A promessa de Macron de unir uma França em rutura

Emmanuel Macron foi o vencedor de umas eleições que revelam uma França completamente dividida.

Apesar do “susto” com a subida de Marine Le Pen nas sondagens, Emmanuel Macron foi reeleito como Presidente de França, recolhendo 58,54% dos votos contra os 41,46% da oposição.

O Presidente de centro-direita e pró-europeu dirigiu-se aos seus apoiantes junto à Torre Eiffel afirmando ser o “Presidente de todos” e comprometendo responder à “raiva e descontentamento” de todos os eleitores que votaram na extrema-direita.

“Sei que vários franceses votaram em mim hoje, não para apoiar as minhas ideias, mas para impedir as ideias da extrema-direita”, disse Macron, apelando aos seus apoiantes para que sejam “gentis e respeitosos” com todos os franceses que demonstrem uma ideologia diferente, uma vez que o país já foi dilacerado por “tanta dúvida e divisão”. “Eu não sou de um só campo, sou o Presidente de todos nós”, acrescentou.

Apesar de Macron ter feito história ao tornar-se o primeiro Presidente francês a ser reeleito nos últimos 20 anos, a verdade é muitos eleitores olharam para este como o menor de dois males.

“Vou votar no Macron, mas só para impedir que a Le Pen chegue ao poder”, disse um eleitor entrevistado pela BBC, enquanto franceses citados pelo Guardian acusam Macron de ser o “Presidente dos ricos”.

Segundo um estudo publicado após o resultado das eleições pela France 24, um mapa eleitoral revela uma França marcadamente divida entre os dois candidatos, com Macron a recolher a maioria dos eleitores nas grandes cidades francesas, nomeadamente em Paris, e entre os eleitores de classe média-alta e mais velhos, enquanto Le Pen conquistou um maior apoio entre os eleitores com maiores dificuldades financeiras de locais como a zona industrial do norte de França, no sul do Mediterrâneo e nos territórios internacionais.

 

A vitória na derrota de Le Pen

Apesar da nova derrota da candidata do partido Reagrupamento Nacional (antiga Frente Nacional), a oitava de um candidato com o nome Le Pen, tal como notou outro candidato da extrema-direita, Eric Zemmour, recordando as tentativas falhadas do pai de Le Pen, Jean-Marie Le Pen, para chegar à presidência francesa, o resultado de domingo foi o melhor alguma vez obtido por um candidato deste setor.

Apesar da defesa de ideias nacionalistas, apelando ao sentimento antimuçulmano (um dos principais pontos da campanha de Le Pen era proibir mulheres muçulmanas de usar a hijab), e da proximidade com o Presidente russo, Vladimir Putin, assim como os empréstimos no valor de quase dez milhões de euros que o seu partido recebeu de um banco russo, a forma como a candidata se distanciou das ideias e valores do seu pai, alterando o nome do partido, tornou o Reagrupamento Nacional um partido mais “amigável”.

Esta distância aliada à defesa de questões como o custo de vida ajudou Le Pen a tornar-se uma alternativa mais apelativa a uma classe trabalhadora desagrada com o mandato de Macron e a sua postura perante os franceses com maiores necessidades financeiras.

“Nesta derrota, não posso deixar de sentir uma forma de esperança”, disse a candidata de extrema-direita após o resultado das eleições, citada pelo Al Jazeera. “Nunca abandonarei os franceses.”

 

Protestos de esquerda

À semelhança do que aconteceu na primeira volta das eleições, o resultado deste processo democrático desencadeou protestos, juntando grupos anticapitalistas e antifascistas que condenaram a eleição de Macron e o elevado número de votos que Le Pen recebeu.

No centro de Paris, onde manifestantes se juntaram sob o lema “Celebremos o novo período de cinco anos de alegria”, uma dezena de carrinhas da polícia de choque e agentes concentraram-se em ruas perto do local do protesto para evitar confrontos, mas acabaram por dispersar os manifestantes com recurso a gás lacrimogéneo.

Existiu uma grande sensação de alvoroço em Paris, também motivada pelo facto de a polícia ter baleado duas pessoas que se encontravam dentro de um veículo que tentou atropelar os agentes. Até ao momento não foi possível confirmar se existe uma ligação entre este incidente e as eleições.

Além da manifestação em Paris, foram convocados outros protestos em mais de vinte cidades francesas, entre as quais Marselha, Lyon, Nantes, Toulouse, Rennes e Montpellier.

“Lá vamos nós para mais cinco anos de liberalismo liderado por uma oligarquia parisiense que causou muitos danos ao país”, disse à France 24 um manifestante de Toulouse que não votou nesta segunda volta.

 

Inesperadas congratulações

Após o anúncio da vitória de Macron, não tardaram a chegar as congratulações de velhos aliados, como representantes da União Europeia, que observaram com atenção o desfecho das eleições, temendo as tendências antieuropeístas de Le Pen, ou o Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, mas também chegaram mensagens de apoio inesperadas, nomeadamente de Vladimir Putin.

“Desejo-lhe sinceramente sucesso na sua ação pública, bem como boa saúde”, afirmou o Presidente russo num telegrama enviado a Emmanuel Macron, anunciou o Kremlin, uma mensagem surpreendente face ao apoio incondicional à Ucrânia que a França tem demonstrado.

Entretanto, o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, também enviou uma mensagem a Macron, desejando-lhe boa sorte e afirmando que este é um “verdadeiro amigo da Ucrânia”.