Por Bernardo Theotónio-Pereira, gestor e empresário
Portugal está excessivamente endividado, em termos públicos e privados.
Um erro brutal que tem e deve ser corrigido.
No contexto atual, em que o Estado arrecadará uma receita muito superior à prevista e em que receberemos um conjunto avultado de fundos europeus (o PRR a que chamam ‘bazuca’ e o PT 2030), deveremos aproveitar para investir na exposição vulnerável internacional atual através da redução da dívida absurda contraída e, ao mesmo tempo, reduzir o peso do Estado e com isso os impostos correntes para apoiar as famílias e as empresas.
Em anos de excedentes só uma estratégia de prevenção e de futuro faz sentido.
Contudo, ao invés, o atual Governo está a optar por um ‘espetáculo’ irresponsável, lamentável e populista que lembra os tempos tristes do ‘pão e circo’ do defunto Império Romano.
De facto, a proposta de Orçamento de Estado para o ano 2023 é tão caricata que:
i) Prevê crescimento acima da média europeia sem contexto ou premissa lógica;
ii) Enaltece o facto de nos mantermos na pole position entre países europeus com maior dívida pública;
iii) Antecipa, sem mais, uma inflação para 2023 de 4%, esquecendo e desprezando os, pelo menos, 7,4% já previstos em 2022;
iv) Impõe aumentos salariais unilaterais de 5,2% aos privados sem exigir, também, um valor, pelo menos, equivalente ao próprio Estado (pois, ‘uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa’);
v) Apresenta a invasão da Ucrânia pela Rússia, iniciada a 24 de Fevereiro de 2022, o aumento da taxa de juro e a hiperinflação como novidades impensáveis e imprevisíveis (o que demonstra bem o nível de foresight atual);
Trata-se de documento e uma aparente previsão inócua e desfasada da realidade presente e futura, consubstanciada num calhamaço complexo, denso e inelegível. Porque será? Porque será que os Orçamento de Estado nunca são um documento claro e de simples leitura?
Sinceramente, não sei. Parece que não se quer que assim seja.
De facto, na minha opinião, a proposta de Orçamento para 2023 é um bluff por não:
1. Valorizar, favorecer e fomentar o produto e serviço nacional (o local contente tão promovido noutros países);
2. Isentar o IRS a todos os trabalhadores com salários brutos até 1500€ (a criação do salário minimamente digno Nacional que tenho defendido);
3. Favorecer, sem medos e sem complicações, as famílias e, em especial, as famílias numerosas (precisamos de portugueses!);
4. Prescindir, terminando de imediato, com o pagamento por conta (PPC) e o pagamento especial por conta (PEC): as empresas e os empresários não têm de continuar a financiar o Estado com base em perspetivas de eventuais receitas que não sabem se vão conseguir gerar, especialmente em tempos tão incertos, e quando Estado se dá ao luxo de arrecadar receitas extraordinárias oriundas de uma inflação incontrolável somada a outras receitas atípicas a que se chamou ‘bazuca’. Não faz, por isso, qualquer sentido continuar, desta forma, a estrangular empresas e os empresários.
5. Promover processos sumários e céleres, como já acontece, por exemplo, no Brasil, em relação a dívidas entre empresas, de modo que o processo não beneficie o prevaricador/devedor. O devedor não pode continuar a ser beneficiado e a Justiça não pode continuar a não funcionar.
6. Privilegiar, premiando a todos os níveis, os cidadãos, as empresas e as instituições que não tenham dívida. Ao invés do que se pretende fazer que não é, nem justo, nem construtivo e, muito menos, pedagógico.
De facto, todos aqueles que não têm dívida, e por essa via não são um risco direto ou indireto para a Sociedade, devem ser objetivamente privilegiados.
Precisamos de Governos e governos normais. Que percebam a Vida e os problemas dos portugueses normais. Que percebam e conheçam os desafios hercúleos das empresas e dos empresários pois, caso contrário, continuaremos a ‘navegar à vista’ e a ‘viajar na maionese’.
Temos 3 anos cruciais pela frente.
Não podemos ousar perder esta oportunidade.