Querida avó,
Tu que tens resposta para tudo e mais alguma coisa diz-me: A que se deve o nome das terras?
Recentemente, na minha ida à inauguração da Exposição do Ruy de Carvalho em Vimioso, quase a chegar ao destino, dou comigo a entrar na freguesia “Campo de Víboras”. Acelerei o carro não fosse o campo estar minado com as ditas víboras.
Recordo-me de há uns anos, em visita a Ponte de Lima, ter passado pela freguesia “Anais”. Não te estejas a rir! O nome vem da sua padroeira, Santa Marinha de Anais.
Tu que tens heranças no município de Sintra, deves conhecer a freguesia “Carne Assada”. Segundo o que apurei com os mais velhos, o nome surgiu depois de um incêndio num local onde se criava gado e o cheiro da “carne assada” chegou bem longe.
No Gerês existe uma terra com o nome “Covide”. Durante a pandemia, a pequena freguesia de Terras de Bouro acabou por ficar famosa pelo nome.
Como sabes, a terra que hoje se chama “Amadora” foi durante muitos anos conhecida por “Porcalhota”.
Sabes, porventura, que nome tinha a vila de “Constância”? Pois é, querida avó, tinha a denominação pouco simpática de Punhete, imagina.
Tenho uma amiga que vive em Alcabideche. Sempre que vou a casa dela passo na freguesia “Pau Gordo”, que julgo ter herdado o nome de um grande pinheiro que ali existiu.
Não és tu que tens histórias sobre nomes de terras caricatos? Inclusive sobre a freguesia de Pedrógão Grande com o bizarro nome de “Picha”?
Por falar em “Picha”, tu que já colaboraste na toponímia da C.M.L., não me digas que o nome ao “Largo das Pichas Murchas”, ali para os lados do Castelo, junto à Rua de São Tomé, foi ideia tua.
A conversa está muito boa mas tenho que ir. Caso contrário ainda me mandas para o purgatório. E não estou a falar da freguesia algarvia com este nome que fica perto de Albufeira.
Boa Páscoa.
Bjs
Querido neto,
Esta história dos nomes é coisa complicada…
Sim, eu pertenci durante vários anos à Comissão de Toponímia da Câmara de Lisboa e adorei esse trabalho. Mas nós não podíamos mudar os nomes antigos que as ruas tinham, só podíamos dar nomes às ruas novas, que ainda não tinham nome. Por isso não tenho nada a ver com esse largo de que falas.
E realmente há terras com nomes bem engraçados… Já falaste de muitas mas há ainda aquela série de terras que se chamam A-De Qualquer Coisa, ou seja A-dos- Cunhados (em Torres Vedras), A-dos- Francos (nas Caldas da Rainha) A-dos- Cãos (em Loures e não, não é engano: chama-se Cãos porque Diogo Cão e toda a família era de lá).
E há outros lugares com nomes engraçados como “Água de Pau” (nos Açores), Urrô (em Arouca), Quintela de Lambaças (em Bragança) – já para não falar do Curral das Freiras na Madeira, ou da Bandalhoeira, aqui perto da Ericeira.
Mas não são só as terras que têm nomes estranhos: já alguma vez pensaste naqueles nomes estranhos que algumas pessoas também têm?
Quando eu era miúda detestava o meu nome. Alice era o nome da minha avó materna e parecia-me horrível. Só passei a gostar dele quando soube que, se não tivesse o nome da minha avó materna, teria o da minha avó paterna, Gertrudes…
Mas voltando a nomes mesmo estranhos. O primeiro que me vem sempre à ideia é o de uma colega minha de liceu, de quem perdi o rasto: Grisselinda Lebre Maçãs. E havia outra que se chamava Arnaldina Mimosa.
E uma vez conheci um professor de português que trabalhava numa escola na Suíça. Chamava-se Joaquim Morais. Um nome perfeitamente normal, não achas? Eu também achava. Só que um dia, para preencher um documento, era preciso ele escrever o nome completo. Escreveu mas disse-me: «Não olhe!, não olhe!».
Porque o nome completo dele era Joaquim Reduto dos Prazeres e Morais…
Como este é que de certeza não conheceste outro…
Boa Páscoa.
Bjs