Por Francisco Gonçalves
A deputada ao Parlamento Europeu Margarida Marques, anterior secretária de Estado dos Assuntos Europeus, deu-nos a notícia mais importante das últimas semanas: o atual pacote de fundos europeus não será o último. Os fundos não acabam em 2030!
A notícia, de certo modo, contraria o que o primeiro-ministro António Costa tinha dito sobre a matéria, e sossega os espíritos mais inquietos, preocupados por o país passar a ter de fazer mais por si próprio.
Escrevemos, a 25 de julho, num artigo intitulado «A pobreza, os pobres e os pobres de espírito», que os fundos comunitários se tinham transformado na «doença holandesa» do nosso regime, após a integração na CEE/UE. Claro está que Portugal não tem (ainda?) nos fundos a fatia maior da riqueza nacional, mas estamos viciados nos mesmos, no lugar de estarmos viciados em produzir.
Esta nossa dependência dos fundos parece ter origem, sobretudo, nas questões ideológicas de um modelo que, à força, mas com gentileza, está a ser imposto. Passamos a explicar.
A esquerda radical sempre colocou o combate às desigualdades sociais na distribuição da riqueza, nunca percebendo que esta se deve fazer na riqueza que se cria e não na existente. Distribuir a riqueza já existente apenas é possível através do esbulho ou com uma revolução – que (quase) ninguém quererá. Em Portugal, também foi possível fazê-lo durante o Governo da troika, quando se violou o contrato das reformas dos pensionistas, com os custos eleitorais para quem o fez a perdurarem no tempo.
A incapacidade de realizar as reformas estruturais de que o País está, há décadas, necessitado, isto dito pelo próprio primeiro-ministro, depois de ter passado anos a desprezar um líder da oposição que se oferecia para ser parceiro dessas reformas, empurra para as teses da melhor distribuição sem criação de riqueza. Onde chegamos? Onde estamos hoje: com o ordenado mínimo cada vez mais próximo do ordenado médio, que não sobe, porque não pode subir por decreto.
Qual foi a escolha da esquerda radical para explicar que deve ser assim? Falar do crescimento eterno, dizendo que este é um mito que coloca em causa o planeta e as gerações futuras. A ativista Greta Thunberg foi, provavelmente, a principal porta voz destas ideias.
Sentada no conforto do modo de vida sueco, longe de ser uma cidadã do sul da Europa, onde a falta de recursos no serviço nacional de saúde obrigam uma grávida, de um centro urbano, a realizar um parto a 150 quilómetros de casa, e ainda mais longe de uma mãe etíope ou indiana que não têm o que comer ou o que dar de comer aos filhos, a jovem sueca prega uma igualdade que nunca existiu e informa que o crescimento que tira uns da pobreza e outros da miséria é um mito.
Claro está que, em tempos de pobreza de espírito, a pregação tem sempre quem esteja disposto a escutar, particularmente quando a mesma nos é dada a todo o momento como ‘ciência boa’ por uma comunicação social demasiadas vezes preguiçosa, que não pensa nas consequências perversas das ideias que ajuda a propagar.
Um país que demora gerações a decidir as suas obras estruturais, que não explora os seus recursos e não cria uma cultura de produção e que, consequentemente, não tem um modelo desenvolvimentista, terá sempre tendência para socorrer-se de apoios de terceiros. Ignora-se, porém, que estes apoios, mesmo num quadro de União Europeia, não deixam de ser uma forma de dependência e de menoridade soberana, e que qualquer forma de dependência limita a liberdade de decisão.
A canção dizia que, como a gaivota, somos livres. Ficamos, assim, como a canção: somos livres de sonhar, apenas não somos livres de viver…