O que é mais difícil de explicar numa situação como a que hoje vivemos é o castigo da perda de rendimentos para as pessoas e o aumento das receitas tributárias do Estado.
E, todavia, pareceria fácil encontrar uma solução compensatória.
Ou seja, permitir a mobilização de parte daquele excedente para reparar as perdas.
Claro que há pessoas para quem os danos são mais profundos e outras a quem a dificuldade custa menos. E claro, também, que o Estado tem limites na abertura dos cordões à bolsa.
Ora, de entre todos aqueles que perdem, os reformados são mais visíveis.
Estão num momento da sua vida em que ficam particularmente vulneráveis com uma perda sem remédio nem capaz de encontrar substituição.
A inflação come uma parte significativa dos rendimentos, o encarecimento da energia cria uma pena adicional.
Portanto, o Estado deve ser claro e objetivo na definição das medidas a tomar.
A pior das soluções é tornar complexo o que devia ser simples.
É urgente uma ajuda, nestes precisos tempos.
O Estado deve determiná-la em função das suas capacidades mas agora, enquanto as dificuldades se sentem, tão rapidamente quando começam a sentir-se.
A dilação no tempo das medidas é uma forma de injustiça, de insensibilidade. Mas, pior que tudo é complicar as soluções. É juntar o transitório ao efeito perene.
E enganar. Dizer que há um aumento quando há apenas uma antecipação. Dizer que se não perde quando se não consegue explicar o que a seguir virá. Esconder as consequências.
Ou, depois, anunciar a mudança que intimida e tantas vezes foi negada, a da fórmula de cálculo das pensões.
Será culpa das oposições tentar esclarecer, denunciar falhas, apresentar outros caminho s, discordar? O poder usa e abusa das declarações que levam a considerar as suas ideias o bem e as que se lhe opõem o mal.
Defende-se com a virtude da prudência e do equilíbrio contra os perigos do exagero.
Neste caso concreto nem foi necessária a denúncia da oposição. Bastou que a Associação de Reformados fizesse contas e concluísse denunciando o prejuízo.
Seguiu-se um cortejo de entrevistas. Do ministro das Finanças, da ministra do setor, do antigo ministro e, ao mesmo tempo, progenitor do sistema de pensões e de outra ministra.
Foram tão eficazes que a bola da dúvida aumentou.
Restava ouvir o primeiro dos ministros. O que veio ele acrescentar? Nada. Vitimizou-se, repetiu argumentos, negou a discussão das consequências das medidas ou, melhor, do modo como as solucionaria.
No fundo, o que espera é que o tempo passe e os reformados comecem a receber o dinheiro. Confia, uma vez mais, no efeito da anestesia.
Dois problemas existem, porém. O aumento dos preços continua a desgastar e o receio de um futuro próximo de penúria fazem permanecer a sensação de incómodo e dor.
E, como se tudo isto não bastasse, outras fatias do eleitorado sentem-se excluídas das ideias salvíficas.
Os funcionários públicos, os cidadãos onerados com os créditos à habitação, por exemplo.
É muita gente. Resta jogar a última cartada. A sensibilidade social tem limites, também à esquerda.
As contas certas, mais fáceis quando a economia cresce e vive o desafogo, são agora o travão necessário, o alfobre da contenção.
E nascem aqueles argumentos de extraordinária profundidade para a generalidade dos necessitados. Um cheque de 150 euros por pessoa, ou de 50 por filho, é um ato positivo, um cheque de alimentação é assistencialismo.
O Governo é infinitamente bom e sábio e responsável.
Segue uma ideologia: o calculismo.