E stou a pensar se paro agora ou se embarco num ano completo aborrecido». Foi desta forma que Kelly Slater reagiu depois de ter vencido no passado dia 5 uma etapa do circuito de surf, a poucos dias de completar 50 anos, superando o seu rival 25 anos mais novo. Onze vezes campeão mundial, o veterano surpreendeu tudo e todos com esta nova vitória. Não só pela idade, mas por nos últimos anos se ter dedicado a investir num sistema de ondas artificiais em Lemoore, no meio do deserto da Califórnia. O objetivo: criar a onda perfeita e o surfista não quis deixar este crédito para mãos alheias. Em termos de recordes, Slater não deixa dúvidas: é detentor do recorde do mais jovem campeão do mundo, aos 20 em 1992, e do mais velho, com 39 em 2011, voltando novamente aos triunfos, seis anos depois. Slater disse um dia que o surf era como «a máfia». «Quando entras, já não sais».
As dúvidas em relação ao seu futuro são muitas. O ministro da Saúde australiano, Greg Hunt, já avisou que o campeão mundial não será autorizado a entrar no país e competir nas provas da Liga Mundial de Surf marcadas para março e abril se não estiver vacinado, segundo o The Guardian. E apesar de não ter revelado se tomou ou não vacina, defendeu publicamente a posição antivacinas de Novak Djokovic, argumentando que tinha cinco amigos que morreram depois de se vacinar contra a covid-19. Argumentos que não convencem os governantes australianos. «Não importa se és surfista, tenista, turista ou qualquer outra pessoa, as regras aplicam-se a toda a gente», afirmou o ministro dos desportos, Richard Colbeck.
Slater nasceu a 11 de fevereiro de 1972, na Praia de Cocoa, na Flórida e as suas atenções rapidamente estiveram rapidamente viradas para este desporto. Começou a competir em 1978, com apenas seis anos, no Salick Brothers Surf Contest. O surfista nunca conheceu os pais e também por isso teve muitas dificuldades para se sustentar a si e ao irmão. Quando se tornou profissional, em 1990, uma das primeiras coisas que fez foi pagar o empréstimo da casa de família.
Em 1991 chegou a ser considerado pela revista norte-americana People como uma das 50 pessoas mais belas do mundo e foi a partir dessa altura que começou a ser conhecido, aparecendo em vários anúncios de publicidade.
No ano seguinte, com vinte anos, venceu o Campeonato do Mundo de Surf profissional, logo no ano em que pela primeira vez fez o circuito mundial completo. Foi o mais jovem atleta de sempre a conseguir alcançar esse triunfo, voltando a repeti-lo em 1994, 1995, 1996, 1997 e 1998, o que fez dele o primeiro surfista a ganhar este título por cinco vezes consecutivas. E é também por isso que é considerado o melhor de todos os tempos. Em paralelo, foi quem mais prémios monetários somou em toda a história da modalidade.
É nessa altura que se estreia na televisão na famosa série Marés Vivas, onde durante um ano desempenhou o papel do também surfista Jimmy Slade. Uma faceta de que não gosta de falar, por considerar que não foi a melhor decisão da sua carreira. Essa altura ficou também marcada por namoros com famosas –como foi o caso de Pamela Anderson, com quem contracenou.
Apaixonado por música, em que a guitarra assume um lugar de destaque, já atuou com Ben Harper e Pearl Jam. Também gravou um disco como elemento da banda The Surfers, chegando a fazer uma digressão pelos Estados Unidos da América.
Slater é uma verdadeira rock star do surf e já marcou presença várias vezes em Portugal. Em 2014 recebeu a chave de ouro da cidade de Peniche, entregue pelo município. Na altura, confessou: «Já tenho algumas chaves da minha cidade, mas nunca nenhuma foi realmente uma chave. Por isso, esta é simbólica», afirmou Slater, que venceu a etapa de Peniche do circuito em 2010.
Em entrevista ao jornal i, desvendou a sua motivação ao fim de tantos anos: «Quando apareces na praia e tens um heat, queres vencer o outro gajo. Mas tem de ser algo mais que isso. Tens de ter uma motivação diferente de tentar vencer outro surfista. Precisas de ter uma perspetiva mais vasta na tua vida…». Nessa altura, confessou a sua paixão pela música, admitindo que tocava quase todos os dias. «Não trouxe nenhum instrumento comigo para a Europa, devia ter trazido o meu ukelele. Mas toco com frequência, quando não consigo limito-me a ouvir música ou a cantar. Adoro música».
E foi mais longe: «Tocar com o Ben [Harper] ou os Pearl Jam… acabei de tocar com o Jack Johnson há umas semanas. É divertido para mim. Tocar é uma grande parte da minha vida. Obviamente que essas situações acontecem com eles porque são meus amigos, não porque seja o melhor músico do mundo. Conheço as canções deles, tocamos juntos às vezes e de vez em quando felizmente convidam-me para tocar ao vivo».