Por Manuel Boto
1. O Euro fez 20 anos. Orgulhosamente, Portugal substituiu os velhinhos escudos pelos euros, na convicção de que a nova moeda seria irreversível. O tempo só aparentemente tem confirmado esta realidade, porque a Europa vive realmente a duas velocidades e com regras diferentes – entre o Norte mais frugal e o Sul, mais despesista.
Pertencemos aos países com uma dívida pública nacional superior a 100% do PIB, acompanhados da França, Espanha, Itália, Bélgica, Chipre e Grécia. Todos ‘excelentes’ companhias, sobretudo as três primeiras que funcionam como sustentáculo da nossa permanência. Por outras palavras, não fosse a pandemia e se calhar a nossa continuidade na UE já teria sido questionada com redobrada veemência.
Assim, vamos continuando alegremente a gerir a dívida e em exercícios académicos de elaborar rácios em que se demonstre que a mesma vai descendo pelo crescimento anémico do PIB, em vez de nos preocuparmos efetivamente em reduzir a mesma pela via da contenção da despesa pública, com todos os riscos de, a prazo, isto correr mesmo mal porque, a nível internacional, ‘não se engana toda a gente todo o tempo’.
A inflação a subir irá fazer disparar os juros, sendo apenas questão de tempo. Os sinais já aí estão, como sucedeu com a bem-sucedida emissão de Eur 3 MM a 20 anos com a taxa em 1,2%, significativamente superior a emissões recentes. A prazo, até acredito que esta emissão vai sair barata, quanto mais nem imagino. Mas tanto mais quanto continuar o atual desvario, bem refletido na campanha eleitoral em que se nota que os partidos da esquerda, prováveis sustentáculos do futuro Governo de acordo com as sondagens, continuam a defender que «há vida para além do défice».
A queda (na realidade) receio bem que poderá ser dolorosa, não por pessimismo, apenas porque do passado devemos sempre retirar ilações para evitar cometer erros iguais e, se forem eleitos como perspetivam as sondagens, estes futuros governantes de uma qualquer ‘geringonça’ reciclada revelam que nada aprenderam. Criar despesa e taxar tudo o que puderem para financiar o seu crescimento, sem objetivamente se fomentar o incrementar da economia com políticas amigas do investimento, sobretudo estrangeiro porque em Portugal não há capital, inexoravelmente nos irá conduzir a ‘um beco sem saída’. Se tal suceder, certamente virá uma nova troika ou nem a permanência no Euro estará segura.
2. A qualidade e interesse da generalidade dos curtos debates de 25’ entre os líderes políticos melhorou imenso com a experiência e com o feedback obtido. Mais serenos em geral, conseguiram-se ouvir ideias que podem ter sido úteis para os eleitores irem formando opinião sobre em quem votar ou mesmo para alguns se questionarem e engrossarem no imediato o rol de indecisos.
Posteriormente a cada debate, temos assistido a análises exaustivas sobre os mesmos (algumas delas a demorar o dobro do tempo!) pelo que me irei debruçar sob outra perspetiva: a da ‘fulanização’ dos partidos. Por outras palavras, retive a claríssima alteração de estratégia que muitos dos líderes adotaram, privilegiando a sua própria promoção com o intuito de tentar levar os eleitores a votar neles, mais que nos partidos.
Costa é dos que levou isto aos extremos nesta campanha, tentando quase um plebiscito à sua governação. Rio tenta igualmente passar a imagem de ser a única alternativa como primeiro-ministro. Outro exemplo é o Livre, pelo discurso esclarecido (esquerdista) de Rui Tavares, sobretudo pela necessidade de se afastar da anterior candidata Joacine Katar Moreira. Ventura continua a estratégia de personificar o Chega que pode colher votos decorrente da agressividade do seu discurso, mas em que sobra a convicção que inexiste como partido com quadros.
Para a generalidade da população, Cotrim é a Iniciativa Liberal, raros conhecendo Carlos Guimarães Pinto e a sua acutilante inteligência. Francisco Rodrigues dos Santos tenta fazer sobreviver o CDS num esforço insano, mas não capitaliza rostos conhecidos (como Ribeiro e Castro). Catarina personifica a radicalização do Bloco, sobrando o PCP, fiel aos seus princípios de ser um partido a disputar eleições (até ‘ajudado’ pela doença de Jerónimo – a quem aqui desejo rápido restabelecimento).
O curioso nisto tudo é que se Rio apagou inquestionavelmente Rangel, Costa não apagou Pedro Nuno Santos (PNS) cuja imagem surge permanentemente nos comentários a seguir a vários debates (sem esquecer Catarina que, ao afirmar não se intrometer na vida interna do PS, explicitamente demonstra ansiar pela queda de Costa para emergir PNS com quem quer ‘casar’).
Ou seja, estas eleições, ou de facto possibilitam uma maioria absoluta ou uma qualquer forma de Bloco Central ou guinamos à ‘nova’ esquerda, liderada pela dupla PNS/Catarina, secundados pelo PCP e com um afã de nacionalizar as grandes empresas nacionais (EDP, REN, Galp, etc.), à semelhança da TAP. Um regresso a 1975 e depois quero ver como se fará um novo 25 de novembro!
P.S. – um debate inesperadamente interessante entre Costa e Rio em que concordaram em discordar em quase tudo. Rio foi surpreendente em diversos momentos em que afirmou ideias e se superou face a um Costa algo nervoso e tenso, sobretudo na parte final em que teve a consciência do equilíbrio global do debate. Se irá ter influência na votação será a incógnita dos próximos dias, mas uma coisa é certa: Costa e Rio irão repisar os vários temas, tecendo loas às ideias próprias e criando fantasmas sobre as alheias.