Rússia recusa desmilitarizar central nuclear

Os russos são acusados de usar a central de Zaporíjia como uma espécie de escudo, disparando mísseis a partir daí. Receia-se que os ucranianos retaliem e provoquem um desastre.

Aumentam os receios quanto à gigantesca central nuclear de Zaporíjia, que os militares russos são acusados de transformar numa autêntica fortaleza, lançando a partir daí bombardeamentos com mísseis e artilharia. A eventual retaliação das forças ucraniana pode causar uma tragédia. E o Kremlin ainda esta sexta-feira rejeitou os apelos das Nações Unidas para desmilitarizar esta central e os seus arredores, mesmo estando Kiev a lançar uma contra-ofensiva na região.

A justificação do representante permanente do Kremlin na ONU, Vasily Nebenzya, foi que a presença militar russa era essencial para «proteger» a central de Zaporíjia, avançou o Guardian. E que uma retirada a deixaria «vulnerável a provocações e ataques terroristas», continuou Nebenzya. Não é claro porque é que forças da Ucrânia, onde a memória do desastre de Chernobyl, em 1986, está bem viva, haveriam de querer arriscar mais uma catástrofe nuclear no seu próprio país.

Outra explicação para a forte presença militar russa na central nuclear de Zaporíjia seria uma tentativa de usá-la como uma espécie de âncora para a sua linha da frente, devido à natural reticência em atacar instalações nucleares. E o Kremlin bem tenta reforçar as suas posições na região, tendo na semana passada começado a deslocar forças do leste da Ucrânia, onde até então tinha concentrado o seu poderio militar, para enfrentar os recentes avanços dos militares ucranianos no sul, sobretudo nos arredores de Kherson e Zaporíjia, conquistando dezenas de localidades. 

Aliás, Kiev, que apostou em colocar no sul boa parte dos seus novos M142 HIMARS – plataformas para lançamento de mísseis oferecidas pelos EUA, com um enorme alcance de até 80km, com que os ucranianos têm semeado o caos na retaguarda dos invasores, atingindo centros logísticos e depósitos de munições – tem esperança que uma grande vitória na região possa ser decisiva para o rumo desta guerra.

«Aqui estamos todos convencidos que, mal as tropas russas no sul da Ucrânia sejam esmagadas, imediatamente levará ao início do colapso do regime de Putin na Rússia», assegurou Yulia Timoshenko, antiga primeira-ministra ucraniana, em entrevista ao Nascer do SOL (ver páginas 52 a 55). «As lutas internas das elites russas escalarão enormemente, porque deixarão de acreditar que a Rússia está no lado vencedor», antevê. 

O risco é que, pelo meio, o pior possa suceder na central de Zaporíjia. Esta semana, Kiev acusou forças russas de atingir sucessivamente posições ucranianas, do outro lado do rio Dnipro, com mísseis Grad lançados a partir destas instalações nucleares. Já o Kremlin acusou os defensores de bombardear a central.

«É a situação mais crítica em termos de segurança nuclear desde o início da guerra», avisara Dmytro Gumeniuk, responsável pelo departamento de análise de segurança do SSTC NRS, centro estatal ucraniano para a segurança nuclear e radioativa, ao i, esta segunda-feira.

Os invasores têm disparado a partir «não na zona de contenção dos reatores nucleares mas nos edifícios adjacentes, onde estão tubagens de vapor que são necessárias para o arrefecimento do reator e para a ligação de energia à rede», explicou o engenheiro nuclear ucraniano. «Em caso de explosão, é possível haver estragos nestas tubagens e o arrefecimento do reator pode perder-se, o que pode atingir o combustível nuclear».