Só no mês de abril, o Estado português arrecadou cerca de 51,6 milhões de euros por dia em IVA e Imposto Sobre Produtos petrolíferos (ISP). Estes são os valores que constam na mais recente síntese de execução orçamental onde está detalhado que, em Imposto sobre Valor Acrescentado, durante todo o mês de abril, o Governo arrecadou 1.329 milhões de euros, um valor bastante superior ao do ISP: 217 milhões de euros.
No mês anterior, o Governo tinha arrecadado com estes dois impostos pouco mais de 37,4 milhões por dia, o que significa que, de um mês para o outro, o Estado aumentou estes lucros em 14,2 milhões de euros.No documento, o Governo explica: «Na receita fiscal sobressaiu o crescimento da receita do IVA (+26,2%), para além da cobrança do IRS (+6%), ISP (+22,8%), IRC (+76,4%), Imposto do Selo (+17,2%) e imposto de consumo sobre o tabaco (+14,4%)».
A recuperação da economia
Os dados do Ministério das Finanças divulgados esta semana mostram que o défice orçamental fixou-se em 782 milhões de euros em abril, «evidenciando uma melhoria de 4.272 milhões de euros face aos primeiros quatro meses de 2021, momento em que a atividade económica foi fortemente afetada por um confinamento geral». E, tendo por comparação o mesmo período de 2019, «de forma a expurgar o efeito base causado pela pandemia, o saldo melhorou em 528 milhões de euros».
Ao Nascer do SOL, Paulo Rosa, economista do Banco Carregosa, começa por explicar que «os impostos indiretos, nomeadamente o IVA, incidem em última instância sobre os preços no consumidor».
Quer isto então dizer que «a significativa subida da inflação no primeiro quadrimestre, de janeiro a abril, impulsionou as receitas fiscais indiretas», diz, continuando a sua explicação: «As contas do Estado são contabilizadas em termos nominais, beneficiando dos preços mais elevados que aceleraram as receias fiscais, designadamente as indiretas e mais especificamente o IVA, o maior contribuinte para o robusto aumento das receitas fiscais».
Em sentido contrário à subida das receitas fiscais, a despesa pública diminui ligeiramente e não acompanhou a inflação, explica o economista, «atenuando significativamente a diferença entre as receitas e despesas do Estado, contribuindo para uma considerável melhoria das contas públicas».
Já os impostos diretos, nomeadamente o IRS, «tiveram uma contribuição menor do que os indiretos, especificamente o IVA, porque os salários não têm acompanhado a subida da inflação, logo as receitas de IRS não são tão expressivas como as receitas de IVA que incidem sobre preços mais altos devido à elevada inflação».
Vamos a números. No que respeito à evolução no primeiro quadrimestre esta «traduz a melhoria da atividade económica e do mercado de trabalho bem como a redução dos encargos associados às medidas de prevenção e combate da covid-19, em face da melhoria verificada na situação pandémica», diz o ministério tutelado por Fernando Medina. Assim, feitas as contas, a receita cresceu face a 2021 (+15%) e observou-se uma ligeira redução da despesa (-1,8%). Excluindo o efeito da despesa associada à covid-19, a despesa primária cresceu 2,1% em termos homólogos.
Por sua vez, o saldo primário, que exclui juros da equação orçamental, foi positivo em 2.042 milhões de euros. Este é um valor que compara com um défice primário de 1862 milhões de euros em 2021 e um excedente primário de 2078 milhões de euros em 2019.
Paulo Rosa é claro ao defender que «a economia está a recuperar bem e registou o melhor desempenho da Zona Euro no primeiro trimestre com um aumento de 11,9%, em parte a beneficiar da retoma do setor do turismo e das receitas deste setor externo que impulsionam não só o PIB, mas também as receitas fiscais do Estado, mais especificamente as receitas de IVA».
E porquê? O economista explica que «a elevada inflação é um cabal colaborador para um bom desempenho das contas públicas. Em suma, quanto mais altos forem os preços dos bens e serviços mais elevada será a receita de IVA, desde que o crescimento económico não abrande».
Assim, os dados da DGO mostram ainda que, com a retoma da atividade económica, a receita fiscal e contributiva aumentou 15,5% face ao período homólogo (12,6% face a 2019), «destacando-se o contributo da receita fiscal (18,8% face a 2021 e 11,2% face a 2019) em particular a recuperação do IVA (+26,2% face a 2021 e +12,7% face a 2019), que evidencia a recuperação económica dos últimos meses».
Face aos primeiros quatro meses de 2021, a redução da despesa em 1,8% face a 2021; (+10,8% face a 2019) traduz essencialmente a redução de 1,5% na despesa corrente, «fortemente influenciada pelas reduções de 11,5% dos juros e outros encargos e de 4,8% das transferências correntes devido à diminuição do impacto com medidas Covid-19», diz o Governo.
Já a despesa primária expurgada de efeitos associados às medidas de prevenção e combate à covid-19 cresceu 2,1% face a igual período de 2021 e 9,6% face a 2019.
Nos gastos do SNS, registou-se um acréscimo de 6,9% em termos homólogos, «destacando-se a componente de aquisição de bens e serviços (+13,6%). Face a 2019 o aumento foi de 26,6%».
Destaque ainda para as despesas com salários nas Administrações Públicas que cresceram 3,2% face aos mesmos quatro meses do ano passado, «destacando-se a evolução no SNS (+4,9%) e no pessoal docente dos estabelecimentos de ensino não superior (+4,9%), refletindo o aumento no número de contratações, os aumentos salariais e as valorizações remuneratórias».
O ministério avança também que a despesa com prestações sociais realizada pela Segurança Social excluindo prestações de desemprego e medidas covid-19 cresceu 2%, destacando-se o subsídio por doença (+21,7%) e as prestações de parentalidade (+16,1%).
Sobre o facto de o saldo orçamental ser melhor que o de 2019, Paulo Rosa justifica com a inflação. «A melhoria deve-se em grande parte à alta da inflação que tem contribuído para fortalecer os cofres do Estado. A atual melhoria do saldo orçamental do Estado beneficia de um aumento das receitas fiscais indiretas, alicerçadas num PIB nominal mais elevado do que em 2019, e da diminuição da despesa pública».
E acrescenta que, no entanto, a atual subida dos juros «pode penalizar o serviço da dívida das contas do Estado no futuro, a par de um potencial acréscimo da despesa pública por aumentos salariais e reforço de dotações dos vários ministérios e organismos públicos para responderem ao aumento da inflação, caso esta se mantenha persistente».
Medidas covid atingem 1.461 milhões
Nos primeiros quatro meses do ano, «não obstante a menor magnitude do impacto das medidas covid-19 em 2022 face ao período homólogo, o impacto no saldo até abril ascende a 1.461 milhões de euros».
Para estes valores, contam as medidas extraordinárias do lado da receita que ascendem a 240 milhões de euros, destacando-se a perda de receita decorrente da prorrogação do pagamento do IVA (241 milhões de euros) e o encaixe da revenda de vacinas contra a covid-19 a países terceiros (-32 milhões de euros).
Do lado da despesa, as medidas com impacto no saldo ascendem a 1.221 milhões de euros «destacando-se os apoios direcionados ao rendimento das famílias (340 milhões de euros), ao setor da saúde (429 milhões de euros) e às empresas (320 milhões de euros)».
Questionado sobre se o fim das medidas covid veio dar uma ajuda à economia, o economista do Banco Carregosa defende que a gradual diminuição das restrições à covid-19 «tem impulsionado o setor do turismo e este foi um dos principais impulsionadores do crescimento do PIB português no primeiro trimestre». Uma subida da economia que, diz, «já de si é muito positiva para as receitas do Estado, e é mais ainda quando o crescimento do PIB nominal é significativamente mais elevado devido ao aumento da inflação, traduzindo-se em mais receitas fiscais indiretas».
No entanto alerta que esta subida das receitas do Estado «não tem sido acompanhada pelo aumento da despesa pública, culminando numa melhoria das contas públicas».