Exilado nos Emirados Árabes Unidos desde agosto de 2020, o rei emérito de Espanha, Juan Carlos, poderá regressar ao seu país brevemente, depois da Justiça espanhola ter anunciado, nesta quarta-feira, que vai arquivar as três investigações ainda em curso contra o antigo monarca.
A decisão de desistir do processo, avançada pelo El Mundo, surge após uma decisão semelhante tomada em dezembro passado pela Justiça suíça.
Segundo o Ministério Público espanhol, as investigações «não permitem que seja instaurado um processo penal contra Sua Majestade Juan Carlos de Bourbon […] em particular devido à falta de provas incriminatórias, ao estatuto de limitação dos delitos e à inviolabilidade» de que gozou como chefe de Estado até 2014, data da sua abdicação, indicam numa declaração.
O advogado do rei emérito, Javier Sánchez-Junco, afirmou, esta quarta-feira, que «na próxima semana» irá avaliar a decisão da Procuradoria do Supremo Tribunal, ao mesmo tempo que «fará eco das decisões que Juan Carlos I possa tomar».
Recorde-se que o rei emérito já manifestou em várias ocasiões o seu desejo de voltar a Espanha, pelo que esse regresso poderá estar para breve.
Os escândalos do Rei
Apesar de Juan Carlos I ser uma das principais figuras na transição democrática espanhola depois da morte do ditador Francisco Franco, em 1975, foi obrigado a abdicar do seu estatuto, em 2014, devido a uma série de escândalos.
A investigação mais importante, desde 2018, tentou encontrar provas para confirmar se o antigo soberano, de 84 anos, recebeu uma comissão pela adjudicação, em 2011, a um consórcio espanhol, da construção do AVE do Deserto, um comboio de alta velocidade entre Meca e Medina, que custo cerca de sete biliões de euros.
A Justiça espanhola e a suíça suspeitavam que as negociações tivessem sido pagas através de comissões ilegais e o jornal suíço Tribune de Genève, revelou que o antigo Rei terá recebido 100 milhões de dólares do Governo saudita neste negócio. Este movimento bancário esteve no centro deste primeiro caso.
O Ministério Público explicou na sua declaração que esta soma terá sido um «presente» recebido pelo soberano enquanto chefe de Estado, que poderia, no entanto, ter representado um delito de «corrupção» agora prescrito.
De notar que a maior parte deste dinheiro acabou por ser entregue em 2012 por Juan Carlos à sua ex-amante Corinna Larsen. Quando Larsen foi questionada na Suíça sobre a origem do dinheiro esta justificou tratar-se de um presente de «gratidão e amor».
Já num segundo caso, o Ministério Público espanhol estava a investigar a alegada utilização por Juan Carlos de cartões de crédito ligados a contas bancárias em nome de um empresário mexicano e de um oficial da força aérea espanhola.
Por último, a terceira investigação tinha sido aberta há um ano, após um relatório do «serviço de prevenção do branqueamento de capitais» sobre uma empresa ligada ao antigo monarca na ilha de Jersey, considerada um paraíso fiscal.
O Ministério Público sublinhou as «irregularidades fiscais» de que o rei emérito terá incorrido entre 2008 e 2012, mas recordou que não podia ser processado por isso devido ao estatuto de limitações à infração ou à sua imunidade como chefe de Estado.
Ainda assim, a instituição espanhola está satisfeita, uma vez que as investigações permitiram às autoridades fiscais recuperar mais de cinco milhões de euros, fruto de duas regularizações fiscais levadas a cabo por Juan Carlos numa tentativa de evitar uma ação penal.
Estes casos levaram o atual Rei de Espanha e filho de Juan Carlos, Felipe VI – que, quando assumiu o poder, vincou a sua posição na luta contra a corrupção –, a anunciar em março de 2020 a renúncia a qualquer tipo de herança do seu pai e retirou-lhe a verba anual de 194 mil euros prevista no orçamento da Casa Real.
Pouco depois desta notícia, em agosto de 2020, Juan Carlos comunicou ao filho que iria abandonar Espanha, devido à «repercussão pública que estão a gerar certos acontecimentos do seu passado» e por temer que pudessem impedir o seu filho de cumprir as suas funções «com a tranquilidade e o sossego» que a função de Rei exige.
Depois de muita especulação, Juan Carlos abandonou Espanha para iniciar um controverso exílio nos Emirados Árabes Unidos.