1. O tema é ‘velho e relho’ como diz o povo, mas a verdade é que sobre a existência ou, melhor, a perceção da existência de corrupção em Portugal, estamos conversados. Todos os anos é publicado o Índice de Perceção da Corrupção e temos o desgosto de constatar que parece que nada sucede em Portugal para se corrigir este flagelo, dado que, objetivamente, não passamos da ‘cepa torta’ – 12.º lugar na Europa, 32.º lugar a nível mundial, resultante dos 62 pontos (61 pontos em 2020).
Os otimistas dirão: ‘vá lá, não piorámos’, apesar de tanta capa de jornal a relembrar escândalos de toda a ordem nesta matéria tão sensível. Os pessimistas dirão: ‘com esta Estratégia Nacional Anticorrupção que não passa do papel em que praticamente ninguém vai preso, sobretudo os poderosos, nunca mais moralizamos as práticas públicas’. Algures, pelo meio, estará a virtude.
O tema tem demasiado a ver com a morosidade da justiça, sobretudo com os seus atrasos, por vezes inexplicáveis, nos julgamentos importantes (mediáticos, ou não) quantas vezes resultantes dos famosos megaprocessos que, com os seus milhares de páginas, só desmoralizam quem quiser pegar neles. Também resulta da escassez de meios (peritos qualificados) para a investigação dos crimes de ‘colarinho branco’, conforme já referido por demasiadas vezes por responsáveis da área da justiça, sem quaisquer efeitos práticos. Infelizmente, esta campanha eleitoral pouco tem referido sobre o assunto, quiçá embaraçoso para a classe política pela ineficácia demonstrada ao longo de décadas.
O combate à corrupção ficaria muito mais facilitado se existisse uma cultura nacional de que a sua existência envergonha o país e tem consequências desastrosas para a Economia, sobretudo porque afasta investidores internacionais, essenciais para o desenvolvimento económico português. Mas infelizmente, vamos todos, enquanto coletivo, encolhendo os ombros e aceitando certas práticas de maior ou menor dimensão que vamos ouvindo no nosso dia-a-dia com uma indiferença chocante, como se fosse uma inevitabilidade.
Para se resolver e, consequentemente, minorar esta perceção, o combate à corrupção tem de se tornar uma prioridade nacional de todos os políticos portugueses, da esquerda à direita, tão importante como a Saúde ou Educação. Tem se de se passar do papel à prática, dotando as investigações e a justiça de meios que possibilitem a celeridade indispensável para a punição inapelável e tempestiva dos prevaricadores, sejam eles ‘raia miúda’ ou ‘peixe graúdo’. De outra forma, carpiremos eternamente a mágoa para gáudio e benefício dos corruptores e corruptos!
2. As eleições estão finalmente à porta. Um período eleitoral demasiado longo desde que o PS viu chumbado no Parlamento o OE 2022, com uma pandemia pelo meio a baralhar as contas dos políticos, amplamente receosos das suas consequências nos resultados eleitorais. Houve debates de ideias, umas válidas outras muito infelizes, os políticos tudo prometeram e o seu contrário, consoante a eficácia das mensagens transmitidas nas sondagens publicadas.
Desta campanha sai uma clivagem potencialmente perigosa na sociedade portuguesa, uma divisão acentuada entre esquerda e direita que irá dificultar tremendamente a resolução objetiva dos problemas nacionais, dado que parece impossível existir uma maioria absoluta que permita um Governo tranquilo numa legislatura de 4 anos.
Extremaram-se posições e isso nunca foi construtivo para solver disputas, seja em conflitos pessoais, empresariais ou políticos, como é o caso presente. O PS que há escassos dias pedia a maioria absoluta já se volta para a esquerda que o abandonou friamente e provocou eleições. O PSD sente a impossibilidade de construção de um bloco central que possibilite reformas estruturais absolutamente urgentes para o país e admite formar Governo minoritário com IL e CDS, com o beneplácito misericordioso do Chega.
Marcelo estará preocupado certamente e tem bastas razões para isso. A economia continua a perder competitividade face a diversos países do bloco de leste que atraem investimento estrangeiro com políticas fiscais e laborais previsíveis que são garante de estabilidade. A dívida pública nacional só diminui no rácio face ao PIB porque nos seus valores nominais sofre uma pressão desmesurada da despesa estrutural. As taxas de juro ameaçam subir, pressionadas por uma inflação permanente.
Em suma, veremos o que o resultado destas eleições nos reserva. Se soluções para os nossos problemas estruturais e isso teria de passar por um entendimento dos partidos democráticos com pensamentos e medidas a longo prazo, ou um extremar de posições por radicalismos ideológicos que nada resolvem e inibem o crescimento sustentado da economia.
Neste caso, continuaremos num país adiado a assistir às ultrapassagens pelos países de leste e a legar aos nossos filhos e netos um futuro aperreado por impostos asfixiantes e que fomentam a emigração dos talentos e por uma dívida pública que herdam de políticas irresponsáveis.