Recentemente foram notícia os despejos de ocupantes de habitação social. A habitação social ilegalmente ocupada, e não a respectiva desocupação, não é injusta. O que é imoral é que alguns se aproveitem deste episódio para fazer política oportunista. Cada casa ocupada abusivamente priva uma família com necessidade de habitação de dela dispor.
Ninguém, de ânimo leve, coloca pessoas fora de uma casa. Em Lisboa, cerca de 800 fogos municipais estão ocupados abusivamente. São situações que se arrastam há anos sem que a Câmara Municipal resolva o problema. Por outro lado, cerca de 6.000 famílias aguardam, também há anos, por uma habitação social, reunindo as condições para o seu acesso em virtude das suas circunstâncias socias e económicas, sem que a Câmara Municipal seja capaz de dar uma resposta a estas necessidades.
A habitação é um dos problemas centrais em Lisboa. Por um lado, o acesso à habitação é fortemente condicionado pelos elevadíssimos preços que tornam quase inviável a sua aquisição pelos jovens em início de carreira ou até pelas famílias da classe média. Por outro lado, o mercado de arrendamento continua a ser escasso, fruto da instabilidade das regras aplicadas que não promovem a confiança necessária para o investimento neste setor. No entanto, em Lisboa, estão identificados cerca de 48.000 fogos devolutos.
A Câmara de Lisboa não tem sido capaz de contribuir para uma resposta eficaz para o problema do acesso à habitação. Nos últimos anos, a promessa de 6.000 novos fogos para o Programa de Renda Acessível ficou por concretizar e conta ainda, no seu património, com cerca de 2.000 fogos devolutos, que deveriam contribuir para a oferta de habitação na cidade.
No setor da habitação social, a situação da capital é inaceitável, pela incapacidade de assegurar o cumprimento de regras, o que contribui para o avolumar das listas de espera. A GEBALIS – empresa municipal que gere os chamados Bairros Sociais — é responsável por cerca de 22.000 fogos. Destes, cerca de 1.400 estão devolutos. Na sequência das recentes notícias sobre os despejos, tornou-se público que se foram acumulando situações de ocupação abusiva de casas, sem que se tenha garantido a legalidade. Do universo de contratos arrendamento (renda apoiada), cujo valor é calculado em função do rendimento dos agregados e ajustado sempre que se verificam alterações, existem 9.000 com rendas em atraso, apenas 3.000 com acordos de pagamento, dos quais 2.000 não são cumpridos.
Cada habitação municipal ocupada abusivamente corresponde a uma família, em tantas situações com crianças, que permanece sem condições condignas. Em Lisboa são 800 casas ocupadas ilegalmente a que correspondem 800 famílias que necessitam, que têm direito a uma habitação municipal e que vivem em condições sub-humanas.
O universo da habitação municipal envolve questões sociais delicadas que devem ser acompanhadas, quer de quem ocupa ilegalmente estas casas, quer de quem tem direito às mesmas. Mas a legalidade do seu usufruto tem de ser assegurada sob pena de se contribuir para uma dupla injustiça – na ocupação abusiva e na privação da sua legítima (e necessária) utilização.