Duas entrevistas muito recentes me chamaram a atenção.
Uma, a do sempre jovem Henry Kissinger.
Outra a do Chanceler Olaf Scholtz.
Diz o primeiro que a Europa não deve esmagar a Rússia e que a Ucrânia deve fazer concessões territoriais.
Sensato e coerente este senhor.
Já na questão de Timor foi claro e simples. A solução óptima seria a integração na Indonésia.
Às malvas a invasão, o morticínio, a resistência.
O mundo repousaria sobre o cemitério da liberdade.
«Better red than dead» era a palavra de ordem contra a intervenção no Vietname.
Aqui seria ligeiramente diferente. A Indonésia era a campeã do anticomunismo e temia-se a influência daquela ideologia no suporte à pretendida independência.
Seguiu-se um tempo de violência convenientemente ignorada.
Até que, muitos anos e mortes depois, a verdade se impôs e os Estados Unidos se demarcaram da doutrina Kissinger.
Até que um novo país sofrido nasceu e o invasor saiu.
O que ele diz hoje é algo de meridiana clareza.
A Rússia quis a Crimeia, muito bem, já foi.
A Rússia quis Donetsk e Lugansk, muito bem, já estávamos habituados.
A Rússia quer o Donbass, que diabo, é só mais um bocadinho.
Portanto, Kissinger não percebe a exigência e detesta o incómodo.
E, sempre que o problema se colocar, a solução será a mesma.
A Rússia não ficará sozinha. O mundo todo a ampara e acompanha.
A Rússia não será esmagada, esmaga.
Basta dizer ao ouvido, aos espoliados, que para sossego geral se devem calar.
De outro modo, a perturbação da economia mundial, o desequilíbrio geoestratégico, a fome, a crise energética terá neles origem.
É certo que não invadiram, não destruíram, mas defenderam-se.
Aqui reside a sua culpa.
A nomenclatura do Kremlin agradece. Aquele senhor Medvedev que de vez em quando substituía Putin como
Presidente até este assegurar o poder eterno, por revisão constitucional, irá citá-lo.
Estamos conversados.
Mas eis que, minutos depois, uma outra entrevista mas captou a atenção.
Scholz esclarece que não será tão estúpido como o Kaiser que foi arrastado para a guerra.
E diz mais.
No extremo da prudência acrescenta que irá, calmamente, esperar pelo momento em que Putin declare ter atingido os seus objetivos.
Nessa altura haverá condições para a paz.
O deserto das cidades destruídas da Ucrânia, a imensidão do território ocupado, a acumulação das valas comuns, a tragédia dos deslocados em fuga, constituirão o cenário do fim da guerra.
Scholz, afinal, não é mais nem menos do que o confiante Schröder, do que os aliados de governo com a anterior Chancelerina alemã, de todos aqueles que entregaram a Europa à dependência do gás russo.
É paciente, Scholtz..
Talvez possa acontecer mais depressa se os ucranianos não forem apoiados, se não puderem anular a frota russa, se não conseguirem responder ao ataque destruidor.
Eu sei que todos nós sofremos com esta situação, com a perda de rendimentos, com o aumento dos preços, com a alta das taxas de juro, com a escassez de bens.
Eu sei que a Alemanha tem sido muito boa para a Europa e que nunca esqueceremos estes anos faustos.
Eu sei que lhe custam os sacrifícios que está em vias de fazer.
A nós também.
Esperamos muito dela.
Um golpe de génio que consiga salvar um país, libertar um povo e terminar com a guerra.
Um pouco mais de coragem, talvez.
E a recordação da alegria imensa da reunificação alemã e de quanto contribuímos para ela.