Ao fim de dois dias, três esclarecimentos, e depois dos partidos – exceto o PS – terem ido a Belém colocar o dedo na ferida, chegou o pedido de desculpas do Presidente da República às vítimas de abusos na Igreja.
“A minha intenção nunca foi ofender as vítimas, mas se porventura uma vítima que seja está ofendida, peço desculpa por isso porque não era esse o meu objetivo”, reconheceu, na quinta-feira, à saída da Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.
A justificação veio logo de seguida, tendo Marcelo Rebelo de Sousa reafirmado que quando disse que 400 casos de abusos de menores não era um número “particularmente elevado” o seu objetivo era exatamente o contrário: “Temer que muitas vítimas, por medo, por limitação, não tivessem falado e o número que deveria ser ainda mais alto pudesse ficar onde ficou”.
Além do pedido de desculpas às vítimas, o chefe de Estado deixou também um agradecimento aos portugueses que lhe enviaram “centenas de mensagens” nos últimos dois dias, dizendo o “óbvio: que me conhecem há anos, que conhecem os meus sete anos de mandato e que, portanto, sabem que as causas sociais dos pobres, dos explorados, dos dependentes e dos abusados são as minhas causas sociais, e o meu caráter, que é o que é e não muda aos 74 anos e ao sétimo ano de mandato”.
Esse seria, aliás, o ponto-chave desta última intervenção de Marcelo sobre o assunto. Desta vez, dirigindo uma palavra “à comunicação social e aos que no mundo político formularam os seus juízos”, deixou um aviso: a crítica faz parte da democracia, mas os que querem que ele mude podem tirar o cavalinho da chuva.
“Faz parte da democracia o espírito crítico, a abertura, (…) e queria garantir aos portugueses e a todos quantos servem os portugueses na comunicação social, nos movimentos sociais e nos partidos políticos que o Presidente cá está, vai continuar o seu caminho, tem ainda pela frente três anos e meio [de mandato], exatamente como sempre foi, sem mudar uma vírgula nos valores, nos princípios, na determinação”, vincou.
Depois desta mensagem, numa rara tentativa de contenção ao contrário do que é habitual, saiu sem responder a mais perguntas dos jornalistas, nomeadamente sobre o que achou do apoio que recebeu do primeiro-ministro. “Está dito.”
As polémicas declarações a propósito do número de queixas que chegaram à Comissão Independente que investiga os abusos sexuais na Igreja levou a que vários protagonistas políticos de todos os quadrantes políticos tenham saído num ataque unânime ao chefe de Estado. Só o PS, – nomeadamente António Costa e Carlos César – saiu em defesa do chefe de Estado.
O primeiro-ministro considerou que tinha sido feita uma “interpretação inaceitável” das palavras de Marcelo, a quem era devido um pedido de desculpas. Contudo, o Presidente foi no caminho oposto e pediu ele próprio desculpas, depois de três momentos – uma nota presidencial e duas declarações à RTP e à SIC – em que tentou emendar, corrigir e justificar as suas declarações sem nunca fazer o ato de contrição como lhe exigiram vários partidos e personalidades políticas.