por Alexandre Faria
Escritor, advogado e presidente do Estoril Praia
Assim como o verão e as suas habituais férias passam num ápice, também o Inverno se aproxima a um ritmo imparável, envolto em pessimismo face ao período conjuntural que enfrentamos, à inflação galopante e às baixas expectativas económicas das famílias e da sociedade em geral. Sem que tenhamos a oportunidade de nos apercebermos, o frio dos temporais estará à porta e as únicas hipóteses promissoras residem numa verdadeira afirmação do Estado Social de Direito.
Se a pandemia o demonstrou inicialmente, o conflito armado que castiga o mundo dissipou quaisquer dúvidas, exibindo aos olhos de todos a nossa vulnerabilidade, a excessiva dependência energética e a frágil distribuição equitativa de alimentos, onde nem escapa o sobranceiro e autodenominado primeiro mundo. Nesta flagrante ausência universal de justiça, ficou evidente que os mais fortes não sobrevivem sozinhos e que apenas um compromisso sério mundial poderá acalentar uma diferente perspetiva futura, de forma a ser possível partilhar o potencial de cada um. Se tal não suceder, corremos o risco das antigas promessas baseadas no respeito pelo princípio da igualdade, na autodeterminação dos povos e nos direitos do homem, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião, se tornarem falsas, desprovidas de sentido e insuscetíveis de se concretizarem.
A estação mais gelada do ano aproxima-se e recordo-me dos 30 graus negativos que senti numa das visitas à República da Moldova, onde milhares de vidas humanas dependem de gás para o seu aquecimento e consequente sobrevivência. Mesmo uma breve suspensão dessa distribuição será fatal, não apenas neste país como em muitos outros, lembrando trágicos e devastadores episódios sem perdão ocorridos na História.
A afirmação social da humanidade está colocada à prova e, mais do que nunca, as suas instituições, bem como os cidadãos no seu dia-a-dia, terão de demonstrar uma unidade global nunca vista. Desde os órgãos europeus às autarquias locais, passando pelos governos nacionais, quaisquer níveis de administração serão determinantes, devendo cooperar entre si e desenvolver os seus apoios específicos junto dos mais diversos setores sociais, económicos e associativos, garantindo uma concertação plena, capaz de defender os mais desfavorecidos no âmbito de um apelo geral ao sentido de comunidade.
No caso específico português, apesar das recentes medidas apresentadas pelo governo necessitarem de uma reavaliação mais ambiciosa, a discussão em torno do seu alcance momentâneo é demasiado oca perante os desafios que se apresentam, tanto pelas responsabilidades orçamentais de cada membro da União Europeia, como por causa das nossas conhecidas dificuldades infraestruturais internas que aconselham prudência nestes mares por navegar.
É tempo de conciliação e de complementaridade, devendo cada autarquia local promover, de igual modo, o seu decisivo contributo às famílias, às empresas e às organizações com sede no seu concelho. Tal como não existem fronteiras para as adversidades, das fragilidades comuns terá de surgir a solidariedade.