eu e o Tomás do outro lado da porta. Fiz também teste, deu negativo e ligámos para a linha SNS24 para marcar os procedimentos seguintes. Só me apetecia gritar e chorar! Para além de não ter os meus mais velhos, o meu companheiro estava fechado num quarto!”, sublinha, recordando que o marido estava com muitas dores corporais e febre, sendo que pelas 22h o menino já dormia na sala.
“Eu que já tinha trazido jantar feito para a passagem de ano… Bem, com uma neurose, mas cheia de fome, lá fui para a mesa da cozinha, sozinha, ainda com as compras todas nos sacos por arrumar, comi um bife. Assim sem mais nada, num prato de sopa”, afirma, já em tom jocoso, apesar de, à época, não ter achado muita piada ao sucedido.
“Voltei para a sala, adormeci um pouco, o Tomás acordou cinco minutos antes dos foguetes e fomos vê-los à janela juntos. Nem passas, nem um copo de vinho… Nada! Álcool nesta casa só em gel! Pelo WhatsApp, desejámos feliz Ano Novo ao pai. Não foi por videochamada porque ele estava mesmo mal, por isso, enviámos-lhe um áudio. Depois, levámos-lhe comida e medicamentos à porta”, relata uma das portuguesas que, apesar de ter cumprido o isolamento, já o iniciou quando foi anunciado que o período habitual de dez dias seria reduzido para os sete que entrarão em vigor esta semana.
Isto porque, há quatro dias, a Direção-Geral da Saúde reduziu o período de isolamento para quem testa positivo à infeção por SARS-CoV-2, desde que ainda não se exibam sintomas de covid-19. E os contactos de alto risco destes casos positivos também só têm a necessidade de se isolar por uma semana.
“Esta decisão está alinhada com orientações de outros países e resulta de uma reflexão técnica e ponderada, face ao período de incubação da variante agora predominante, a Omicron”, podia ler-se em comunicado. No entanto, a título de exemplo, este período será de apenas cinco dias no arquipélago da Madeira.
“Fomos juntar as camas no quarto dos manos e fomos dormir os dois! Deitei-me e chorei muito. Na mesma casa, no mesmo espaço… Mas tínhamos uma porta a separar-nos e não pude sequer dar um abraço ao meu marido. Foi uma passagem de ano muito mas muito diferente de todas as outras”, conclui.
“As pessoas já não são tão cuidadosas porque as festas acabaram” Ana Catarina Ribeiro, de 27 anos, residente no concelho de Sintra, também não terminou o ano da melhor maneira. “Os sintomas começaram no dia 21: sentia uma impressão na garganta e pensei que era gripe. Estive a fazer voluntariado com os sem-abrigo, através da Comunidade Vida e Paz, e fiz um teste antes. E deu negativo”, avança.
A jovem formada em Publicidade e Marketing deixa um alerta: “A covid-19 consegue mascarar-se e as pessoas não se apercebem e até se desleixam porque acham que não estão infetadas. No dia seguinte, fui ao trabalho e fiz um autoteste. Fiz figas para que estivesse negativo, mas deu positivo”.
E, no dia 22 de dezembro, deu início ao período de isolamento, a apenas 48 horas da véspera de Natal. “Chorei, liguei ao meu chefe a dizer que estava doente – ele tem cancro e tinha medo de o ter infetado –, ele foi fazer um teste e deu negativo. O Natal foi por água abaixo para mim e os meus pais”, porém, por meio das redes sociais – em específico, do Instagram –, a rapariga contactou a tatuadora Mariza Seita, que já havia anunciado que estava infetada.
“Falei com ela e pediu-me para lhe mandar um vídeo de cinco segundos para que as pessoas não se sentissem sozinhas. Não tinha noção de que havia tanta gente doente. Fiquei quase sem voz, mas gravei-o” e, após ter participado nesta corrente de esperança, viveu a Consoada por videochamada. “Foi estranho porque ouvia todos a falar e eu comi sozinha no meu quarto”, confessa, admitindo que, apesar de ter tido alta no dia 31, foi aconselhada a não sair na passagem de ano porque tinha infetado a mãe e o pai padece de diabetes e outros problemas de saúde.
“Ele levou a terceira dose no sábado anterior a eu ter testado positivo e as pessoas têm de se vacinar porque a vacina é uma armadura gigante. Até hoje, ele esteve próximo da minha mãe, sem máscara, e não ficou doente”. Assim, após um Natal incomum, a família Ribeiro decidiu que poderia criar a sua própria logística de modo que ninguém ficasse para trás. Na mesa comprida, Ana Catarina jantou perto do pai e, no extremo oposto, quase sempre de máscara e luvas, encontrava-se a progenitora.
“Foi triste. Começámos o ano em baixo porque sem dúvida os familiares e amigos fazem-nos começar o ano da melhor maneira. É como se 2022 não fosse valer a pena. E o facto de termos descido de 30 mil casos para perto de 12 mil… É assustador. Não significa que haja menos contágios: na verdade, penso é que as pessoas já não são tão cuidadosas porque as festas acabaram”.
“Além de haver quatro testes gratuitos por mês, todos deviam fazer um autoteste por semana. Há uma nova variante e temos de ter consciência daquilo que andamos a fazer. Digo que o Dia de Reis espera por mim e tenho muitos mais anos de Natal e passagem de ano pela frente! Foi o pensamento que mantive em mente para não deprimir”, aponta, indicando que, ao contrário daquilo que tem vindo a ser veiculado nos órgãos de informação, não tem razões de queixa da linha SNS24.
“Fiquei 40 minutos em linha, mas, de resto, correu tudo bem. Não me revejo naquilo que as pessoas têm dito. Foi-me passada a prescrição para fazer o PCR, fiz, nesse mesmo dia enviaram-me o resultado por e-mail e, no dia seguinte, ligou-me uma médica do centro de saúde. E eu pensei ‘Não me vai ligar mais porque tem muitos casos para ver’, mas na segunda-feira ligou-me para saber como estava. E depois ligou-me para me dar alta”.