Estava tudo bem. Ou parecia estar. Como Joan Didion escreve em O Ano do Pensamento Mágico, "a vida muda num instante. Num dia normal". Depois de ter passado pela Costa Rica com a família, Luís Miguel Cardoso, de 52 anos, foi até à Guatemala. Sentiu dores de cabeça fortes e foi a um médico, sendo que este lhe prescreveu medicação: mas nunca imaginando que aquele era o sintoma de algo grave. Já em Nova Iorque, o último destino das férias, "começou com náuseas e a delirar", como explica a enteada Francisca Neves, de 22 anos, em declarações ao Nascer do SOL.
"Chamámos uma ambulância no dia 29 de agosto, por volta das 2h. Os paramédicos acharam que ele estava a ter uma crise de enxaquecas. Assim que ele fez uma TAC no Hospital New York Presbyterian, foi imediatamente transferido para o Weill Cornell Medical Center e operado às 5h. Já sabíamos aquilo que estava a acontecer e os médicos foram sempre impecáveis connosco", explica a jovem que estuda Medicina Dentária em Madrid. "Deixaram sempre o diagnóstico muito reservado e, mal lhe tiraram os sedativos, no dia 30 de agosto, teve uma hemorragia e tiveram de o operar novamente. Foi de urgência para o bloco. Deixaram-no entubado e sedado, até porque tinha a zona das cordas vocais inchada. Foi tudo mais lento, mas reagiu melhor quando o tiraram da sedação, a 31 de agosto", observa, explicando que "o derrame aconteceu na camada subdural, aquela que protege o cérebro".
"Ele esteve na Unidade de Cuidados Intensivos até ao dia 6 de setembro e teve alta do hospital no dia 8, mas disseram-lhe logo que não podia voar para Portugal. O Luís Miguel tem de fazer a reconstrução do cérebro, até porque tiveram de lhe tirar parte dos ossos parietal e temporal para drenar a hemorragia. Na segunda cirurgia, colocaram-lhe outro dreno e tiraram-lhe mais", esclarece a rapariga que voltou para território nacional, assim como o irmão, os tios e a prima porque a TAP pediu 500 euros pela alteração da data de cada voo. "A minha mãe é a única pessoa que está abrangida pelo seguro e eles estão em casa de um chefe da minha prima. O senhor é português e é dono de uma multinacional. Ainda estiveram num hotel, durante uma semana, mas quem é que pode pagar 200 euros por noite?", elucida e questiona.
"Por exemplo, cada TAC custa 1500 euros e foram feitas seis. O valor de 150 mil euros, que estamos a pedir na campanha de angariação de fundos, cobre aquilo que foi feito até agora: a partir daqui não temos mais dinheiro. Queríamos que as próximas intervenções fossem feitas cá, no Serviço Nacional de Saúde (SNS), mas os médicos dizem que não é seguro que o meu padrasto volte já para Portugal. Temos uma assistente social incrível. O seguro é o MDS Portugal: pediram imensa documentação para pagarem 30 mil euros – ficam a faltar 120 mil – e, mesmo assim, a assistente tentou sempre agilizar tudo", sublinha, lamentando que a companhia de seguros não tenha facilitado o processo. "Ele, neste momento, está estável. Quase não sai de casa porque tem dificuldades a caminhar mas, no meio desta confusão toda, está minimamente bem porque reage a tudo, fala, etc. Diz que está desfigurado", afirma Francisca que conversou com a mãe e Luís Miguel, pela última vez, na noite de ontem.
"Acho que eles se vão reunir com o departamento financeiro do hospital porque, pelo menos, com os norte-americanos fazem prestações. As pessoas podem ajudar por MB WAY, IBAN e pelo GoFundMe. Espero que isto não caia no esquecimento. Falámos com o consulado e não nos ajudaram. Quando cheguei a Portugal, escrevi uma carta à embaixada portuguesa em Washington, à Câmara Municipal do Porto e ao Ministério dos Negócios Estrangeiros – a autarquia disse que não conseguia ajudar, a embaixada não deu grande feedback e o Ministério não respondeu ainda", declara a estudante universitária que pede aos portugueses que auxiliem o Professor de Educação Física que, desde 2000, trabalha na Associação de Voleibol do Porto.
"Ele sempre foi saudável. Tanto que as nossas férias são sempre ativas e ele estava bem, ninguém diria que isto ia acontecer! Só o facto de ser um português que ficou doente numas férias… Pode acontecer a qualquer um de nós", frisa. "As pessoas não têm noção do quão são afortunadas por terem o SNS! Em termos de tratamento médico, lá não poderia ser melhor… A questão é o preço. É quase como comprar uma casa, o valor é equiparável", lastima, apelando àqueles que tiverem condições financeiras que deem a mão a Luís Miguel "nem que seja com um euro".
"Quando recebi a mensagem sobre o Luís, percebi que ele tinha tido o mesmo problema que eu (aneurisma cerebral). No caso do Luís, um aneurisma cerebral roto, nos Estados Unidos: é uma despesa incomportável de pagar. Portanto se não se morre da doença, morre-se das dívidas", começa por dizer a ativista Francisca de Magalhães Barros, a primeira pessoa a divulgar e apoiar esta causa, ao Nascer do SOL. "Vi que, apesar de estar extremamente cansada devido à campanha da UNICEF, jamais poderia deixar de falar, reportar e gritar pelo seu caso. Primeiro, porque é um lutador, segundo porque merece que lutem por ele numa situação incomportável porque o Estado deveria intervir nestas situações-limite", critica. "Nós somos solidários e o objetivo é que o Luís consiga sair de uma situação em que não se colocou. O que aconteceu ao Luís, podia acontecer a todos, não se esqueçam disso!", alerta a também cronista e pintora.
Se quiser contribuir para que Luís Miguel pague os cuidados médicos que já recebeu e quiçá consiga reunir o valor para os próximos, pode visitar a conta de Instagram @help_luismiguel e fazer uma transferência, por MBWay (para os números que vão sendo veiculados devido ao limite diário de transferências), para o IBAN PT50003507320005378990092 ou clicar aqui e aceder à campanha no GoFundMe.