Por Alice Vieira e Nélson Mateus
Querida avó,
Recentemente vi que as estações de metro, em Lisboa, estavam com imensos cartazes a anunciar uma nova novela.
Já nem me lembro qual foi a última novela que vi.
Tenho ideia de alguns títulos e até de alguns atores que participam. A divulgação é tanta que é impossível passar despercebida. No entanto, não faço a mínima ideia de quantas novelas dão por dia nos diversos canais. Para darem tantas novelas é porque devem ter público.
O que é bom, pois assim dão trabalho a muita gente.
Estou tão velho que me recordo perfeitamente da Gabriela, Cravo e Canela, a novela que foi inspirada no livro homónimo de Jorge Amado.
Chega a Portugal em 1977 e, como sabes, foi uma escandaleira. Apesar de já vivermos em democracia, grande parte da população continuava com a mente a preto e branco, tal como a televisão na época.
Recordo a célebre frase que as avós (e não só) usavam: «É o fim do mundo»!
Os beijos ardentes e a imagem da Gabriela quando subiu ao telhado para apanhar o papagaio de papel ficaram nas memórias de muito boa gente.
Como não podia deixar de ser, estas cenas emblemáticas voltaram a fazer parte do remake da novela em 2012.
Desta vez com a atriz Juliana Paes como protagonista.
Já te disse que a primeira vez que a Juliana Paes veio a Portugal ficou na minha casa?
Sim, essa que agora está como protagonista da novela O Pantanal em exibição na SIC.
No ano seguinte fui ao Rui de Janeiro. Quando cheguei tinha a Juliana à minha espera no aeroporto. Como se não bastasse, não só fiquei na casa dela como me levou a visitar o Projac (local onde fazem as novelas no Brasil).
Recordo a expressão que a Gabriela usava frequentemente: «Sapatos não, Seu Nacib!».
O genérico é também inesquecível: «Eu nasci assim, eu cresci assim, vou ser sempre assim: Gabriela, sempre Gabriela!».
Tu que sabes tudo, é verdade que a nossa Assembleia da República fechou mais cedo para que os deputados pudessem ver o último episódio da Gabriela, Cravo e Canela?
Bjs
Querido neto,
Estava eu sossegadinha a ler um livro chamado o O Magriço, escrito pelo Tiago Salazar (a propósito, saberás tu quem foi o Magriço? Tenho cá a sensação de que não fazes ideia, mas adiante…) quando tu vens lembrar as telenovelas!!
Oh meu Deus, sei lá há quanto tempo não vejo telenovelas!!
Mas claro que me lembro da Gabriela, Cravo e Canela. Para já era uma adaptação de um grande romance de Jorge Amado, e com actores extraordinários, nada do que acontece agora, ou é raríssimo acontecer.
Foi nesse ano que uma data de meninas foram baptizadas com o nome de Jerusa… Felizmente a moda foi breve.
Sim, é verdade que a Assembleia da República fechou mais cedo… por causa da novela. Mas com os deputados posso eu bem. O pior, o pior… até me custa contar isto… o pior aconteceu comigo! Estava eu nesse dia no Hospital Particular de Lisboa (que já não existe) a torcer-me com dores, no meio de um aborto espontâneo — e mesmo assim a pedir à enfermeira que me trouxesse rapidamente, para além dos analgésicos para me atenuarem um pouco aquelas dores horríveis, um televisor para ver o fim da telenovela.
A enfermeira nem acreditava. Ainda me lembro de ela perguntar ao meu marido, e de ele encolher os ombros. E o televisor lá veio.
Até há algum tempo a RTP dava uma série chamada Pôr do Sol, da autoria do meu amigo Manuel Pureza, que era de rir à gargalhada do princípio ao fim. Era uma sátira muito bem feita às telenovelas. O Manuel garantiu-me que ia haver uma segunda série – mas até hoje, nada.
Agora vejo, na TVI, Festa é Festa. Não é tão boa como o Pôr do Sol, mas também é muito divertida e tem a minha grande amiga Maria do Céu Guerra, entre outros.
Nunca tinhas contado à avó que és amigo da “Gabriela”.
Não escolhes nada mal as tuas amizades!
E agora vou voltar ao meu torrão de Penedono – se é que sabes do que estou a falar…
Bjs