Mais uma vez, um debate televisivo entre Jair Bolsonaro e Inácio Lula da Silva ficou marcado por ‘bate-boca’ entre os candidatos. A troca de insultos no último domingo teve como anfitriões os canais Bandeirantes e Cultura, bem como o site UOL e a Folha de S. Paulo, prolongando-se ao longo de três rondas. Passado e presente foram os tempos verbais dominantes, sem que se visse grande discussão programática quanto ao futuro do Brasil após a segunda volta das eleições presidenciais, marcadas para 30 de outubro.
Lula saiu-se melhor quando apontava o dedo à desastrosa gestão da pandemia pelo Presidente brasileiro, assim como da demora na compra de vacinas contra a covid-19, sentenciaram os comentadores da GloboNews e da G1. Que consideraram que Bolsonaro estava mais confortável quanto se queixava da corrupção nos governos do Partido dos Trabalhadores.
Há um certo consenso de que foi um debate aceso mas equilibrado. O que não é propriamente consolador para Bolsonaro, que dá por si sete pontos atrás de Lula nas sondagens do Ipec de quarta-feira. A esperança do Presidente brasileiro é, mais uma vez, surpreender com uma votação muito acima do esperado, à semelhança do sucedido na primeira volta.
«Por que houve tanta demora para se comprar vacina?», questionou o candidato petista, dirigindo-se ao seu adversário, que mostrou dificuldade em responder, limitando-se a afirmar que «não existia vacina à venda em 2020». Algo que é mentira, segundo o fact checking do Estadão, lembrando o testemunho do presidente da Pfizer no Brasil, Carlos Murillo, que contou a uma comissão parlamentar que as negociações para venda de cem milhões de doses de vacina foram iniciadas em maio de 2020, sendo que por algum motivo inexplicável só foram concluídas em março do ano seguinte.
«Não quis comprar porque não acreditava», acusou Lula da Silva. «O senhor não cuidou. Debochou, riu, brincou com a pandemia e com a morte», pressionou. «O senhor não se sente responsável?», instiu o antigo Presidente. «O senhor não carrega nas costas um pouco do sofrimento dos brasileiros de ser responsável pelo menos por 400 mil mortes nesse país?».
Já Bolsonaro aproveitou a visita do petista à favela do Complexo do Alemão, em tempos uma das zonas mais violentas do Rio de Janeiro, para partir para o ataque. «Seu Lula, amizade com bandido. Eu conheço o Rio de Janeiro. O senhor teve atualmente no Complexo do Salgueiro», apontou o Presidente, numa confusão geográfica, segundo a G1. «Não teve um policial ao seu lado, só traficante», declarou. Acusando o petista de ser amigo de Marcola, talvez o mais infame prisioneiro brasileiro, líder da organização criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), que controla boa parte das prisões e do tráfico internacional de droga, sobretudo a partir do porto de Santos, em São Paulo.
A critica talvez saia cara a Bolsonaro, tendo-se tornado viral nas redes sociais, trazendo à praça pública figuras do mundo da cultura e da música. «Bolsonaro insiste em falar que quem mora em favela é bandido. Favelado não é bandido», tweetou a popular cantora funk Valéria Popozuda. Já o humorista António Tabet, integrante do Porta dos Fundos, lembrou que «Não é só para o Bolsonaro que todo o pobre morador de favela é bandido. Para uma parte significativa do eleitorado dele também, infelizmente».
Lula respondeu no momento. «Acha que bandido está só no lugar dos pobres? Os grandes bandidos estão no lugar dos ricos, os pobres são trabalhadores», ripostou. «Quem tem relação com miliciano e com o crime organizado ele sabe que não sou eu e sabe quem tem», declarou, dirigindo-se ao Presidente brasileiro, cujo clã tem sido associado a diversos integrantes das milícias. Recordando a vereadora Marielle Franco, morta às mãos do crime organizado, bem como o seu suspeito assassino, Ronnie Lessa, que vivia ao lado de Bolsonaro na Barra da Tijuca, tendo até um filho de Bolsonaro chegado a namorar com uma filha de Lessa. «Tinha um vizinho seu que tinha cem armas dentro de casa», troçou Lula, durante o debate.