Victor Hugo, no romance Nôtre-Dame de Paris, chamou-lhe “um livro de pedra”. Três anos depois do incêndio que queimou algumas das páginas dessa história iniciada na Idade Média, os técnicos de restauro trabalham contra o relógio para que a catedral de Notre Dame, um dos monumentos mais emblemáticos e visitados de Paris, reabra as portas dentro do prazo previsto.
Numa visita ao estaleiro, em que foi acompanhada pelo maire do centro de Paris, Ariel Weil, a ministra da Cultura francesa, Rima Abdul Malak, reiterou que a intervenção está a respeitar os calendários. “Estamos confiantes de que 2024 será o ano em que grande parte desta obra será concluída, o ano da reabertura da catedral aos fiéis e ao público”, declarou Abdul Malak.
A cidade-luz vai receber os Jogos Olímpicos de 2024 e Emmanuel Macron quer que nessa altura este ícone turístico já esteja funcional e visitável. Para supervisionar as obras foi nomeado um militar, o general Jean-Louis Georgelin, que considerou a meta “ambiciosa”.
O processo de restauro foi dividido em duas fases. A primeira, a fase de segurança, está terminada, tendo consistido na avaliação dos estragos, limpeza do interior e consolidação das zonas em risco de colapso.
Está agora em curso a fase de reconstrução da estrutura de madeira da cobertura, o elemento mais castigado pelo incêndio de abril de 2019. As pedras das abóbadas também estão a ser alvo de uma intervenção de fundo e a flecha desenhada no século XIX pelo arquiteto Eugène Viollet-le-Duc, a cuja queda os parisienses e o mundo assistiram com incredulidade, será reposta, numa reprodução exata da original. Além disso, os vitrais foram tirados das caixilharias e limpos.
800 milhões não são suficientes Quando as primeiras imagens da catedral em chamas começaram a ser divulgadas na televisão, chegou a temer-se o pior. Especialistas anteviam que os danos provocados pelo fogo poderiam causar a derrocada do telhado, que ao cair devastaria, de forma talvez irremediável, a nave da igreja.
“Tudo está em vias de arder: a obra de carpintaria, que data do século XIX de um lado, e do século XIII do outro, não ficará nada”, disse então o porta-voz da catedral, André Finot. “Está por saber se a abóbada, que protege a catedral, será afetada ou não”. Felizmente não foi.
Tudo começou pelas 18h50, muito perto da hora de encerramento ao público, provavelmente com uma faísca resultante dos trabalhos de restauro que estavam em curso na cobertura, na zona do sótão.
As chamas alastraram, e em breve uma densa coluna de fumo se elevava nos céus de Paris. A rápida intervenção dos bombeiros circunscreveu os estragos e as principais relíquias do templo foram postas a salvo. Antes da meia noite o fogo estava extinto. Do mal o menos: o grosso dos elementos destruídos datavam do século XIX, com a estrutura medieval a sobreviver quase incólume. Tivesse o incêndio lavrado mais uma hora e meia e tudo poderia ter sido diferente – para pior.
Ainda as cinzas estavam quentes e já choviam de todo o mundo anúncios de generosas doações. O montante total angariado ascende aos 800 milhões de euros. Mas mesmo isso poderá não chegar. As obras, que preveem também uma reconfiguração da envolvente, com uma nova praça nas traseiras e mais zonas verdes, foram orçamentadas em mil milhões.