As forças de Vladimir Putin avançam a Ucrânia, invadindo-a em quatro frentes, a coberto de uma barragem avassaladora de bombardeamentos aéreos, artilharia de longa distância e mísseis, que destruiu por completo as defesas antiaéreas ucranianas, vangloriou-se o Kremlin. Ainda que a Casa Branca assegure que não colocará as suas tropas no terreno, optando apenas por sanções para evitar um confronto entre potências, o receio que o conflito ganhe proporções ainda maiores mantém-se. Enquanto a NATO reforça o seu flanco leste, Chernobyl foi tomada pelos russos após um feroz combate, anunciaram as autoridades ucranianas, com risco de libertação de material nuclear nos confrontos.
“Os nossos defensores estão a dar as suas vidas para que a tragédia de 1986 não seja repetida”, escreveu no Twitter o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, enquanto os combates decorriam, referindo-se ao acidente nuclear de Chernobyl, que criou uma nuvem de radiação que se alastrou por boa parte do continente, cujas consequências para a saúde dos europeus ainda estão por escrutinar. “Isto é uma declaração de guerra contra a Europa inteira”, considerou Zelensky.
O pior é que não faltam reatores nucleares em risco no resto da Ucrânia, que produzem mais de metade da energia consumida pelos ucranianos. A central nuclear de Zaporizhzhia (ver infografia), que fica a meio caminho entre a Crimeia e Donbass, dois dos principais pontos de onde partiu a invasão, é considerada particularmente vulnerável. Se as forças russas têm recorrido sobretudo a bombardeamentos de precisão, a artilharia dos separatistas é muito mais rudimentar, podendo atingir inadvertidamente centrais.
“As nossas centrais elétricas nucleares não foram desenhadas com proteção militar. Claro que não foram desenhadas para resistir a tanques, bombas, mísseis”, alertou Dmytro Gumenyuk, diretor da agência responsável pela segurança nuclear da Ucrânia (SSTC NRS), ao jornal britânico i. Caso a central Zaporizhzhia seja atingida, “as consequências poderiam ser muito piores do que Fukushima e Chernobyl juntos”, considerou. “A Europa seria totalmente contaminada”.
Quatro frentes Mesmo que esse cenário mais aterrorizador não se concretize, já se vive um pesadelo na Ucrânia. Com centenas de alvos atingidos em menos de 24h, uma extensa coluna de veículos blindados, lança-mísseis e tanques russos avança numa rota direta para Kiev, através de Chernihiv. Parecem prestes a conseguir reforçar os comandos que tomaram a base aérea de Antonov, em Gostomel, nos subúrbios da capital.
Estes chegaram de helicóptero, disparando metralhadoras do ar com as portas abertas, antes de descerem em rapel, a coberto do fogo de dois caças contra unidades terrestres ucranianas, avançou a France Press. Zelensky prometeu cercar e destruir os comandos russos que esperam apoio, se o conseguirá fazer a tempo é outra questão.
Entretanto, em Kharkiv, a segunda cidade ucraniana, muito próxima da fronteira, historicamente considerada pró-Rússia, é visto como um dos prémios mais desejados pelo Kremlin. Foi alvo de pesados bombardeamentos, levando civis a abrigarem-se nos túneis do metro, enquanto outros faziam filas enormes para doar sangue, com tanques russos a combater a poucos quilómetros desta cidade com mais de um milhão de habitantes, que tentam cercar. “Parece que Kharkiv de momento Kharkiv é o alvo principal”, considerou Andriy Zagorodnyuk, um antigo ministro da Defesa ucraniano, citado pelo Guardian.
Já a sul, em Mariupol e Odessa, duas cidades costeiras que há muito eram apontadas como alvos vulneráveis no caso de uma invasão pela Rússia, que aproveitou o seu domínio do mar de Azov e do Mar Negro para desembarque as suas tropas, com apoio naval e aéreo. Aqui, o risco do conflito se alastrar ainda mais parece particularmente elevado. Não só é uma via crucial para a exportação de cereais russos, ucranianos, romenos e cazaques, quatro dos maiores exportadores do mundo, como um navio turco foi atingido por acidente por uma bomba, ao largo de Odessa.