Já passou o tempo

E quando as notícias começaram a divulgar a possível integração na Nato da Suécia e da Finlândia, a reação foi uma ameaça a dois tempos.

Se alguma dúvida existisse, o discurso de Putin foi de uma clareza cristalina.

Ele quer recuperar a grande Rússia, quer corrigir o que considera serem erros da história, quer recuperar território, destruir países, fazer a guerra.

Juntando todas as peças, compreende-se melhor.

Incomoda a Geórgia? Domina -se.

Incomoda a Bielorrússia? Impõe-se Lukachenko.

Com a Ucrânia a coisa não correu tão bem. 

Logo, o plano teria de ser desenhado de forma diferente e com um desenvolvimento temporal mais largo.

O teste do algodão foi a Crimeia.

A comunidade internacional ficou paralisada. Calou-se, aceitou o fait accompli.

Era preciso mais. Lugansk e Donetsk foram as novas aventuras. Foi a primeira guerra limitada.

Terminou com um acordo periclitante porque todos repousaram na boa consciência.

Mais uma vez os países livres se acomodaram.

O grande cometimento viria a seguir.

A Bielorrússia era chave.

A Rússia mostrou-se amiga para a velhice e domesticou um eternamente grato Lukaschenko.

Porquê?

Sabe-se agora.

A invasão da Ucrânia não seria completa sem atingir mais facilmente Kiev.

Era o caminho.

As conversas sobre as manobras militares conjuntas foram uma cortina de fumo.

E, principalmente, porque as pessoas se recusavam a acreditar num ato de loucura desta dimensão.

O passo seguinte foi a pretensa justificação histórica da legitimidade do regresso à casa mãe da Ucrânia, mas também dos países bálticos e da Polónia.

Russos seriam, russos serão.

E quando as notícias começaram a divulgar a possível integração na Nato da Suécia e da Finlândia, a reação foi uma ameaça a dois tempos. Primeiro a alusão às consequências terríveis, depois a prontidão dos sistemas de dissuasão nuclear e os testes de lançamento de mísseis.

A grande questão é saber como o Ocidente pode parar um homem como Putin e o expansionismo russo.
As meias tintas não resolvem. Ofensivas como estas só se podem parar com a consideração do receio de um poder maior e com capacidade interventiva.

Sim, dir-se-á, mas a intervenção da Nato, por exemplo, seria o início de uma guerra mundial.

Resta a guerra económica, as sanções, o fornecimento de material militar, o apoio solidário ao país invadido e aos refugiados que dele fogem.

Mas, entretanto, no plano concreto, a ofensiva russa ganha contornos de total violência e o país invadido está sozinho com a força da sua fraqueza.

E, embora os noticiários se ocupem da divulgação das conversações entre os beligerantes, todos percebemos como a única intenção da Rússia é a destruição da Ucrânia, a sua redução a cinzas, a aniquilação da liberdade.

Infelizmente para todos nós, houve uma Rússia URSS e há uma Rússia putiniana com os mesmos tiques imperialistas.
Já passou o tempo da condescendência.

Um vídeo posto a circular recentemente recordou a figura de Jan Pallack e o seu sacrifício durante a invasão dos tanques soviéticos que acabaram com a Primavera de Praga.

Hoje, perante os nossos olhos, é um povo inteiro que resiste e é imolado.

E que, repetidamente, diz querer ser Europa e viver a democracia e decidir o seu destino.

E que, para nossa vergonha, é capaz de morrer lutando.