Por Lucas J. Botelho
Depois de alguma paz, o Credit Suisse regressou a uma nova fase turbulenta, após novos rumores quanto à sua fragilidade. O ceticismo dos investidores levou à queda das ações do banco em 25%, nos últimos dias. Os alarmes soaram quando o banco de investimentos anunciou que iria levar a cabo uma operação de redução de custos no valor de 1,5 mil milhões de francos suíços. Ao mesmo tempo, anunciou um despedimento coletivo de cerca de cinco mil funcionários.
Esta é a resposta da instituição financeira, depois de ter revelado que precisaria de quatro mil milhões de francos suíços para acomodar os novos custos de reestruturação, para apostar no crescimento de novas linhas de negócio e para reforçar os baixos níveis de capital.
Este caminho não aparenta ser fácil para um banco que apresentou uma queda de capitalização em 10 mil milhões de francos suíços. Ainda assim, a aposta em investimentos de baixo risco e o reforço na gestão de património aparenta ser o caminho a seguir.
Por outro lado, a instituição financeira precisa de apostar na venda de carteira de ativos que permitam assegurar a tão estabilidade desejada e, segundo os analistas financeiros Keefe, Bruyette & Woods, citados no Financial Times, os custos de reestruturação deverão ser muito superiores ao que foram anunciados pelo Credit Suisse.
“Após esta venda de ativos e, caso seja necessário pedir mais capital a investidores na ordem dos 14 mil milhões de francos suíços para desenvolver um plano de crescimento, esse pedido poderá provocar litigações, atritos e receios entre os clientes”. Os executivos seniores do banco, já explicitaram que o levantamento de capital, será o seu último recurso. A desconfiança dos clientes não é extraordinária, tendo em conta a instabilidade que enfrentou nestes últimos anos.
Queda livre Mário Martins, analista da ActivTrades, lembra ao i, que a instituição financeira enfrenta polémicas, desde 2021, no entanto, considera que não é isso que representa a verdadeira origem do problema, defendendo que as dificuldades remontam a um passado mais distante, que começou com a pandemia de covid-19. “Em fevereiro de 2020, o preço dos títulos do Credit Suisse eram superiores aos do rival UBS, mas um ano depois os títulos da UBS já valiam mais 10% do que os do CS”.
E esta situação, segundo Mário Martins, torna-se mais evidente, se observarmos “títulos desde 26 de fevereiro de 2021 até agora, com uma ação do CS a valer hoje 4 francos suíços, enquanto uma ação do UBS vale 15 francos”.
Também Henrique Tomé, analista da XTB, admite que as ações do Credit Suisse têm “registado um fraco desempenho devido ao sentimento de risk-off que tem marcado este ano, no qual têm prejudicado as avaliações das empresas cotadas”.
E lembra que, apesar das atuais desvalorizações dos títulos, “as quedas não estão ligadas aos períodos conturbados do banco, mas sim à conjuntura económica atual”, dando como exemplo, a desvalorização que se verifica nas restantes instituições bancárias, como o Goldman Sachs, Citigroup, BNP PARIBAS, por exemplo.
Quanto à estratégia a ser levada a cabo pelo banco, o responsável garante que a instituição financeira “possui mecanismos de proteção e de cobertura de risco que permitem que seja possível arrecadar o capital necessário com a venda de ativos”.
Uma opinião diferente tem Mário Martins ao defender que só com a venda de ativos será difícil. E face a esse cenário reconhece que poderão ter de ser emitidos novos títulos, “daí a queda no valor das ações existentes, até porque não é apenas uma questão de tapar um buraco de capital, mas também para continuar a investir para gerar receitas, evitando uma espiral recessiva”.
Estamos perante um novo Lehman Brothers? Há quem aponte semelhanças em relação ao colapso do Lehman Brothers, o que originou a crise do subprime, em 2008. O El Mundo que cita fontes financeiras especula “que o banco de investimentos apresentará fortes dificuldades, mas que a situação atual do setor é mais sã e estável em comparação com a última crise”, sendo menos provável o efeito de “spillover”, que o Credit Suisse poderia provocar sobre outras instituições.
Ao i, o analista da ActivTrades afasta tal risco. “Para já nada indica que possa ocorrer uma derrocada da mesma magnitude, existe sim uma fase de maior stress de necessidades, que obrigará a decisões estratégicas que penalizam no curto prazo os atuais acionistas”.
Já Henrique Tomé lembra que, na altura, o Lehman Brothers “possuía cerca de 600 bi em ativos antes de declarar insolvência”. E, “nesta altura, o Credit Suisse e o Deutsche Bank, em conjunto, têm 2 000b em ativos – cerca de 3,3 vezes mais do que o Lehman nessa altura”.
No entanto, admite que, “desde a última grande crise financeira, a Europa tem aplicado medidas cujo os bancos têm de cumprir determinados requisitos para garantirem liquidez e que visem a cobertura do risco dos bancos”, acenando com o facto de o Credit Suisse ter um rácio de cobertura de liquidez superior a 190%.
O cenário de incerteza tem sido reconhecida pelo atual CEO Ulrich Körner, que admitiu estar em contacto com os investidores, numa tentativa de apaziguar esta perda sucessiva de clientes e a diminuição de credibilidade da instituição.
Sucessão A vida interna do banco não tem sido fácil. António Horta Osório, o famoso banqueiro português, que recebeu mérito após a sua restruturação do Llyods Bank num período de crise profunda, foi chamado à liderança, em maio de 2021, para gerir a crise criada pelos escândalos do Greensill Capital e do Archegos Capital Management, que custaram ao banco mais de cinco mil milhões de dólares (mais de 4,3 milhões de euros).
A queda do Greensill foi o primeiro dos dois grandes problemas sofridos em 2021, seguindo-se logo depois o colapso da Archegos Capital Management, que o banco suíço tinha financiado com milhares de milhões de euros.
No entanto, foi obrigado a demitir-se, em janeiro deste ano, depois de ter furado pela segunda vez a obrigação de cumprir quarentena de covid- 19, depois de ser visto a assistir às finais de ténis em Wimbledon.
Ulrich Korner assumiu o cargo de presidente da administração do banco em julho de 2022, sendo-lhe entregue, segundo o Financial Times, “um dos períodos mais tumultuosos e conturbados em 166 anos de história na banca suíça”, com o Credit Suisse a registar uma perda de 1,6 mil milhões de euros no segundo trimestre deste ano.
Apesar das circunstâncias, o CEO já dispõe de uma vasta experiência, tendo em conta que antes de ser nomeado para o cargo, já era responsável pela divisão de gestão de ativos do banco. E será expectável que continuará a avançar com o processo de reestruturação anunciado: angariação de capital e redução de custos operativos.
*Texto editado por Sónia Peres Pinto