por Carlos Carreiras
Referência: Continuação dos extratos do texto que publiquei com o título O século dos territórios, no dia do lançamento do livro 71 Vozes pela Competitividade. Se no artigo da semana passada coloquei o foco na política só fazer sentido se servir as pessoas. A forma de o fazer é, de facto, através de uma gestão muito rigorosa que Cascais consegue ter, com contas equilibradas e investimentos, para manter a coesão social no apoio aos que ficaram mais fragilizados.
A sustentabilidade financeira não é, por si só, fator de diferenciação ou de sucesso. Inversamente, a debilidade das contas é uma das principais causas do fracasso das empresas, dos Estados e até das famílias.
Em períodos de instabilidade, a parcimónia é uma virtude cardeal. Se nos desenvencilharmos do supérfluo e focarmos no essencial, ganhamos almofadas que amortecem os choques inesperados.
Isto tem tão de trivial como de impopular.
A parcimónia, a moderação, a regra. Estes são valores que ganharam má fama no tempo voraz dos influenciadores e da glorificação instantânea.
São estas virtudes, porém, que nos permitirão acudir a quem mais precisa quando mais for preciso. Não posso deixar de recordar aqui os dias mais angustiantes da pandemia. Naquele Março de 2020, ninguém verdadeiramente podia dizer que sabia o que estava a acontecer.
Nenhum de nós tinha sido treinado para lidar com uma pandemia. Por ter uma robusta capacidade financeira, e uma boa rede em todo o mundo (fruto, lá está, da sua predisposição universalista), Cascais foi responsável pela chegada a Portugal do primeiro avião com equipamentos de proteção individual – máscaras, álcool gel, etc. Espantosamente, foi um município (e não o Governo Central) que forneceu todas as necessidades urgentes de Câmaras Municipais, forças de segurança, hospitais de toda a área metropolitana. Meses mais tarde, Cascais foi o primeiro concelho do país e pioneiro na Europa a correr um programa de testagem de imunidade à covid-19. A medida fez noticia no The New York Times e correu o mundo. Estava criada a percepção, bem assente na realidade, de que Cascais era um Estado presente na adversidade.
Um território que diz presente, é um território mais competitivo.
Cascais tem, de facto, uma gestão muito rigorosa e conseguimos com isso ter contas equilibradas. Agora, estamos a investir o dinheiro para manter a coesão social no apoio aos que ficaram mais fragilizados. Mantivemos os investimentos na câmara, não reduzimos o investimento público tão necessário à economia do país e, ainda assim, conseguimos baixar impostos.
É, da mesma forma, fundamental não parar os projetos que conferem diferenciação. As crises são sempre boas desculpas para pôr de lado investimentos, cortar orçamentos de inovação ou adiar aquelas obras urgentes. Garantindo a sustentabilidade financeira, é importante que todos os projetos que trazem valor à nossa vida, às nossas empresas ou organizações não sejam travados pela incerteza. Quando isso acontece, quase sempre acabamos por sair da crise em pior situação do que quando nela entrámos. É crítico compreender que a diferenciação é sinónimo de vantagem competitiva. No mundo massificado e uniformizado, quem for capaz de mostrar a diferença face aos competidores vencerá o campeonato da atratividade das empresas, do capital e, o mais importante de tudo, do talento. Importa sublinhar que a ideia de diferenciação não significa que tenhamos de fazer tudo bem feito – isso é uma impossibilidade para a esmagadora maioria dos governos (nacionais ou locais) e dos negócios. O que é determinante é saber investir os nossos recursos naqueles atributos que, para os stakeholders, são importantes e distintivos.
Em tudo o resto que não seja importante ou distintivo, basta ser razoável.
Um território que cria fatores de diferenciação é um território competitivo.
Falar de contas certas, só faz sentido, quando as crises sejam elas pandémicas, belicistas ou climáticas, o Estado esteja presente para apoiar os mais fragilizados e vulneráveis a suportar os efeitos das mesmas.