Parece algo demasiado insólito para ter acontecido em pleno cenário de guerra. Há exatamente uma semana, o britânico The Sun noticiou que as mulheres ucranianas, residentes em Kharkiv, a segunda cidade mais importante da Ucrânia, “ficaram chocadas” com o aparecimento de “um conjunto de admiradores de uniforme”.
“Soldados russos bonitinhos cujos nomes são Andrei, Alexander, Gregory, Michail e um lutador checheno barbudo apelidado de ‘Black’ estavam entre as dezenas de perfis que apareceram” no Tinder, informava aquele jornal. De seguida, foi indicado que haviam surgido na aplicação de encontros, a aproximadamente 32 quilómetros de Kharkiv, vários militares.
Quem fez a denúncia foi Dasha Sinelnikova, produtora de vídeo de 33 anos. “O telemóvel de Dasha iluminou-se com fotos de dezenas de russos excitados quando ela definiu a sua localização para Kharkiv, no Tinder, ontem”, avançou o tablóide. “Acredita-se que os soldados entraram no alcance” da jovem “depois de os comandantes do Presidente russo terem ordenado um enorme influxo de tanques e tropas a uma curta distância da cidade”.
Em declarações ao i, Dasha começa por referir que vive em Kiev, porém mudou a localização após ter sido alertada, por uma amiga, para aquilo que se estava a verificar. Isto é, a presença “da tropa russa em todo o Tinder”.
“Honestamente, não consegui acreditar naquilo que os meus olhos viam quando vi dezenas de militares a tentarem parecer durões e simpáticos ao mesmo tempo. Por exemplo, um rapaz musculado estava a posar numa cama com a pistola. Achava que estava sensual!”, observa a ucraniana, mencionando que “outro estava com equipamento de combate russo completo e outros apenas exibiam em coletes apertados”.
“Estes rapazes são iguais a qualquer outra pessoa no Tinder” “Como disse ao The Sun, não achei nenhum deles atraente e nunca consideraria dormir com o inimigo. Automaticamente deslizei para a esquerda para rejeitá-los, mas havia tantos que fiquei curiosa e entrei numa troca de mensagens”, confessa Dasha, que fez ‘swipe left’ até se deixar levar pelo ‘swipe right’. “Foi engraçado, mas assustador ao mesmo tempo, pois sabia que eles estavam muito perto”.
Exemplificando, naquilo que diz respeito a Andrei, de 31 anos, o mesmo podia ser visto a posar com a Kalashnikov em riste, o equipamento de combate completo e um capacete. “Onde é que estás? Estás em Kharkiv?”, perguntou, recebendo como resposta: “Claro que não estou em Kharkiv, mas estou perto – 80 km”. “Planeias vir visitar-nos?”, questionou alegadamente com inocência, tendo o seu interlocutor respondendo: “Iria com prazer, mas os russos não são bem-vindos na Ucrânia desde 2014 [quando as forças pró-russas tomaram Donbass e anexaram a Crimeia]”.
“O que é que fazes?”, questionou a ucraniana. “Nasci em Belgorod e fui engenheiro antes de 2014. Visitei bastante Kharkiv e adorei tanto que queria comprar um apartamento. Adoro viajar até à Ásia, principalmente para a Tailândia. Mas agora é um momento difícil. Eu queria viajar para a Europa, mas conseguir um visto é difícil porque ninguém gosta da Rússia agora”, declarou o militar.
Enquanto ‘Black’ partilhou a fotografia em que era visto a segurar a pistola e outra com um gatinho ao colo, Alexander, de 29 anos, posou de boina com os seus óculos escuros enfiados no colete azul e branco. Já Gregory, de 25, parecia ansioso para mostrar o seu relógio militar, tal como Dasha reforçou antes de falar de Alexander, de 31 anos.
Na ótica da produtora, era um possível espião russo, tendo revelado que estava a exercer funções no “Ministério de Assuntos Internos da Federação Russa”. “Estes rapazes são iguais a qualquer outra pessoa no Tinder – querem amor ou companheirismo”, afirma, a partir de um corredor do apartamento onde se abriga com a gatinha Houston, que padece de problemas cardíacos e não pode ir para um bunker.
“É por sermos todos tão parecidos que é difícil imaginar que eles virão atacar-nos. Espero que isso não aconteça”, esclareceu ao jornal inglês há uma semana, na véspera de o Presidente russo, Vladimir Putin, ter anunciado o início de uma operação militar. No arranque da quinta-feira passada, pouco se sabia acerca daquilo que se viveria nos dias seguintes, mas surgiam os primeiros relatos de explosões registadas em várias zonas do país e que se haviam intensificado ao longo da manhã.
Perto das 9h em Portugal, os órgãos de informação portugueses noticiavam que o ministro da Saúde ucraniano, Oleh Lyashko, havia feito um balanço das vítimas desde que começara a invasão russa: 57 mortes e 169 feridos. Por outro lado, a agência dos refugiados das Nações Unidas concluíra que cerca de 100 mil pessoas estavam a sair ou a tentar sair da Ucrânia.
Atualmente, torna-se cada vez mais complexo calcular um valor concreto, na medida em que o cessar-fogo tarda em chegar e as vítimas multiplicam-se. Na segunda-feira, a Alta Comissária das Nações Unidas Michelle Bachelet revelou números oficiais, mas alertou para o facto de o panorama ser certamente mais grave no terreno. “O ataque militar contra a Ucrânia põe em risco inúmeras vidas. Entre a manhã de quinta-feira e a última noite, registámos 406 vítimas civis, incluindo 102 mortos, entre os quais 7 crianças, e 304 feridos. A maioria dos civis foram mortos por armas explosivas com uma grande área de impacto, incluindo artilharia pesada, sistemas de lançamento de rockets e bombardeamentos. E temo que os números reais sejam consideravelmente superiores”, notou.
Entretanto, pelo menos cinco pessoas morreram e outras cinco ficaram feridas na sequência de um ataque à torre de televisão de Kiev, na tarde desta terça-feira, veicularam os serviços de emergência ucranianos. O ataque foi confirmado pelo assessor do Ministério do Interior ucraniano, que informou que alguns canais ficariam sem funcionar durante algum tempo. Por viver a menos de 2 quilómetros do local, Dasha sentiu-se aterrorizada. “O Tinder não é assim tão importante no contexto que vivemos. Só posso acrescentar que, neste momento, colocando a razão de lado, odiamos os russos”.
A Organização das Nações Unidas (ONU) estima que sejam cerca de 12 milhões as pessoas que precisarão de ajuda na Ucrânia. Em comunicado citado pela agência France-Presse, a ONU deixou claro que mais de quatro milhões de refugiados em fuga dos combates necessitarão igualmente de apoio.
Desde o primeiro dia da invasão, mais de 660 mil pessoas fugiram da Ucrânia e refugiaram-se em países vizinhos, segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR). De acordo com a ONU, 520 mil pessoas já saíram da Ucrânia e este número cresce “exponencialmente de hora a hora”.
Deste total, 280 mil (cerca de 53%) fugiram para a Polónia, 94 mil para a Hungria, 40 mil para a Moldávia, 34 mil para a Roménia, 30 mil para a Eslováquia e 10 mil para outros países europeus.