O Presidente francês, Emmanuel Macron, que terá de lutar pela sua reeleição em abril, saiu de uma reunião com o seu homólogo russo, em Moscovo, esta segunda-feira, gabando-se de ter conseguido de Vladimir Putin “garantias concretas de segurança”, bem como do seu “desejo de manter a estabilidade e integridade territorial da Ucrânia”. No dia seguinte, enquanto Macron continuava o seu périplo, seguindo rumo a Kiev, o Kremlin veio a público desmenti-lo, deixando as negociações na mesma. E fragilizando as tentativas do Presidente francês se afirmar como rosto da Europa, após a saída de cena de Angela Merkel.
“Isto é errado na sua essência. Moscovo e Paris não podem fazer nenhuns acordos. É simplesmente impossível”, salientou o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, citado pelo Guardian. “França é um país importante na UE, França é membro da NATO, mas não é o líder ali”, explicou. “Portanto, de que acordos é que podemos falar?”.
Ainda assim, as declarações de Macron não deixaram de criar especulação, tendo o Presidente francês dado a entender ter um posicionamento diferente do que tem sido a posição intransigente da NATO e de Washington. Se estes asseguram que a principal exigência de Putin – que a NATO dê garantias de que nunca aceitará a Ucrânia como Estado membro – é inegociável, Macron terá sugerido como solução a “finlandização” da Ucrânia, à conversa com jornalistas franceses durante o seu voo.
Na prática, a Finlândia declarou-se como um país neutral, apaziguando os seus vizinhos russos, escolhendo não fazer parte da NATO num referendo em 1947, aceitando ter limites no tamanho e capacidade das suas forças armadas. Dado a escalada do sentimento anti-russo na Ucrânia desde a anexação da Crimeia, em 2014, e estando o país em estado de guerra civil com os separatistas russos no leste, parece uma proposta difícil de concretizar sem resolver esse conflito primeiro.
Ainda assim, as propostas que Macron apresentou à porta fechada foram descritas como “realistas” pelo próprio Putin. Lembrando que, caso a Ucrânia se juntasse à NATO e tentasse retomar a Crimeia, a aliança seria arrastada para um conflito europeu de proporções inauditas desde a Segunda Guerra Mundial.
Já o chanceler alemão, Olaf Scholz, que tem viagem marcada para Kiev a 14 de fevereiro, e para Moscovo no dia seguinte, fez questão de passar primeiro pela Casa Branca.
Enquanto Macron, convicto defensor de que a Europa deve ter a sua própria abordagem às tensões na Ucrânia, à margem das negociações entre Moscovo e Washington, Scholz, ao lado de Joe Biden, fez questão de frisar a importância da NATO ser uma frente “absolutamente unida”, esta terça-feira.
O chanceler garantiu que não “dará passos diferentes” dos EUA, apesar das críticas de que o seu Executivo tem sido alvo, pela recusar de enviar armamento para a Ucrânia. Na Alemanha, até já se popularizou o hastag #WoIstScholz (”onde está Scholz”), lê-se na DW, referência ao papel pouco ativo assumido por Scholz perante esta crise.
De certa forma, o chanceler mostra-se o oposto do Presidente francês ou do primeiro-ministro Boris Johnson – que, à semelhança de Macron, vê o seu cargo em risco, não devido a eleições mas devido a sucessivos escândalos, tendo-se tentado afirmar como protagonista na crise ucraniana, só que através uma posição mais dura face à Rússia.
“É muito tentador para cada líder ocidental dizer: ‘Encontrei a solução! Sou o salvador da Europa!’”, notou Orysia Lutsevych, analista da Chatham House, ao Guardian. “Isto é particularmente verdade com Macron”.